domingo, 31 de maio de 2009

Transparência - Visibilidade na administração e nas contas públicas: LC 131 de maio de 2009


Gilson Carvalho[1]

I– INTRODUÇÃO

Em maio de 2000 inaugurou-se um novo termo de referência em administração pública: a LC 101, conhecida como a Lei de Responsabilidade Fiscal. Foi criticada veementemente por progressistas e conservadores. Uns a acusavam de extremamente severa e outros, grupo em que me incluo, condenavam seu foco no fiscal em detrimento do social. Entre elogios e críticas pode-se comemorar os resultados positivos já alcançados na administração pública. Longe do ideal, mas melhor que um passado, em vários aspectos, desregulado em que viviam as administrações públicas. Ao comemorar nove anos da LC 101 foi aprovada agora em maio de 2009 a LC 131 que traz contribuições na melhora da transparência-visbilidade das ações e gastos do governo. Pouco ou nada inova, mas reforça o que já vinha inscrito nas Leis.

Muitos teimam em não querer entender o papel destas medidas de visibilidade das ações governamentais. Chegam ao simplismo de reduzir estes mecanismos como uma maneira de ser contra governo e governantes. Não se trata de ser contra ninguém, mas, a favor de nós mesmos seres humanos, cidadãos e políticos.

Faço sempre uma sequência lógica onde se introduz o papel da transparência-visibilidade dentro da idéia do objetivo único, central e principal da humanidade: VIVER MAIS E MELHOR.

1. OBJETIVO INDIVIDUAL E COLETIVO DA HUMANIDADE: VIVER MAIS E MELHOR
2. AS AÇÕES DOS GOVERNOS DEVEM AJUDAR AS PESSOAS A VIVEREM MAIS E MELHOR: EFICÁCIA, EFICIÊNCIA E EFETIVIDADE;
3. NÓS CIDADÃOS ESCOLHEMOS QUEM OS VAI GOVERNAR;
4. NÓS CIDADÃOS DEVEMOS SER PROPOSITIVOS AJUDANDO OS GOVERNOS A FAZER PLANOS E A APROVÁ-LOS (AUDIÊNCIAS E CONSELHOS);
5. NÓS CIDADÃOS DEVEMOS CONTROLAR (FISCALIZAR) OS GOVERNOS PARA QUE ELES NÃO SAIAM DE ROTA (TRANSPARÊNCIA-VISIBILIDADE) NA SUA MISSÃO DE AJUDAR AS PESSOAS A VIVEREM MAIS E MELHOR.

Nesta lógica seqüencial a TRANSPARÊNCIA-VISIBILIDADE tem que ser vista não como um fim em si mesmo mas, como um instrumento, um ferramental essencial para o tríplice principio de ação: CONFIRMAR O CORRETO, CORRIGIR O ERRADO, ENFRENTAR O NOVO.

II - O MARCO REGULATÓRIO DE TRANSPARÊNCIA-VISIBILIDADE JÁ EXISTE E AINDA MUITO DESCUMPRIDO

A OBRIGATORIEDADE DE O GOVERNO DAR INFORMAÇÃO E OUVIR O CIDADÃO

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
“ART.5, XXXIII – todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
ART. 74, § 2º. Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União.”

A OBRIGATORIEDADE DE O GOVERNO FAZER OS CIDADÃOS CONTROLAREM SUA AÇÃO E, NA SAÚDE, EXIGIR QUE O CONSELHO DE SAÚDE ACOMPANHE E FISCALIZE O FUNDO DE SAÚDE ONDE É APLICADO TODO O DINHEIRO DA SAÚDE.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
“ ART.10 - É assegurada a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação.
ART. 194 - A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
VI - diversidade da base de financiamento;
VII - caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e aposentados.”
ART 195 § 2.º “ A proposta de orçamento da seguridade social será elaborada de forma integrada pelos órgãos responsáveis pela saúde, previdência social e assistência social, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias, assegurada a cada área a gestão de seus recursos.
ART. 198 – “ As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
III - participação da comunidade.”

CONSTITUIÇÃO FEDERAL - ADCT
“ ART.77,3 – Os recursos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios destinados às ações e serviços públicos de saúde e os transferidos pela União para a mesma finalidade serão aplicados por meio de Fundo de Saúde que será acompanhado e fiscalizado por Conselho de Saúde, sem prejuízo do disposto no art. 74 da Constituição Federal.”

LEI 8.080
“ ART. 33 - Os recursos financeiros do Sistema Único de Saúde (SUS) serão depositados em conta especial, em cada esfera de sua atuação, e movimentados sob fiscalização dos respectivos Conselhos de Saúde. “

LEI 8142
“ ART. 1 O SUS contará em cada esfera de governo, sem prejuízo das funções do Poder Legislativo, com as seguintes instâncias colegiadas I – a Conferência de Saúde; e II – O Conselho de Saúde
§ 2 O Conselho de Saúde (....) atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros...”

DECRETO FEDERAL 1232
“ ART. 2 – A transferência de que trata o art. 1º fica condicionada à existência de fundo de saúde e à apresentação de plano de saúde, aprovado pelo respectivo Conselho de Saúde, do qual conste a contrapartida de recursos no Orçamento do Estado, do Distrito Federal ou do Município.”

A TÍTULO DE UM EXEMPLO DE GOVERNO ESTADUAL, CITA-SE O QUE ESTÁ PREVISTO PARA O ESTADO DE SÃO PAULO: (BUSCAR A LEGISLAÇÃO DE CADA ESTADO E DE CADA MUNICÍPIO
CÓDIGO DE SAÚDE DO ESTADO DE SÃO PAULO - SP, LEI 791
“ART. 49 – Os recursos financeiros do SUS serão depositados no fundo de saúde de cada esfera de governo e movimentados pela direção do SUS sob fiscalização do respectivo conselho de saúde, sem prejuízo da atuação dos órgãos de controle interno e externo.”

A OBRIGATORIEDADE DE O GOVERNO COMUNICAR A SINDICATOS, ENTIDADES EMPRESARIAIS E PARTIDOS POLÍTICOS A CHEGADA DE QUALQUER RECURSO PARA A SAÚDE VINDO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE ATÉ 48 HORAS APÓS RECEBIMENTO

LEI 9.452/1997
“Art. 1º Os órgãos e entidades da administração federal direta e as autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista federais notificarão as respectivas Câmaras Municipais da liberação de recursos financeiros que tenham efetuado, a qualquer título, para os Municípios, no prazo de dois dias úteis, contado da data da liberação.
Art 2 A Prefeitura do Município beneficiário da liberação de recursos, de que trata o art. 1º desta Lei, notificará os partidos políticos, os sindicatos de trabalhadores e as entidades empresariais, com sede no Município, da respectiva liberação, no prazo de dois dias úteis, contado da data de recebimento dos recursos.
Art 3 As Câmaras Municipais representarão ao Tribunal de Contas da União o descumprimento do estabelecido nesta Lei. “

A OBRIGATORIEDADE DE O GOVERNO PUBLICAR OU AFIXAR EM LOCAL DE AMPLA CIRCULAÇÃO, A CADA MÊS, A LISTAGEM DE TODAS AS COMPRAS REALIZADAS COM FORNECEDOR, VALOR UNITÁRIO E TOTAL

LEI 8666 (ALTERADA PELA 8883)
“ART.16 - Será dada publicidade, mensalmente, em órgão de divulgação oficial ou em quadro de avisos de amplo acesso público, à relação de todas as compras feitas pela Administração direta ou indireta, de maneira a clarificar a identificação do bem comprado, seu preço unitário, a quantidade adquirida, o nome do vendedor e o valor total da operação, podendo ser aglutinadas por itens as compras feitas com dispensa e inexigibilidade de licitação.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica aos casos de dispensa de licitação previstos no inciso IX do art. 24."

A OBRIGATORIEDADE DE O GOVERNO PRESTAR CONTAS AO CONSELHO DE SAÚDE A CADA TRÊS MESES

LEI 8689
“ART.12 - O gestor do Sistema Único de Saúde em cada esfera de governo apresentará, trimestralmente, ao conselho de saúde correspondente e em audiência pública nas câmaras de vereadores e nas assembléias legislativas respectivas, para análise e ampla divulgação, relatório detalhado contendo, dentre outros, dados sobre o montante e a fonte de recursos aplicados, as auditorias concluídas ou iniciadas no período, bem como sobre a oferta e produção de serviços na rede assistencial própria, contratada ou conveniada.”

A OBRIGATORIEDADE DE O GOVERNO PRESTAR CONTAS EM AUDIÊNCIA PÚBLICA NA ASSEMBLÉIA E NAS CÂMARAS MUNICIPAIS A CADA TRÊS MESES

LEI 8.689
“ ART.12 - O gestor do Sistema Único de Saúde em cada esfera de governo apresentará, trimestralmente, ao conselho de saúde correspondente e em audiência pública nas câmaras de vereadores e nas assembléias legislativas respectivas, para análise e ampla divulgação, relatório detalhado contendo, dentre outros, dados sobre o montante e a fonte de recursos aplicados, as auditorias concluídas ou iniciadas no período, bem como sobre a oferta e produção de serviços na rede assistencial própria, contratada ou conveniada”

OBRIGATORIEDADE DE O GOVERNO DIVULGAR TRIMESTRALMENTE VALOR REPASSADO A ESTADOS E MUNICÍPIOS

LEI 8.689 de julho de 1993

Art. 4º Os recursos de custeio dos serviços transferidos ao município, estado ou Distrito Federal ....
§4º Será publicada trimestralmente no Diário Oficial da União a relação dos recursos repassados pelo Ministério da Saúde à rede assistencial do Sistema Único de Saúde, com a discriminação dos estados, Distrito Federal e municípios beneficiados.

A OBRIGATORIEDADE DO GOVERNO PRESTAR CONTAS BIMESTRALMENTE E DEIXAR ABERTAS AS CONTAS ANUAIS POR SESSENTA DIAS PARA TODO CONTRIBUINTE PODER VERIFICAR

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
“ART.31 § 3 As contas dos Municípios ficarão, durante sessenta dias, anualmente, à disposição de qualquer contribuinte, para exame e apreciação, o qual poderá questionar-lhes a legitimidade, nos termos da lei.
ART.165, §3 O poder executivo publicará até 30 dias após o encerramento de cada bimestre, relatório resumido da execução orçamentária.”
LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL – 101-2000
52 § 2º O relatório será publicado até trinta dias após o encerramento do período a que corresponder, com amplo acesso público, inclusive por meio eletrônico.

A OBRIGATORIEDADE DE O GOVERNO REGER-SE PELOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, IMPESSOALIDADE, MORALIDADE, PUBLICIDADE E EFICIÊNCIA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
“ART.37 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:“

A OBRIGATORIEDADE DE O GOVERNO PRESTAR CONTAS AOS CIDADÃOS PELOS RELATÓRIOS RESUMIDOS DE EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E DE GESTÃO FISCAL INCLUSIVE PELA INTERNET E EM AUDIÊNCIA PÚBLICA, A CADA QUATRO MESES

LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL – LC 101
“ART.9,§ 4 – Até o final dos meses de maio, setembro e fevereiro, o Poder Executivo demonstrará e avaliará o cumprimento das metas fiscais de cada quadrimestre, em audiência pública na comissão referida no § 1 do art. 166 da CF ou equivalentes nas casas legislativas estaduais e municipais.
ART.48 - São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei diretrizes orçamentárias e orçamentos.
Art 49. As contas apresentadas pelo Chefe do Poder Executivo ficarão disponíveis, durante todo o exercício, no respectivo Poder Legislativo e no órgão técnico responsável pela sua elaboração, para consulta e apreciação pelos cidadão e instituições da sociedade.
Art 50. § 3º A Administração Pública manterá sistema de custos que permita a avaliação e o acompanhamento da gestão orçamentária, financeira e patrimonial.
Art 51. O Poder Executivo da União promoverá, até o dia trinta de junho, a consolidação, nacional e por esfera de governo, das contas dos entes da Federação relativas ao exercício anterior, e a sua divulgação, inclusive por meio eletrônico de acesso público.
§ 1º Os Estados e os Municípios encaminharão suas contas ao Poder Executivo da União nos seguintes prazos:
I - Municípios, com cópia para o Poder Executivo do respectivo Estado, até trinta de abril;
II - Estados, até trinta e um de maio.
§ 2º O descumprimento dos prazos previstos neste artigo impedirá, até que a situação seja regularizada, que o ente da Federação receba transferências voluntárias e contrate operações de crédito, exceto as destinadas ao refinanciamento do principal atualizado da dívida mobiliária.
Art 52. O relatório a que se refere o § 3º do art. 165 da Constituição abrangerá todos os Poderes e o Ministério Público, será publicado até trinta dias após o encerramento de cada bimestre e composto de: .......
.........................
§ 2º O relatório será publicado até trinta dias após o encerramento do período a que corresponder, com amplo acesso público, inclusive por meio eletrônico.
§ 3º O descumprimento do prazo a que se refere o § 2º sujeita o ente à sanção prevista no § 2º do art. 51.
§ 4º os relatórios referidos nos arts. 52 e 54 deverão ser elaborados de forma padronizada, segundo modelos que poderão ser atualizados pelo conselho de que trata o art. 67. (Conselho de Gestão Fiscal)

III – LEI COMPLEMENTAR 131 DE MAIO DE 2009: MAIS TRANSPARÊNCIA-VISIBILIDADE

A LC 131 traz alterações e aperfeiçoamentos para dois artigos da 101. Muda o artigo 48 e o 73.

Vamos ao Art.48:

“ CAPÍTULO IX - DA TRANSPARÊNCIA, CONTROLE E FISCALIZAÇÃO
Seção I - Da Transparência da Gestão Fiscal
Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos.
Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante: (Incluído LC 131 REPETINDO O INTEIRO TEOR DO 48 ANTERIOR)
I – incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos; (Incluído LC 131 REPETINDO O INTEIRO TEOR DO 48 ANTERIOR)
II – liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público; (Incluído LC 131)
III – adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao disposto no art. 48-A. (Incluído LC 131)
Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do art. 48, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a informações referentes a: (Incluído LC 131)
I – quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado; (Incluído LC 131)
II – quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários. (Incluído LC 131)

A questão mais comemorada pela mídia foi a da prestação de contas por meio eletrônico de acesso público. Na verdade nada diferente do que já estava escrito na LC 101 desde maio de 2000 e que está no caput do art.48 sem nenhuma alteração: Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.

A novidade é a do detalhamento de como deva ser esta prestação de contas por meio eletrônico de acesso público: INFORMAÇÃO EM TEMPO REAL COM INFORMAÇÕES PORMENORIZADAS DE EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA.
Já no artigo introduzido como 48-A explicita ainda melhor: a disponibilidade expressa a qualquer pessoa física ou jurídica a informação sobre despesas no momento da realização: número do processo, bem ou serviço, beneficiário do pagamento e procedimento licitatório.
Vale lembrar que esta exigência, até com maiores detalhes já existe na lei de licitação 8666 desde o ano de 1994 e vai aqui repetida com menos detalhes.

Outra novidade é a o art.73.A; 73.B; 73.C

Art. 73. As infrações dos dispositivos desta Lei Complementar serão punidas segundo o
Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); a Lei no 1.079, de 10 de abril de 1950; o Decreto-Lei no 201, de 27 de fevereiro de 1967; a Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992; e demais normas da legislação pertinente.
Art. 73-A. Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para denunciar ao respectivo Tribunal de Contas e ao órgão competente do Ministério Público o descumprimento das prescrições estabelecidas nesta Lei Complementar. (Incluído LC 131)
Art. 73-B. Ficam estabelecidos os seguintes prazos para o cumprimento das determinações dispostas nos incisos II e III do parágrafo único do art. 48 e do art. 48-A: (Incluído LC 131)
I – 1 (um) ano para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios com mais de 100.000 (cem mil) habitantes; (Incluído LC 131)
II – 2 (dois) anos para os Municípios que tenham entre 50.000 (cinquenta mil) e 100.000 (cem mil) habitantes; (Incluído LC 131)
III – 4 (quatro) anos para os Municípios que tenham até 50.000 (cinquenta mil) habitantes. (Incluído LC 131)
Parágrafo único. Os prazos estabelecidos neste artigo serão contados a partir da data de publicação da lei complementar que introduziu os dispositivos referidos no caput deste artigo. (Incluído LC 131) Art. 73-C. O não atendimento, até o encerramento dos prazos previstos no art. 73-B, das determinações contidas nos incisos II e III do parágrafo único do art. 48 e no art. 48-A sujeita o ente à sanção prevista no inciso I do § 3o do art. 23. (Incluído LC 131)

NO 73-A coloca o cidadão, sindicatos, partidos políticos mais uma vez como parte legítima para denunciar descumprimento legal junto ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas. Aqui a única novidade é colocar o MINISTÉRIO PÚBLICO como acolhedor obrigatório de denúncias dos cidadãos. Esta determinação já está presente na íntegra na própria Constituição ART. 74, § 2º. Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União.”

No 73-B são estabelecidos prazos para se cumprir a lei, relacionando o menor tempo ao tamanho do município. Os prazos estabelecidos são os limites máximos de cumprimento, a partir da data de publicação da lei: a União, Estados e Municípios com mais de 100 mil habitantes têm um ano; municípios entre 50 e 100 mil, dois anos e os menores de 50 mil, quatro anos. A penalidade estabelecida é a impossibilidade de receber transferências voluntárias do Governo Federal além aquelas de outras leis e decretos explicitados no caput.
Não me cansarei de repetir que o que parece avanço é prêmio aos descumpridores da lei, pois, estas obrigações já eram para serem cumpridas algumas, desde a CF de 1988 e outras, desde a Lei de Responsabilidade Fiscal de maio de 2000.

IV – CONCLUINDO

Mais uma legislação obrigando a que os entes públicos sejam transparentes na divulgação da maneira com que gastam os recursos públicos. Muitos deles repetindo o que já era lei, como esta. Os dispositivos legais se acumulam através dos tempos e das normas obrigando ao uso correto dos poucos recursos públicos disponíveis.
O que tem levado a que estas normas em geral resultem inócuas? Isto ocorre em decorrência de dois fatores. O primeiro deles é a impunidade: recursos são usados indevidamente em forma e objeto e nenhuma sanção é aplicada. O segundo é a baixa participação dos cidadãos no controle dos governantes. Os mecanismos existem, mas não são usados até as últimas conseqüências pelos cidadãos. Mais, estes mesmos cidadãos que somos, muitas vezes prenhes da passividade, esquecemos dos atos e fatos de governos ímprobos e continuamos elegendo aqueles que praticam, contumazmente a malversação de recursos públicos.
O exemplo claro está, em mais esta lei complementar. A essência dela está já há nove anos no Art.48 e 52 da 101, não alterado: SERÁ DADA AMPLA DIVULGAÇÃO, INCLUSIVE EM MEIOS ELETRÔNICOS DE AMPLA CIRCULAÇÃO. Vemos na prática que, depois de nove anos de não cumprimento de lei complementar, serão dados prazos para que união, estados e municípios cumpram aquilo que já devia ter sido cumprido nove anos atrás. O descumprimento legal dá de presente para os ilegais, prazos elásticos, onde nunca tinha havido prazos por ser auto-aplicável de imediato há nove anos!
Será que vai colar desta vez? Inclusive a maior sanção estabelecida pela Lei é de impedimento de receber transferências voluntárias do Governo da União, questão que, por iniqüidade histórica não são transferências nem iguais, nem a todos os entes federados nem a aqueles que mais precisam.
Nosso surrado, de velho, slogan ainda é atual para ser bradado a quatro ventos: TEMOS QUE TER A OUSADIA DE CUMPRIR E FAZER CUMPRIR AS LEIS.

[1] Gilson Carvalho - Médico Pediatra e de Saúde Pública - Adota a política do copyleft sendo este texto de livre reprodução e divulgação independente de autorização do autor. Visite o site www.idisa.org.br e para contatos carvalhogilson@uol.com.br

sábado, 30 de maio de 2009

Para mudar a política, só mudando a sociedade.


Fabiana Leal
Os políticos brasileiros são "a cara do povo" e isso incomoda a população, que não quer se ver espelhada em seus eleitos. A opinião é do professor Selvino Assmann, docente de Filosofia Política na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). "A 'cara do povo', que inclui a mentira e a corrupção, não é a 'cara do outro', mas é a 'cara' de nós mesmos", afirma. Para Assmann, os eleitores votam pensando em seus interesses privados e, com isso, elegem políticos com a mesma lógica de conduta. Segundo ele, para mudar a política, só mudando a sociedade.
Para o professor, é errado dizer que todos os políticos são eticamente maus, e que o cidadão é sempre passivo. Segundo ele, o Brasil enfrenta também uma crise na qual os Estados deixaram de ser tão importantes, embora ainda sejam os "atores políticos por excelência". A dificuldade na legitimidade do poder deve-se, de acordo com ele, ao fato de a política ser localizada e não globalizada, como a economia.
No Brasil, há uma onda de descrédito da classe política e as críticas, na maioria das vezes, não citam que esses representantes são escolhidos pelo povo. Por que o eleitor se exime dessa responsabilidade?Os políticos são a cara do povo, por mais que não gostemos de nos ver espelhados assim. Eles representam as classes dirigentes, os industriais, os banqueiros, os intelectuais, os operários, os agricultores, a juventude, os homens e as mulheres. Essa "cara do povo", que inclui a mentira e a corrupção, não é a cara do outro, mas é a "cara" de nós mesmos, a "cara" de uma coletividade. Por isso, de certa maneira, a crítica aos políticos deveria servir para uma auto-avaliação, o que normalmente não é feito.
Se os políticos refletem o cidadão brasileiro, as pessoas se sentem "absolvidas" para agirem igual a eles no cotidiano? E isso é refletido em que atitude? Pesquisa recente indica que boa parcela da população brasileira diz que agiria da mesma maneira (dos políticos) se tivesse cargo público, ou seja, cuidaria dos interesses privados. A atitude de muitos políticos estaria reproduzindo a falta de espírito ou interesse público da população. E isso também se revela no hábito arraigado de "tirar vantagem em tudo", no descumprimento de tantas normas no comportamento público, a começar pela sonegação de impostos, pela busca de auxílio do Estado e dos políticos quando se precisa de um favor ou de um privilégio.
No entanto, tal atitude de políticos não se torna correta ou legítima simplesmente porque a população age da mesma forma. Como nem tudo o que é legal é moralmente correto, é importante entender o que está acontecendo para evitar o julgamento imediato e dizer que toda a política e todos os políticos são maus do ponto de vista ético e que o cidadão é passivo ou bom em tudo o que faz.
É evidente que os homens e mulheres públicos devem ser os primeiros encarregados para que o interesse público prevaleça sobre o privado e não o contrário. Por isso, neste caso, o maior erro legal e moral é dos políticos. É ruim ficar sem saída neste círculo historicamente vicioso. É importante que alguém tenha a ousadia e a coragem de quebrar a lógica dominante.
Partindo do pressuposto que o voto também é um tipo de opinião pública, assim como a expressa pela imprensa, por que o eleitor (re) elege candidatos envolvidos em escândalos ou denúncias?A mídia nem sempre representa de modo fiel a opinião pública, pois é plural e humana. Se fosse única e se a opinião da mídia representasse fielmente a opinião da maioria da população, só seriam eleitos os políticos com comportamentos e propostas defendidos pela imprensa.
Infelizmente, a mídia não representa a opinião pública na sua totalidade. Se representasse, estaríamos presumivelmente melhores do ponto de vista político. Por outro lado, devemos admitir que a opinião pública expressa na mídia é poderosa. Leva políticos a se preocupar em se pronunciar publicamente, para se defender ou pedir desculpas.
A opinião pública expressa em cada eleição é marcada pelo predomínio de interesses privados (do eleitor), fazendo com que tenhamos políticos mais preocupados com interesses privados do que com interesse público. É por isso que elegemos candidatos envolvidos em escândalos e é por isso que os reelegemos. É uma constatação, não um juízo de valor. Não se muda a política, portanto, sem mudar ao mesmo tempo a sociedade.
O deputado Sérgio Moraes (PTB-RS), relator do caso do deputado do castelo, Edmar Moreira (sem partido-MG), e que foi vereador e prefeito de Santa Cruz do Sul (RS), deputado estadual, e, agora, deputado federal, disse que está se lixando para a imprensa e a opinião pública. Esse é um sentimento comum no meio político?Não dar importância à opinião pública, expressa pela mídia, é raro. Por isso mesmo, os políticos se sentem obrigados a dar explicações ou se defender. Infelizmente, é difícil ver algum deles reconhecendo um erro. E também não é óbvio dizer que a mídia sempre expressa o bem e sempre diz a verdade. A atitude do deputado tornou-se muito cínica. Ele defende que não é preciso se parecer honesto e que não é problema ser e parecer desonesto, contanto que se encontre um jeito de ser aprovado no dia da eleição.
O Congresso está numa crise de funcionalidade e legitimidade. Qual é a atual crise da sociedade?Um aspecto desta crise está no fato de que a política é cada vez mais menosprezada em favor de nossos interesses privados ou particulares, ou então, em favor dos nossos interesses econômicos. Não há apenas uma crise de políticos, mas de política. Os Estados deixaram de ser tão importantes, embora ainda sejam os atores políticos por excelência. A economia é global, os problemas são globais, mas a política não consegue ser global, continuando local e nacional. Por esse motivo, há uma dificuldade crescente na legitimidade do exercício do poder político.
O Congresso conseguirá avançar e votar ainda neste ano a reforma política?É lastimável que se pense em mudar a legislação, alterar as regras gerais da política, quando aparece mais um escândalo. As leis só são decisivas quando de fato se tornam leis, impedindo as exceções, impedindo os privilégios, impedindo, portanto, a impunidade.
Pode ser que aconteça algum avanço com uma reforma política parcial, mas não é a garantia da melhor reforma possível, por ser feita sem um desejado debate público, mas somente entre os políticos sediados em Brasília.
Como acredita que os eleitores receberiam a aprovação do voto fechado, uma das possibilidades da reforma política que está sendo discutida no Congresso?Haveria certamente cidadãos ou instituições que financiam campanhas que não gostariam da idéia, pois perderiam a garantia de negociação com o candidato. Estamos muito acostumados a defender que se deve votar em pessoas e não em projetos de sociedade representados pelos partidos. O voto fechado tem a pretensão de fortalecer as legenda e isso é bom.
Se o partido ficar responsável por escolher os candidatos em lista preferencial, é necessário que haja fidelidade partidária, ou seja, que todo o eleito perca automaticamente o mandato quando mudar de partido durante o exercício. Se isso acontecer, o segundo candidato mais votado na lista fechada deveria assumir o cargo.
Que benefício traria para a sociedade a aprovação do financiamento público de campanha, a outra proposta discutida na reforma polítia?Essa regra existe em muitos países, sobretudo em países considerados mais maduros, e poderá, sem dúvidas, gerar mais controle sobre o uso do dinheiro na campanha eleitoral. A medida também poderá aumentar as possibilidades da criação de partidos mais consolidados, dificultando o surgimento de propostas, às vezes tresloucadas. Mas esta também não será uma regra mágica que sozinha melhorará a política brasileira.
Como avalia uma mudança mais profunda nas regras do jogo eleitoral, viabilizando o pleito de um terceiro mandato pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva?Como cidadão, não aceito isso, independente de quem seja o candidato. Não desejo que continuemos mudando a legislação toda vez que queremos mudar ou manter algo. Um estado de direito deve ter estabilidade. Também não creio muito na possibilidade de mais uma reeleição para o presidente Lula e nem que haja esta pretensão por parte dos governantes. Talvez isso seja pretensão de alguns partidários. O terceiro mandato seria muito lastimável do ponto de vista democrático e político.
Redação Terra

domingo, 24 de maio de 2009

O que é aquilo?

Apoio a Gastão Wagner de Souza


Prezados, Gastão Campos, responsável e mentor da Política Nacional de Humanização quando Secretário-Executivo do Ministério da Saúde, está sendo injustamente acusado e responsabilizado por desvios na aplicação de recursos de convênios. Em defesa do nome e honra de Gastão estará sendo realizado em Campinas no dia 03 de junho, um ato de desagravo em defesa da idoneidade ético-política de nosso companheiro, alertando os responsáveis pela condução dos processos que Gastão deve ser inocentado, pois é inocente. Gostaria, em nome da Coordenação da Política Nacional de Humanização, que os companheiros/as se manifestassem e pudessem se fazer presentes na UNICAMP no dia 03/06. Além disto, solicito que cada um de vocês acione as respectivas redes de trabalho e afeto, ampliando nosso trabalho político em defesa de Gastão. No convite do IDISA (acima), assinado por Nelson Rodrigues dos Santos, há e-mail (idisa@idisa.org.br) para o qual podem ser enviadas mensagens de apoio a Gastão.
Abraço fraterno,
Dário Pasche Coordenação Nacional da
PNH

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Perícia Médica e o SUS !!


A Nota do Núcleo de Direito Sanitário
NOTA TÉCNICA CONASEMS Nº 02/09

NUCLEO DE DIREITO SANITARIO

Assunto: Sistema Único de Saúde - SUS e as atividades periciais da Previdência Social. Competências e responsabilidades. Financiamento da atividade pericial. Responsabilidade da Previdência Social.

Os Municípios integrantes do CONASEMS têm consultado o Núcleo de Direito Sanitário a respeito das responsabilidades do SUS em relação aos exames médicos-periciais a cargo do INSS. Com muita freqüência, o Judiciário encaminha para o SUS, pessoas integrantes do Regime Geral de Previdência Social para a realização de perícias que comprovem invalidez ou outros estados de agravo à saúde. Isso também ocorre em relação ao INSS. É necessário, nesse ponto, demarcar as responsabilidades dos sistemas públicos de Saúde e da Previdência Social quanto ao financiamento dessas atividades, uma vez que ambas as áreas integram a Seguridade Social, ainda que cada uma tenha gestão autônoma de seus orçamentos. A Seguridade Social é definida constitucionalmente como um " conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social " (art. 194). A tríade " saúde, previdência social e assistência social " tem assegurada a gestão autônoma de seus recursos. Cada área tem seu orçamento próprio para financiar suas ações e serviços de modo autônomo. As atividades de cada setor são distintas, ainda que todas se interpenetrem no tocante à garantia da qualidade de vida do cidadão brasileiro, mas as atividades são distintas e seus orçamentos também. Constituição define nos arts. 196 a 200 as atividades da saúde; nos arts. 201 a 202, as da previdência social; nos arts. 203 e 204, as da assistência social. A primeira conclusão a que chegamos, com fundamento nos artigos acima citados, é que as áreas têm atividades próprias definidas na Constituição e nas leis que as regulamentam e orçamento próprios. Nesse sentido, para que se possa entender de quem é a responsabilidade pelos exames periciais dos contribuintes da Previdência Social, devemos nos ater às atribuições de cada setor. A saúde tem como atribuição as atividades descritas no art. 200 da CF e na Lei 8.080/90. A Previdência Social deve se responsabilizar pelas atividades definidas no art. 201 e na Lei 8.213/91; e a Assistência Social, por aquelas estabelecidas no art. 203 e na sua Lei 8.742/93. A saúde responde pela garantia do acesso universal e igualitário as ações e serviços de saúde para sua promoção, proteção e recuperação; a Previdência Social por todas as atividades que digam respeito à proteção do trabalhador quanto aos eventos de doença, invalidez, morte, idade avançada, proteção à maternidade, ao desemprego involuntário, aposentadoria, dentre outros; e a assistência social à garantia de mínimos existenciais a quem dela necessitar. A questão que aqui aflora é a dos exames periciais médicos a cargo da Previdência Social. A Previdência Social comumente recorre aos exames médicos periciais como medida assecuratória de direitos previdenciários que necessitam da comprovação médica das alegações realizadas pelos beneficiários em situações que envolvam doenças, invalidez, maternidade etc. A perícia se situa dentre os serviços que a Previdência Social deve prestar aos seus beneficiários, ainda que seja uma atividade considerada como "meio" para se atingir a uma finalidade. A perícia não é um tratamento médico; esse sim, está a cargo do SUS. A perícia é um exame realizado para se confirmar se há ou não um agravo à saúde que possa ensejar o benefício que o contribuinte da Previdência pleitea. Esse exame exige seja feito um laudo endereçado à autoridade competente.Para se garantir determinado benefício ao trabalhador, é necessário a realização de periciais. Tanto que a Lei 8.213 utiliza em vários artigos quando expressa um direito, como o auxilio doença, que o mesmo depende de "perícia a cargo da Previdência Social". Lei 8.213: "art. 43, § 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança". Decreto 3.048/99: "Art.85. A invalidez do filho ou equiparado maior de quatorze anos de idade deve ser verificada em exame médico-pericial a cargo da previdência social."São inúmeros os artigos dessa Lei, tanto quanto do Regulamento da Previdência Social - Decreto n. 3.048/99, que mencionam as perícias médicas como uma atribuição da Previdência Social. (Lei 8.231/91: arts. 42; 43;110. Decreto 3.048/99: arts. 43; 46;47; 78; 114; 171; 174; 354).Todas eles se referem às perícias como um encargo da Previdência Social.Sendo a perícia uma atribuição da Previdência Social, compete-lhe prestar esses serviços de maneira direta (pelos seus próprios serviços ou através de terceiros, mediante contrato). No caso de contratação de serviços de terceiros, há que se ter uma contrapartida, um pagamento pelos seus custos, uma vez que a Previdência - por ter a responsabilidade pela garantia do serviço de perícia - conseqüentemente tem em seu orçamento recursos para custear as suas atividades, e uma delas diz respeito às perícias médicas.O fato de o SUS ser responsável pela saúde pública não significa arcar com atividades de outros setores, como é o caso das perícias, que são, na realidade, as informações que deve ser encaminhada ao INSS, ou ao Juízo demandante, necessárias sobre uma determinada pessoa, mediante laudo.A perícia é uma atividade técnica, especializada, tanto que a Previdência tem em seu corpo funcional o cargo de médico perito, por ser uma especialidade.O SUS atua na Saúde, mas de maneira diferente. Suas atividades são assistenciais e não de perícia. O SUS não tem como atribuição realizar perícias, mas sim cuidar da saúde da pessoa, individual ou coletivamente falando. O trabalhador periciado poderá fazer o seu tratamento no SUS; o que não é possível é o SUS ser o responsável também pela perícia a cargo da Previdência Social.Além do mais o SUS está obrigado ao sigilo profissional, ao segredo profissional não podendo fornecer informações constantes de prontuários médicos a terceiros, mesmo quando esse terceiro é a Previdência Social e o paciente tem prontuário no SUS. Mas poderá conceder essa informação desde que autorizado pelo paciente ou em razão de uma decisão judicial.Desse modo, as atividades dos setores Saúde e Previdência Social são distintas. O SUS cuida da saúde do paciente, que pode ser um trabalhador previdenciário; contudo não está obrigado a emitir laudos periciais à Previdência Social, por essa atribuição não estar no seu âmbito de atuação.E sendo essa atividade uma atribuição da Previdência Social, conforme todos os artigos legais e regulamentares aqui citados determinam, não há que se falar em responsabilidade do SUS por esse serviço. Por conclusivo, podemos afirmar que as perícias médicas dos trabalhadores previdenciários são uma atividade a cargo da Previdência Social. A Saúde não tem a atribuição de emitir laudos periciais para a Previdência Social nem tem cargos e especialistas (peritos) para o exercício dessas funções (emitir laudos sobre determinada doença.)Em assim sendo, cabe a Previdência prestar esses serviços de maneira direta ou indireta. Brasília, 30 de abril de 2009 Lenir SantosCoordenador do Núcleo de Direito Sanitário CONASEMS

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Ameaças internacionais ao acesso a medicamentos genéricos.

19/5/2009 23h23
Cláudia Chamas*
OPINIÃORecentemente, 500 quilos do medicamento Losartan, produzido pela empresa Dr.Reddy's, foram embarcados na Índia com destino ao Brasil. No transbordo em aeroporto na Holanda, a carga do anti-hipertensivo foi retida pela aduana local sob a acusação de violação de patente, embora não contasse com proteção patentária na Índia ou no Brasil. Foi alegado que a existência de um regime proprietário naHolanda constituiria elemento suficiente para obstaculizar o livre trânsito da mercadoria. Vale ressaltar que a origem do fabricante era bem conhecida enãohavia intenção de comercializar a droga em território europeu.
O caso Losartan é apenas um entre vários. Em nível internacional, há uma coordenação de interesses dos países desenvolvidos no sentido de usar os conceitos de falsificação e pirataria de medicamentos para além dos interesses de defesa da saúde das pessoas. A regulação desses conceitos em esfera externa às questões de saúde pública constitui medida comercial, justificando ações preventivas em supostos casos de violação de patentes. A expansão dessa abordagem para um acordo global viabilizaria apreensões de genéricos sob a justificativa de crimes de ofensa à propriedade intelectual.
Em janeiro passado, partindo-se de orientações da Força-Tarefa Internacional Anti-Contrafação de Produtos Médicos, foram realizadas tentativas de legitimar política semelhante à europeia no âmbito do Conselho Executivo da OMS. Esses movimentos não vingaramem função de forte oposição do Brasil, com apoio da Índia, de Bangladesh e de outros países em desenvolvimento. Definitivamente, a OMS não é um fórum para a discussão de normas de aplicação de propriedade intelectual. Infelizmente, essa vitória pode ser temporária, posto que não cedem às pressões por medidas de controle mais severas.
Em fevereiro, Brasil e Índia levaram o assunto ao Conselho Geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). O pronunciamento do diretor da Organização, Pascal Lamy, revelou a relevância do caso para a organização, ao destacar que merecem apoio os esforços para garantir o acesso a medicamentos e que barreiras ao comércio genuíno de genéricos devem ser evitadas. Em março passado, o representante permanente brasileiro na OMC, embaixador Roberto Azevedo foi porta-voz de um vigoroso protesto naquela organização (feito também em nome da Índia), no qual chamava a atenção para o episódio, por ele classificado como "uma séria violação das regras da OMC".
A posição do governo brasileiro, expressa pelo Itamaraty, é inequívoca: pirataria e falsificação de medicamentos têm a ver com saúde pública e sua extensão a assuntos ligados à propriedade intelectual servirá apenas para garantir novas pretensões de lucros das indústrias farmacêuticas e dificultar o acesso de populações pobres do mundo a medicamentos essenciais.
As retenções dos últimos meses parecem não levar em consideração todo o empenho dos países em desenvolvimento visando a uma leitura dos acordos Trips mais condizente com a ampliação do acesso a medicamentos essenciais. Contraria o interesse público expresso na Declaração sobre o Acordo Trips e a Saúde Pública (2001), na agenda do Desenvolvimento da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (2007) e na Resolução sobre Estratégia Mundial e Plano de Ação para Saúde Pública, Inovação e Propriedade Intelectual da OMS (2008).
Sucessivas retenções de cargas de genéricos em rota para o Brasil fragilizariam a política de acesso universal a medicamentos. O País importa regularmente princípios ativos de outros países, inclusive de países em desenvolvimento. A proliferação deste tipo de norma afrontaria nossos propósitos de busca por produtos de qualidade ao menor custo possível. O segmento mais afetado negativamente seria a população de baixa renda, usuária intensiva do Sistema Único de Saúde (SUS).
No futuro próximo, tememos a construção de um cenário ainda menos generoso para os sistemas de saúde dos países do Sul. No entanto, acreditamos no bom senso dos formuladores de política dos países desenvolvidos que deveriam rever suas posições unilaterais e não criar obstáculos à produção e distribuição de genéricos, posicionando o interesse humanitário acima das ilimitadas pretensões de lucro. Brasil e Índia têm apontado à OMC vários casos de violação das regras comerciais.
*Pesquisadora do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde da Fiocruz
Fonte: Gazeta mercantil/SP, 19/5/09

Boletim Eletrônico n.8


quarta-feira, 20 de maio de 2009

VIII Conferência Municipal de Saúde de Joinville


Data: 05 e 06 de junho de 2009.
Local: Auditório Central da Univille / Campus Universitário.

A Secretaria Municipal da Saúde de Joinville e o Conselho Municipal de Saúde estão promovendo nos dias 05 e 06 de junho a VIII Conferência Municipal da Saúde que tem como objetivo avaliar a situação da saúde de Joinville, assim como definir diretrizes para a plena garantia da saúde como direito fundamental do ser humano e como política de Estado.
Consideramos que a conferência municipal é o marco do fortalecimento da participação social na plena garantia da implementação do SUS. Nesta oportunidade estarão sendo também cadastradas também novas entidades que comporão o Conselho Municipal de Saúde.
Convidamos toda a população para que neste dia compareçam e juntos possamos fortalecer o Sistema Único de Saúde em nosso município.

domingo, 17 de maio de 2009

A política........!!!!!!!!!!

88% dos médicos do PSF tem contratos precários.



80% dos médicos do PSF tem contratos precários, enfatizou Geraldo Guedes


Durante audiência pública sobre Precarização do Trabalho Médico, o conselheiro do Conselho Federal de Medicina (CFM), Geraldo Guedes, chamou a atenção que 80% dos médicos que trabalham no Programa de Saúde da Família (PSF) tem contratos precários. O médico também disse que dentre dois milhões de trabalhadores da saúde, 800 mil tem trabalhos precários. “O que acaba gerando grande rotatividade e falta dos trabalhadores. Os médicos precisam de uma Carreira de Estado e um Plano de Cargos, Carreiras e Vencimentos, além de um salário digno e a implementação da CBHPM no SUS”, disse Geraldo Guedes. Dados referendados pelo coordenador de gestão de trabalho em saúde do Ministério da Saúde, Henrique Vitalino.

O evento, promovido pela Comissão de Trabalho, de Administração e de Serviço Público (CTASP), da Câmara dos Deputados, aconteceu nesta quinta-feira, dia 14 de maio. O requerimento foi do deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), que acredita que o cenário brasileiro, desfavorável aos médicos, tem se refletido na sociedade por meio da baixa qualidade do atendimento prestado aos usuários dos serviços de saúde.

Para Geraldo Guedes, este quadro é responsabilidade do sub-financiamento do SUS e deficiências da gestão. O médico voltou a cobrar que parlamentares se empenhem a votar a regulamentação da Emenda Constitucional 29. A reunião também teve representantes da Comissão Nacional Pró-SUS – composta pelo CFM, AMB e FENAM -, Ministério do Trabalho e Sindicato dos Médicos do estado da Bahia.

Salário mínimo profissional Na próxima quarta-feira (20), a Comissão de Trabalho vota o Projeto de Lei 3.734/2008, que altera o salário mínimo profissional dos médicos. A reunião acontece no plenário 12, anexo II, às 9h30. O PL 3.734, de autoria do deputado Ribamar Alves (PSB-MA), prevê mudanças na lei 3.999, de 1961, que altera o salário mínimo dos médicos e cirurgiões dentistas. O texto sugere que seja modificada a redação da lei que estabelece o cumprimento de 2h a 4h diárias, passando a estabelecer o período de 20h semanais, como já consagrado hoje pelos médicos.

Durante a sessão será lido o relatório do deputado Mauro Nazif (PSB-RO) que propõe ainda algumas alterações. A principal mudança será no valor do piso salarial estipulado pelo projeto em R$ 7 mil. A Lei nº 3.999 previa que o salário mínimo dos médicos fosse três vezes o salário mínimo em vigor no país, o que, nos dias de hoje, corresponderia a um salário de R$ 1.245,00. De acordo com o projeto original, o reajuste seria baseado no salário mínimo. Agora, com as alterações de Nazif, o reajuste terá como base o INPC.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Faz de conta na Saúde


11/5/2009

JOÃO ALBERTO CARVALHO
Saúde mental, como parte da saúde geral, é coisa básica e inerente à Constituição, que deve ser respeitada. As instituições médicas têm como uma de suas funções defender o acesso aos serviços de saúde e, como decorrência direta, defender os direitos dos pacientes. Para isso, devem propor ações cientificamente embasadas para a formulação de políticas públicas. Os órgãos públicos deveriam implantar tudo o que é necessário para a dignidade humana, incluindo a saúde, com base nesse conhecimento científico.
Lamentavelmente, não é o que observamos.
Um bom exemplo disso são os leitos hospitalares para a psiquiatria: portaria (no 1. 101/2002) do Ministério da Saúde estabelece o índice de 0,45 leito por mil habitantes como o ideal. No Brasil, a proporção está atualmente em 0,23. É um índice pior do que o encontrado em Israel (0,88), Uruguai (0,54) e Argentina (0,68). A falta de locais para internação de pacientes com transtornos graves, na fase mais aguda de suas doenças, é uma dificuldade verificada em todo o território nacional.
A origem do problema está na má gestão da política de saúde mental. Lei federal (10.216/2001) estabelece ênfase no tratamento de base comunitária, com acesso a todas as modalidades de atendimento necessárias ao bom prognóstico dos transtornos mentais. O texto é um avanço importante para a área no Brasil, que conviveu por anos com um modelo de atendimento centralizador e formado basicamente por hospitais de grande porte, que não são a melhor opção terapêutica.
A Associação Brasileira de Psiquiatria foi das primeiras a debater esse assunto, ainda na década de 80. Os trabalhos e pesquisas realizados desde então culminaram com a elaboração, em 2006, das Diretrizes para um Modelo de Assistência Integral em Saúde Mental, que apresenta evidências científicas para a construção de um bom sistema de atendimento na área e está em consonância com a lei 10.216.
É desalentador avaliar o trabalho dos responsáveis pelas políticas de saúdemental. O fechamento de leitos hospitalares sem a criação de uma rede assistencial verdadeira, hierarquizada, com avaliação de eficiência e qualidade dos serviços é francamente bizarro.
Nos últimos anos, a única mudança no sistema de saúde mental foi a desarticulação de serviços macro-hospitalares e criação de centros (Caps), que se desqualificaram amplamente na medida em que as autoridades exigiram destes serviços responsabilidades que tecnicamente cabema outras formas de atendimento, como emergências, hospitaispsiquiátricos e ambulatórios.
Em agosto de 2007, as "Diretrizes" foram entregues ao ministro José Gomes Temporão. Coincidentemente, esse é o marco inicial de uma série de compromissos assumidos e não cumpridos por parte do ministério. Desde então, a única reunião entre o ministério e a Associação Brasileira de Psiquiatria aconteceu em 25 março de 2008 - sete meses depois da entrega do documento.
Nessa audiência, foram definidos três focos de ação para 2008: residência médica, atenção básica em saúde mental e leitos psiquiátricos em hospital geral. No primeiro tema, mais de um ano após a reunião, a única ação proposta pelo ministério foi a participação de um representante da psiquiatria em um encontro da Subcomissão de Estudo e Avaliação das Necessidades de Médicos Especialistas. Também não houve avanço algumno segundo item, a cargo da Coordenação de Saúde Mental.
A situação é mais grave, contudo, no último e mais urgente dos temas - a carência de leitos e unidades psiquiátricas em hospitais. Na audiência, ficou acertada a criação de um grupo técnico de trabalho. Somente no dia 11 de setembro de 2008 foi publicada a portaria nº 1. 899, que criaria oGT sobre Saúde Mental em Hospitais Gerais. No texto, foi estipulado o prazo de 90 dias para a apresentação do relatório com as conclusões do grupo. Já se passaram seis meses. A previsão oficial para a próxima reunião é "maio".
Em relação às medidas para o cumprimento da lei, tornou-se imperiosa e absolutamente natural uma representação noMinistério Público. Os direitos constitucionais dos brasileiros são válidos. Não podemser tratados como um"faz de conta" pueril. As leis nacionais garantemo acesso a tratamentos eficientes na área de saúdemental. É dever do poder público oferecer esses serviços.Saúdemental é coisa séria!
*João Alberto Carvalho é presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria.
Fonte: O Globo, 8/5/09

sexta-feira, 8 de maio de 2009

A saúde pública com gripe


Luiz Bicalho
O que está por traz do surto que teve início no México e como o capitalismo deixa a humanidade gripada.
As notícias são cada vez mais alarmantes: a OMS (Organização Mundial de Saúde) já declarou o nível de alerta 5 (numa escala de 1 a 6). Já são 8 casos confirmados de morte, mais de 150 casos prováveis de morte, milhares de infectados no México, casos confirmados em todos os continentes. Sim, ao que parece, a Gripe Suína – ou Influenza A - chegou para ficar.
Nas TVs e nos jornais, as fotos da população e de profissionais de saúde com máscaras para se proteger da gripe dominam a cena. O governo mexicano ordenou que o exército distribuísse máscaras pela Cidade do México (que já acabaram), ordenou o fechamento de escolas, templos, cinemas, teatros e estádios de futebol. Depois pediu à população que permaneça em casa! O governo da Inglaterra está atrás de fornecedores para comprar milhões de máscaras. Outros países adotaram decisões mais “drásticas”: o Egito, ao que parece, tomou a decisão de matar 300 mil porcos (como se isto detivesse a doença, que se transmite agora de pessoa a pessoa) e o governo da Argentina simplesmente proibiu os vôos vindos do México de aterrissarem no país.
Sim, o desespero toma conta das pessoas e dos governos. Algumas questões, entretanto, precisam ser explicadas para que possamos entender o que está acontecendo e como, sob o capitalismo, até medidas globais de combate a uma doença seguramente perigosa conduzem ao caos e trabalham de forma ineficaz neste combate, favorecendo a própria doença.
A gripe – de 1918 até hoje
A pandemia de gripe de 1918 matou, segundo as estimativas, entre 30 milhões a 100 milhões de pessoas no mundo todo. O site da Fiocruz (um dos mais respeitados institutos de pesquisa médica do Brasil e do mundo), nos conta:“Ainda hoje restam dúvidas sobre onde surgiu e o que fez da gripe de 1918 uma doença tão terrível. Estudos realizados entre as décadas de 1970 e 1990 sugerem que uma nova cepa de vírus influenza surgiu em 1916 e que, por meio de mutações graduais e sucessivas, assumiu sua forma mortal em 1918.
Essa hipótese é corroborada por outro mistério da ciência: um surto de encefalite letárgica, espécie de doença do sono que foi inicialmente associada à gripe, surgido em 1916.” (
Seção de História do site da Fiocruz).
As cenas que hoje as pessoas descrevem com horror no México são assim descritas pela historiadora da Fiocruz:
“Imagine a avenida Rio Branco [avenida com maior trânsito de pedestres no Rio de Janeiro] ou a Avenida Paulista [avenida que é o centro financeiro de São Paulo] sem congestionamentos ou pessoas caminhando pelas calçadas. Pense nos jogos de futebol. Mas, ao invés de estádios cheios, imagine os jogadores exibindo suas habilidades em campo para arquibancadas vazias. Pois, durante a pandemia de 1918, as cidades ficaram exatamente assim: bancos, repartições públicas, teatros, bares e tantos outros estabelecimentos fecharam as portas ou por falta de funcionários ou por falta de clientes.
Pedro Nava, historiador que presenciou os acontecimentos no Rio de Janeiro em 1918, escreve que ‘aterrava a velocidade do contágio e o número de pessoas que estavam sendo acometidas. Nenhuma de nossas calamidades chegara aos pés da moléstia reinante: o terrível não era o número de casualidades - mas não haver quem fabricasse caixões, quem os levasse ao cemitério, quem abrisse covas e enterrasse os mortos. O espantoso já não era a quantidade de doentes, mas o fato de estarem quase todos doentes, a impossibilidade de ajudar, tratar, transportar comida, vender gêneros, aviar receitas, exercer, em suma, os misteres indispensáveis à vida coletiva’.”
O site do Ministério da Saúde (Brasil) fala das últimas pandemias de gripe:
“O intervalo entre as três principais pandemias de influenza que ocorreram no século passado foi de 39 anos entre as chamadas Gripe Espanhola e a Gripe Asiática e de 11 anos entre esta e a Gripe de Hong Kong. Não é possível prever exatamente quando uma nova pandemia ocorrerá, mas é possível, por meio do monitoramento dos vírus influenza e da situação epidemiológica nacional e internacional, identificar indícios de que este fenômeno possa estar mais próximo de acontecer. Para a eclosão de uma pandemia é necessário, basicamente, o surgimento de uma nova cepa (tipo) do vírus influenza com capacidade para provocar doença no homem e que esta cepa tenha facilidade de ser transmitida por contágio inter-humano direto (ou seja, de pessoa-a-pessoa).” (
Ministério da Saúde)
Traduzindo, aconteceu uma pandemia em 1918-19, outra em 1957-58 e depois em 1968-69. Abaixo, um histórico mais preciso das pandemias de gripe do século XX:
“A ‘gripe espanhola’ de 1918-1919 originou a taxa de mortalidade mais elevada alguma vez associada à gripe. Devido a esta doença, morreram cerca de 500 mil pessoas só nos Estados Unidos. No mundo inteiro, durante esta pandemia, a gripe foi a causadora de 20 milhões de mortes.
A ‘gripe asiática’, de 1957-1958, provocou 86 mil mortes nos Estados Unidos.
A ‘gripe de Hong-Kong’, de 1968-1969, originou um menor número de mortes do que as pandemias anteriores. Durante este período morreram 34 mil pessoas vítimas da gripe nos Estados Unidos. Esta reduzida taxa de mortalidade foi atribuída a dois fatores: em primeiro lugar, as estirpes das gripes ‘de Hong-Kong’ e ‘asiática’ tinham semelhanças genéticas (a imunidade desenvolvida na população contra a estirpe ‘asiática’ pode ter conferido alguma proteção contra a estirpe ‘da gripe de Hong-Kong’); em segundo lugar, pensa-se que uma estirpe de gripe semelhante à do vírus da ‘de Hong-Kong’ poderá ter circulado entre os finais do século XIX e os primeiros anos do século XX, havendo ainda algumas pessoas com mais de 60 anos de idade com imunidade residual.
Pensa-se que a maioria das pandemias de gripe tem tido origem na China, que é por alguns considerada o epicentro da gripe.
Com efeito, a agricultura tradicional praticada na China faz com que as aves, os suínos e os seres humanos estejam em contato próximo. Esta situação propicia um "laboratório" natural para novas recombinações de vírus da gripe.” (
Site da Roche de Portugal)
Claro está que não concordamos com o “diagnóstico” do laboratório - frio como é frio o capitalismo frente às necessidades da humanidade - de que a gripe de Hong-Kong, que matou mais de 34 mil pessoas nos EUA tenha sido “moderada”. Mais ainda, se contarmos a estimativa que a gripe de 1958 matou 2 milhões de pessoas e a 68 matou 1 milhão de pessoas.
Entretanto, é preciso lembrar que a gripe mata por ano por volta de 250 mil a 500 mil pessoas no mundo inteiro! Consultando o site da OMS eu fiquei pasmado ao ver que estas estatísticas não constam das páginas principais. Essas mortes poderiam ser evitadas? A maioria das mortes atinge pessoas mais idosas, que já tenham outras doenças e que, nestes casos, é difícil dizer que os recursos hoje existentes poderiam salvá-las. Por outro lado, o segundo grupo atingido é o de crianças e, neste caso, é evidente que a falta de um diagnóstico rápido e preciso, a falta do atendimento a saúde, é que levam à morte.
Claro está que isto é agravado pelas condições de vida da criança. É preciso lembrar que neste período de crise econômica a fome atingirá, este ano, 1 bilhão de pessoas! Não é preciso ser mágico para imaginar quem vão ser os mais atingidos pela gripe e não precisamos ser cientistas ou possuir um alto cargo na OMS para declarar que “os pobres vão sofrer mais as conseqüências desta crise”. Também é verdade que dependendo da variedade do vírus, teremos uma gripe mais mortal ou uma mais simples, as mais letais permitindo que entrada de outras infecções “oportunistas” (que se aproveitam da baixa imunidade gerada pela gripe) como pneumonia.
Por último, o vírus da gripe sofre mutações rápidas e as vacinas não acompanham todas as mutações. Em outras palavras, a pessoa pode ter sido vacinada contra a gripe e ser atingida por uma mutação do vírus que se desenvolveu pouco tempo atrás. O vírus se desenvolve não só na raça humana, como em aves e porcos. As maiores pandemias de gripe parecem ter se originado em vírus vindos do porco e que se adaptaram ao corpo humano, podendo reproduzir-se e serem transmitidos de um humano para outro.
A gripe aviária que assustou o mundo por sua capacidade letal não conseguiu chegar a este estágio. O susto atual é que esta epidemia vem acompanhada com uma capacidade de transmissão de humano para humano muito alta. Como a maioria das doenças causadas por vírus, os remédios não são simples e foram desenvolvidos mais nos últimos anos, a partir do combate contra a AIDS, os chamados anti-virais.
Origens do surto atual de gripe
A gripe, ao que tudo indica, originou-se no México, contrariando as expectativas e a história de todas as pandemias anteriores. Segundo alguns pesquisadores, poderia ter sido feita pela combinação virótica entre cepas (tipos de vírus) da gripe suína, aviária e humana. Segundo outros, foi a combinação de dois tipos de gripe suína passada posteriormente para humanos. O fato da gripe ter vindo recentemente impede que se tenha uma resposta concreta para isso.
Por outro lado, o medo gerado na OMS tem sentido: a gripe tem um alto nível de transmissão e caso se torne mais letal, o número de mortes poderá ser absurdo. Apesar disso, as autoridades de saúde do México e das Américas (onde a gripe mais se difundiu) demoraram a reagir. O jornal The Financial Times mostra estes dados – e não temos porque duvidar da imprensa capitalista quando ela própria mostra as mazelas do sistema:
“Funcionários graduados de serviços de saúde latino-americanos e internacionais foram informados sobre o surto de gripe suína no México pelo menos duas semanas antes de lançarem alertas públicos quanto à doença.
A demora alimenta dúvidas quanto à possibilidade de que mais pudesse ter sido feito para prevenir a difusão da infecção pelo mundo. A Veratect, consultoria americana que monitora reportagens veiculadas na internet, confirmou ontem que a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) teve acesso a alertas sobre um surto no México em 10 de abril, mas não emitiu alerta público até o dia 23 de abril.” (The Financial Times, reproduzido pela Folha de São Paulo, 30/04/2009).
Treze dias de atraso numa situação em que se contam em horas o tempo de contágio? Realmente é brincar demais com a vida humana. Mas seria só este o atraso? O texto continua:
“A OMS informou que a primeira notificação que recebeu sobre o surto foi em 16 de abril, por meio da Opas. Dois dias mais tarde, em 18 de abril, a organização recebeu confirmação do CDC (Centro de Controle de Doenças dos EUA) de que havia dois casos da gripe na Califórnia.”
Então, não é apenas porque temos um país “atrasado” (o México) que a demora aconteceu. Dois casos há haviam sido relatados e confirmados no Centro de Controle de Doenças dos EUA e os testes já podiam ser feitos (os primeiros testes são feitos de forma negativa. Pelos resultados clínicos se confirma que é gripe e são comparadas amostras do vírus com amostras disponíveis de surtos anteriores. Este é o teste que ainda está sendo feito no Brasil, até a chegada de amostras do novo vírus, provavelmente em 30 de abril ou 1º de Maio. Depois os casos passam a ser confirmados com a comparação direta com os vírus obtidos dos primeiros casos).
Enfim, em 18 de abril a OMS (8 dias antes do “alerta”) já tinha os dados. Mas resolveram esperar. Muito tempo para uma doença em que, no primeiro dia (e às vezes até no segundo dia), a pessoa não apresenta sintomas, mas transmite a doença; para uma situação em que o remédio disponível - os antivirais - deve ser aplicado com início entre o 4º ou 5º de contaminação e em que a duração da doença em cada pessoa – quando sobrevive – é entre 7 e 14 dias.
É um escândalo! Mas o problema é bem pior que isso:
“Bob Hart, vice-presidente da Veratect, disse que sua empresa relatou em 30 de março a seus clientes - OMS, CDC, governos, empresas e ONGs - a internação em um hospital canadense, oito dias antes, de um advogado que sofria de uma doença respiratória ao voltar do México.” (ibidem).
Quanto tempo demora o teste para ver se é uma nova cepa de vírus? Segundo o Laboratório Oswaldo Cruz, o tempo de demora é de dois dias. Ou seja, se tivesse sido feito o teste, já se saberia (no Canadá), no máximo em 3 de Abril, da existência de uma nova variedade do vírus! Mais de 20 dias perdidos e tendo como resultado, depois disso, na disseminação da doença de forma indiscriminada no México, onde a população não foi alertada e as mortes se acumulam e também nos EUA! Em outras palavras, a pandemia mundial poderia ter sido detida e talvez boa parte das mortes no México poderiam ter sido evitadas!
Devemos lembrar que a saúde pública no México está sendo privatizada e isto teve influência direta no surto de gripe (ver artigo dos camaradas mexicanos Ubaldo Oropeza e Luis Enrique Barrios
no site da CMI). A saúde nos EUA também é toda privada, apesar de todas as agências de controle. E a OMS, apesar do seu nome pomposo, segue este modelo e o máximo que consegue, além das “normas” e “diretrizes” é apelar para que a indústria doe mais remédios para os países pobres e que “tente” produzir uma vacina.
Combatendo a gripe: prevenção, remédios e vacina
As medidas tomadas pelos governos são, em certa medida, muito mediáticas. A mais espetacular e mais idiota – e não conseguimos achar um adjetivo mais simples – foi a decisão de matar 300 mil porcos no Egito. Outras, como o fechamento de fronteiras, podem funcionar por alguns dias se a gripe não se disseminar. Mas, à medida em que ela passe do México e EUA para outros países, a gripe dissemina-se pelo mundo. Uma notícia de 30 de abril dando conta que os turistas estão abandonando em massa o México, em particular a praia de Cancun, permite especular que a gripe vai aumentar a sua disseminação pelo mundo. Lembremos que os primeiros casos fora do México foram a trabalho, turismo ou estudos. Foram estudantes que levaram a gripe para Nova York. Um fuzileiro Naval que voltou do México que levou a gripe para a Califórnia. E pela fronteira entre EUA e México, no momento atual, devem estar seguindo milhões de norte-americanos com medo da gripe e fugindo do país vizinho, carregando o vírus em ondas crescentes.
Os casos em outros países foram, em principio, de pessoas que voltaram do México. Além dos EUA e México - que concentram a maioria dos casos - mais 10 países têm casos confirmados e alguns, como o Brasil, tem vários doentes sendo acompanhados e sendo testados enquanto este texto é escrito. Todos os que tiveram já os resultados divulgados foram negativos, mas a onda fugitiva do México se amplia e com ela a difusão da gripe pelo mundo. Assim, enquanto os vôos do México para a Argentina estão proibidos, o que eles farão quando a gripe chegar ao Brasil e outros países vizinhos? E quando chega na Europa e EUA? Proibir vôos e navios? Seria simplesmente parar toda a economia e isto não é suportável no momento. Além disso, apesar de todo o alarme e toda a prevenção – e ela deve ser feita – fora do México o número de casos ainda é baixo (menos de 200).
Claro que numa economia socialista a situação poderia ser tratada de modo diferente: médicos, enfermeiros e auxiliares poderiam ter sido deslocados para o México. Tratamento teria sido oferecido aos mais pobres e, além disso, garantido a eventuais turistas também o tratamento e acompanhamento. Se necessário, além de aulas, teatros, cinemas e jogos, também o trabalho seria suspenso, exceção feita ao essencial como serviço de saúde e distribuição de alimentos. Todas as áreas afetadas do México poderiam ser suportadas pela produção em outros países e áreas não afetas. Mas isso exige cooperação e cooperação o capitalismo não pode oferecer nem ao menos para fazer chegar um aviso em tempo hábil de possibilidade epidêmica, como mostramos acima!
Se algumas medidas de prevenção são úteis – como suspensão de escolas e espetáculos públicos, lavagem das mãos, etc. – outras seriam necessárias, como a suspensão de trabalho. Já outras são simplesmente, como se diz no Brasil, “para inglês ver”, como as máscaras respiratórias.
Especialistas relatam que elas teriam melhor efeito se usadas pelos doentes - e a pessoa pode estar doente sem saber – e que, no melhor dos casos perderiam efeito em duas ou três horas, já que a umidade das respiração levaria a torná-la não só uma transmissora, como também portadora do vírus. E como a maioria das pessoas não deve tomar os cuidados básicos ao chegar em casa, como ferver as mascaras antes entrar em contato com outras pessoas da família, é de duvidar de sua eficácia, se não puder ela mesma se tornar em um meio a mais de transmissão.
As máscaras que estão sendo usadas são simples panos sobre boca e nariz e o vírus é muito menor que os furos existentes. Máscaras usadas na construção civil impedem a passagem de partículas menores, mas mesmo assim são vulneráveis. Uma máscara melhor teria que fazer uma filtragem de ar e, provavelmente, só seria hoje disponível para pessoal médico, se o for (lembremos que em operações quem usa as mascaras são médicos e auxiliares para impedir a transmissão de doenças aos pacientes).
O site da Fiocruz explica como se dá a transmissão da gripe – e reparem na referência explícita aos lenços:
“A transmissão da gripe entre humanos se dá por meio de gotas de saliva e outras secreções das vias aéreas. Embora seja mais comum a transmissão de pessoa a pessoa, também é possível adoecer a partir do contato com objetos contaminados, como, por exemplo, talheres, lenços e teclados de computador, já que os vírus da gripe se mantém viáveis – com plena capacidade para entrar em um organismo e aí se reproduzir – no ambiente por cerca de uma hora.”
O segundo tipo de tratamento é atacar o vírus diretamente com anti-virais. Estudos feitos nos EUA mostram que pelo menos dois anti-virais já não atuam nos principais tipos de gripe - que criaram imunidade a partir do seu uso indiscriminado.
E, provavelmente, aqueles que têm um pouco mais de dinheiro – grande, média e pequena burguesia; trabalhadores mais qualificados – correm para hospitais e clínicas particulares com quaisquer sintomas de gripe e não deve ser difícil achar um médico que faça uma receita com o anti-viral. Resultado: aumenta a possibilidade de que um próximo surto da gripe não possa ser contido pelos anti-virais de hoje.
Novamente, em um sistema estatizado de saúde – totalmente estatizado – os anti-virais só seriam aplicados em pacientes que correm risco de vida (novamente - eles só fazem efeito se aplicados até o 4º ou 5º dia da contaminação). Um grande número de pessoas, inclusive, pode permanecer em casa ao invés de ir ao hospital – é sempre maior o risco de se pegar uma infecção oportunista (que entra no organismo debilitado pela gripe) num hospital do que em casa.
Mas a desordem capitalista, a existência de decisões individuais que buscam a salvação a qualquer custo, acaba custando muito caro em vidas e mais doentes, não só entre os “outros”, mas inclusive para si e para sua família.
Isto quer dizer que todos que estão doentes devem esperar sentados? Claro que não, devem buscar o melhor tratamento disponível no meio do caos que aumenta na saúde (o caos, pelo menos em países como México e Brasil, já existe há muito tempo). Agora, a soma destes tratamentos individuais aumenta o risco da pandemia como um todo, ao invés de afastá-la.
Outros cuidados elementares: o doente usar máscara (isto sim, faz efeito, diminuindo a difusão do vírus), todos os parentes lavarem as mãos, utensílios e demais objetos tocados pelo doente (inclusive lençóis, sofá, maçaneta, computador, etc.). Novamente aqui a miséria impõe um limite: é fácil dizer a alguém que mora no “asfalto” carioca que lave a mão toda hora, mas dar este conselho em todos os morros não é eficaz. Um grande número deles não possui água encanada ou, se o possui, dependem de um armazenamento próprio em cima do morro que não pode ser “gasto” dessa forma sob pena da água acabar.
O terceiro tipo de tratamento é preventivo, fazer uma vacina. É uma tarefa simples e difícil. Produzir a vacina pode ser fácil. Produzi-la com a toxicidade necessária para que crie os anticorpos e não infecte os humanos é mais difícil. Lembremos do trágico exemplo da vacina de 1978 nos EUA. A maioria dos especialistas concorda que uma vacina demoraria quase 6 meses para ser confeccionada. Por outro lado, nas pandemias anteriores ainda não havia tecnologia para se produzir vacinas para gripe. Agora, é possível produzi-las e são necessárias.
Probabilidades
Hoje as autoridades declaram e repetem que não se pode prever o que acontecerá com este surto de gripe no próximo momento. Uma declaração muito pouco científica. Qualquer previsão, se podemos fazê-la, sempre corre o risco de ser errada. Mas quando se joga com a vida de milhões de pessoas – e foram milhões que morreram nas últimas pandemias de gripe, então o melhor é prever o pior. As duas vertentes que tentam explicar a origem da gripe concordam em uma coisa: o novo vírus surgiu nos porcos e veio para os humanos (podendo ser a junção de dois tipos anteriores de gripe suína ou de um vírus suíno, um vírus aviário e um vírus humano).
A experiência mostrou que, nestes casos, demora um pouco para o vírus sofrer mutação e se adaptar melhor ao organismo humano. Em outras palavras, demora um pouco para que ele passe a ter efeitos mais mortais e seja transmitido de forma mais intensa que é hoje.
É a única previsão possível? Claro que não. O vírus pode se adpatar e “normalizar”, igual a uma gripe comum (das que matam entre 250 mil a 500 mil por ano). Então, todas as providências que visem a criar remédios e vacinas são necessárias. E, novamente, todas estas medidas esbarram exatamente na barbárie capitalista.
Desde o uso indiscriminado de anti-virais que criam vírus resistentes, até a volta de infecções que podiam ser combatidas com antibióticos e que hoje não podem mais por terem se tornado resistentes, são conseqüência direta da barbárie capitalista, onde a saúde é administrada individualmente sem considerar os problemas gerais.
É evidente que temos que salvar os doentes e protegê-los por todos os meios possíveis. Mas se uma dosagem de antibiótico não é acompanhada, se no final sobraram bactérias vivas, pode ter sido selecionada uma linhagem resistente (como se seleciona também linhagens resistentes de vírus) e esta agora não poderá mais ser combatida com aquele antibiótico. Em outras palavras, a desordem e o descontrole levam à proliferação de doenças que poderiam ser combatidas facilmente.
Depois as vítimas principais da gripe encontram-se principalmente entre os mais pobres, os que têm fome ou com a resistência minada pela má alimentação (gordura nem sempre é sintoma de boa alimentação, se não houver ingerido as vitaminas e combinações corretas de proteínas, gorduras e açucares, o organismo tende a engordar ou emagrecer, mas, sempre, perde a sua resistência natural). E boa alimentação depende de... ganha um doce quem falou “dinheiro”. Mas a crise atual tem suas vítimas iniciais justamente entre os mais pobres, entre os trabalhadores.
Resumindo: é preciso acabar com a pobreza, é preciso acabar com a falta de higiene, é preciso acabar com a falta de alimentação ou a má alimentação. É possível fazer isso? Ora, em momento de crise vamos ter é justamente o contrário: é o aumento dos pobres. Em outras palavras, a gripe, agora, pode não se disseminar. Mas o caldo de cultura para tal, a miséria que aumenta no mundo, mostra que esse episódio não será o último nesta história da gripe e de suas conseqüências para a humanidade.

domingo, 3 de maio de 2009

O SUS no STF

AUDIÊNCIA PÚBLICA NO STF SOBRE SAÚDE
PRONUNCIAMENTO DO PRESIDENTE DO CONASEMS ANTÔNIO CARLOS NARDI

28 DE ABRIL DE 2009 – TERÇA-FEIRA
RESPONSABILIDADE DOS ENTES DA FEDERAÇÃO E FINANCIAMENTO DO SUS


Excelentíssimo Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal Ministro Gilmar Mendes, na pessoa de quem saúdo a todos os presentes.
O CONASEMS gostaria de parabenizar o Senhor Presidente, pela realização desta audiência pública e pela oportunidade que estamos tendo em dialogar com os diversos atores da sociedade sobre este tema tão importante para o povo brasileiro.
Esperamos que, com esta audiência, possamos buscar uma posição de equilíbrio e racionalidade para garantir o direito à saúde de todos os brasileiros.
Gostaria de reafirmar o compromisso dos gestores municipais de saúde, antes de tudo cidadãos brasileiros, com a Constituição Federal, que proclama que saúde é um direito de todos e dever do Estado.
Desde 1988, quando se iniciou o processo de municipalização da saúde e a descentralização dos serviços, os municípios têm se esforçado para garantir o direito à saúde e, sobretudo, os princípios do Sistema Único de Saúde, como a universalidade, a integralidade e a equidade.
Um dos grandes problemas de garantia do direito à saúde no Brasil é o sub-financiamento da saúde pública. Se compararmos o quantitativo de recursos gastos com saúde no Brasil, somando-se o público e o privado não atingem 8% de nosso PIB, enquanto a média dos países que têm sistemas universais de saúde gastam mais de 10% do PIB e EUA, 15% do PIB. Se tomarmos o gasto per capita com saúde, público e privado o Brasil gasta cerca de 700 US$ per capita, enquanto os EUA gastam 7.500 US$ per capita e outros países desenvolvidos entre 3 e 5 mil US$ per capita.
Neste quadro, os municípios têm mostrado, na prática, seu compromisso. Em 2006, o gasto municipal com saúde foi de R$6bi ou 30% a mais que o mínimo constitucional de 15%. Em 2007, pelo SIOPS/MS, os municípios tiveram um investimento de R$25,8 bi, representando 27% do gasto total em saúde quando ficam apenas com 16% da arrecadação do bolo tributário. Os gastos próprios municipais com saúde tiveram um incremento de 265%, pois o gasto foi de R$7,4 bi em 2000 e de R$26 bi em 2007.
Mesmo que as três esferas tenham gasto com saúde R$94,4 bi em 2007, temos um concreto e real sub-financiamento da saúde. Diante disto defendemos veementemente a imediata regulamentação da EC-29.
Ainda que estes recursos sejam reconhecidamente insuficientes, o SUS, cujo ente executor principal é o município, superou-se na execução de ações e serviços de saúde. Em 2007, foram realizados 2,8 bilhões de procedimentos; 11,3 milhões de internações; 619 milhões de consultas; 2,5 milhões de partos, entre normais e cesarianas; 3,2 milhões de cirurgias; 12 mil transplantes públicos o equivalente a 80% do total; 150 mi de vacinas; 244 mi de ações de odontologia; 28 mi de ações de vigilância sanitária básica.
A ação em Saúde é, no mundo inteiro, dependente da presença humana. A pesquisa da Assistência Médico-Sanitária/IBGE, de 2005, mostra que a esfera de governo municipal é a responsável pela contratação de quase 70% dos servidores públicos em saúde, enquanto os estados são responsáveis por cerca de 24% e a União 7%. Para cada 10 empregos municipais em saúde existe um emprego federal e 3 estaduais. Os municípios já atingiram os limites prudenciais da LRF. Essa situação indica a necessidade e a urgente reflexão sobre a contratação dos trabalhadores no SUS e o seu impacto na gestão municipal e a reposição da força de trabalho.
Estas informações demonstram o quanto os municípios estão empenhados em garantir o direito à saúde e a cada ano, tem se comprometido de forma efetiva com o aumento nos investimentos em saúde.
Entretanto, diante de necessidades ilimitadas os recursos são limitados e finitos e gostaríamos de debater o que é possível garantir em relação à atenção à saúde. Com a inserção de novas tecnologias, principalmente, as que ainda não foram comprovadas cientificamente, corremos o risco de utilizar os recursos existentes em procedimentos terapêuticos que não contribuem com a saúde da população. Pelo contrário, temos que tomar cuidado com o risco de procedimentos experimentais que possam trazer danos irreparáveis à saúde dos pacientes.
Precisamos enfrentar esta questão, sem preconceitos. Nossa idéia é regular ações e serviços de saúde, de forma científica e eficiente para ampliar e oferecer qualidade no atendimento. Não estamos falando de restringir o direito à saúde mas, garanti-lo por meio de protocolos produzidos por equipes técnicas multiprofissionais, altamente qualificadas, para que possamos melhorar o acesso de forma eqüitativa e com qualidade.

Foi mencionado neste fórum que alguns Juízes de Primeira Instância têm dificuldades em estabelecer sua sentença inicial pois nem sempre dispõem de informação e conhecimento para tomar decisões o que os leva a encaminhar aos Gestores Municipais para que providenciem exames e terapias especializados que extrapolam sua competência. De outro lado temos, também, dificuldades com os gestores municipais de inúmeros municípios de pequeno e médio porte que não têm conhecimento acumulado, nem como recorrer a especialistas em determinados diagnósticos e terapias e que são demandados a fornecê-los sob a pena das leis. Por vezes, o cumprimento de ordem judicial ou orientação do MP leva a que pequenos municípios arquem com despesas para um único usuário, que equivalem a todo o recurso destinado a toda a população na atenção básica.

Entendemos que o preceito constitucional que garante a integralidade da atenção à saúde deve estar dependente da obrigação do Estado de regular o sistema, em conjunto com a população, por meio dos conselhos de saúde. É impossível e irracional se pensar que a integralidade seja um conceito aberto, solto no espaço, sem nenhuma regulamentação. A integralidade ilimitada, sem base cientifica, ética e orçamentária, e sem o compromisso para com a coletividade não atende a própria Constituição que impõe o dever de priorizar as ações e os serviços preventivos aos curativos. Além disso, é uma afronta ao bom senso e à hermenêutica do direito à saúde.
Precisamos organizar os serviços de saúde em uma rede regionalizada e hierarquizada, articulando o cuidado em saúde e garantindo o acesso a uma integralidade regulada.
É imprescindível ter regras claras e únicas para o cidadão que usa sistematicamente o SUS e para aqueles que vêm demandar apenas parte da assistência do SUS por serem beneficiários de planos e seguros de saúde. O usuário, detentor de plano, ao demandar o SUS deverá observar todas as regras do sistema, ingressando obedecendo a porta de entrada da rede do SUS e submetendo-se a todas as normas e fluxos estabelecidos. É importante ressaltar que muitos pacientes pretendem apenas um determinado procedimento que nem sempre o SUS o indicaria.
Como exemplo, um estudo publicado no “JAMA” (revista da Associação Médica Americana) que avaliou as diretrizes internacionais em cardiologia e constatou que 47,5% carecem de comprovação de eficácia. Um dos autores deste estudo e membro do Instituto de Pesquisas Clinicas da Universidade de Duke, afirmou que os médicos devem ter cautela ao considerarem as recomendações sem sólida evidencia cientifica.
Contudo, temos a clareza de que existe um hiato muito grande entre as expectativas dos pacientes e o que a comunidade cientifica pode oferecer, pois muitas vezes, inexistem respostas científicas e as novas pesquisas são morosas.
Lidamos com vidas humanas e, por isso, temos responsabilidades em garantir a rapidez do processo para salvar e possibilitar a qualidade de vida das pessoas. Precisamos programar mecanismos mais ágeis para a incorporação de medicamentos e insumos na lista do SUS.
Sabemos que os altíssimos recursos utilizados para o cumprimento de decisões judiciais de cunho individual e sem evidente eficácia, se investido no coletivo, em respostas científica e socialmente aceitas, daria para ampliar o cuidado em saúde, beneficiando, assim, um número muito maior de pessoas.
No artigo de Fernando Mânica, ao defender o principio da proporcionalidade, ele cita o caso em que o Ministro Gilmar Mendes consignou em seu voto na decisão que julgou improcedente o pedido de intervenção federal no Estado de São Paulo, em razão do não pagamento dos precatórios judiciais. O Ministro assim definiu o seu voto:
“Em síntese, a aplicação da proporcionalidade se dá quando verificada restrição a determinado direito fundamental ou um conflito entre distintos princípios constitucionais de modo a exigir que se estabeleça o peso relativo de cada um dos direitos por meio da aplicação das máximas que integram o principio da proporcionalidade. São três as máximas parciais do principio da proporcionalidade: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito.Tal como já sustentei (...) há de perquirir-se, na aplicação do principio da proporcionalidade, se em face do conflito entre dois bens constitucionais contrapostos, o ato impugnado afigura-se adequado (isto é, apto para produzir o resultado desejado), necessário (isto é, insubstituível por outro meio menos gravoso e igualmente eficaz) e proporcional em sentido estrito (ou seja, se estabelece uma relação ponderada entre o grau de restrição de um principio e o grau de realização do principio contraposto)” STF, Órgão Pleno, Relator Ministro Gilmar Mendes, julgado em 19/03/03.
Refletindo sobre esse argumento da proporcionalidade, podemos pensar que um princípio não pode ter a supremacia absoluta diante de outro principio.
Então, o direito individual não pode se sobrepor ao direto coletivo até porque o art. 198, inciso II, da CF reza que na integralidade à saúde deve-se priorizar as ações e os serviços preventivos. Além do mais, a responsabilidade solidária dos três gestores do SUS recai quase sempre sobre o Município, pois as pessoas moram nos municípios. A definição da integralidade da assistência do art. 7º, II, da Lei 8.080/90, expõe com clareza que essa integralidade deve ser satisfeita no SISTEMA e não em cada ente federativo individualmente considerado.
Não se pode perder de vista que o SUS, nos termos do art. 198 da CF, é configurado como uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços de saúde. E rede regionalizada requer gestão interfederativa, gestão compartilhada entre as esferas de governo.
A nossa defesa é a de que temos que ter protocolos, atualizados periodicamente, que possibilitem o uso racional de medicamentos, exames e procedimentos e, principalmente, a qualidade do acesso ao cuidado em saúde.
O individuo não pode esperar que a sociedade não aja de forma racional para o atendimento do seu direito individual. No caso de não haver a comprovação cientifica do procedimento em questão, o que torna a ação irracional, o individuo não poderá ver o seu pleito atendido.
Defendemos que os usuários do SUS, como cidadãos, têm toda legitimidade para buscar os seus direitos, inclusive, por meio de ação judicial. Contudo, cabe a justiça agir racionalmente. Para tanto, propomos o fortalecimento dos mecanismos de regulação para o uso de novos procedimentos terapêuticos de eficácia comprovada. Ignorar os avanços tecnológicos não é aceitável do ponto de vista ético e científico, contudo, não se espera que qualquer novidade de mercado seja incorporada à lista gratuita.
Propomos que deva ser fortalecida estrutural, técnica e politicamente, no Ministério da Saúde a CITEC Comissão para Incorporação de Tecnologias no âmbito do SUS e da Saúde Suplementar que trabalhará integradamente às Câmaras Setoriais da ANVISA. Avaliando primeiro, a existência nos protocolos da similaridade de procedimentos diagnósticos e terapêuticos demandados. Segundo, se não estiver regulamentado e houver evidencia cientifica, que sejam rapidamente incorporados ao serviço publico de saúde, facilitando o acesso ao tratamento do usuário.
Desta forma, evitaremos pressão dos produtores e comerciantes de medicamentos, equipamentos, procedimentos, nacionais ou multinacionais que têm o interesse financeiro envolvido e podem deixá-lo se sobrepor à saúde da população.
Esperamos que esta audiência possa apontar caminho mais racional para os julgamentos, pois temos certeza que as decisões judiciais jamais podem substituir as políticas publicas de saúde.
Essa responsabilidade, com base na Constituição Federal, é dos gestores das três esferas de governo. E por isso, estamos aqui nesta audiência para encontrar saídas para a judicialização da saúde, assim como temos, permanentemente, nos reunido nos espaços de pactuação tripartite para aperfeiçoar o SUS e melhorar cada vez mais a saúde da população brasileira.
Este é o nosso compromisso!

Muito Obrigado.