domingo, 27 de julho de 2008

A saúde e a política: um dirigente não se inventa nem se produz em série.

José da Rocha Carvalheiro
Presidente da Associação Brasileira de Pós-Graduação
em Saúde Coletiva (ABRASCO)
A administração da OMS, dirigida pela médica Dra. Brutland, criou um
organismo de análise macroeconômica na saúde. Não por acaso, já que ela
figura entre os “principais economistas” do século XX por ter presidido a
cúpula do ambiente (Rio 92) onde se firmou o conceito de desenvolvimento
sustentável. Nada mais fez do que consolidar a idéia de associar saúde com
desenvolvimento, tarefa de nossos dias. Reconhecendo a existência de um
“complexo produtivo em saúde”, constituído pelo setor industrial e pelo
sistema de prestação de serviços, em mútua determinação.
No caso brasileiro, não se pode pensar no sucesso do SUS sem,
simultaneamente, equacionar o processo de Pesquisa, Desenvolvimento e
Inovação em saúde, onde a “inovação” está em íntima conexão com o
acesso a bens e serviços. O que não difere do senso comum de qualquer
inovação estar sempre associada à sua difusão, o que a diferencia da mera
invenção. Os mecanismos capazes de alavancar o desenvolvimento (PD&I)
são de distinta natureza. Entre os de impulso (“push”) está a pesquisa
científica e tecnológica. Nesse sentido o sistema brasileiro de pós
graduação desempenha papel de relevo. Os mecanismos facilitadores
(“pull”) começam a ser discutidos cada vez com maior clareza, por exemplo,
as compras do governo. Para mencionar apenas dois, temos a aprovação no
Congresso Nacional da Lei da Inovação e o recente Decreto do Presidente
da República criando a Política Nacional de Desenvolvimento da Indústria
Biotecnológica.
A missão da saúde pública no Brasil é difícil e complexa. O Ministério
da Saúde conduz um dos mais importantes Sistemas Nacionais de Saúde do
mundo em desenvolvimento. O SUS não é invenção de gabinete. Fruto de
um movimento social que, embora com raízes no século XIX e início do
século XX, é resultado em sua fase mais recente do esforço de pouco mais
de uma geração de militantes. Entre os protagonistas dessa militância
figuram as organizações científicas da área da saúde que constituem na
atualidade o Fórum da Reforma Sanitária. Num sentido mais amplo, esse
Fórum inclui novos parceiros: o Ministério Público e a Frente Parlamentar da
Saúde. Tem sido este, nos últimos tempos o principal mecanismo de debate
(teórico e prático) dos principais temas que envolvem o SUS. Contando
sempre com seu parceiro permanente: o “controle social” exercido no
cotidiano do SUS e, especialmente, nos Conselhos e nas Conferências de
Saúde. É necessário lembrar que essa organização se dá não apenas a nível
nacional, também nos vinte e sete estados e nos quase seis mil municípios.
Os gestores também se organizam em seus Conselhos de Secretários
de Saúde, estaduais (CONASS) e municipais (CONASEMS e COSEMS). Além
de Comissões de consenso intergestores nacional (“tripartite”) e em cada
estado (“bipartites”). A governabilidade de um sistema com esta
capilaridade está ancorada na capacidade de negociação permanente dos
dirigentes do SUS em todos os níveis. Portanto:
- Considerando a complexidade das determinações que hoje sustentam esse
arcabouço que envolve a organização da sociedade para enfrentar a
missão de garantir o bem-estar da população;
- Considerando as peculiares condições dos avanços já conseguidos na
organização da gestão do SUS;
Só podemos admitir que o dirigente máximo desse sistema seja um
profissional capaz de aliar habilidade política com formação técnica. Que
seja capaz de um diálogo em nível elevado com os demais pares do estado
democrático em todos os níveis, inclusive os poderes legislativo e judiciário,
além do ministério público. Também com os produtores públicos e privados
dos grandes setores do complexo produtivo (industrial e serviços). Com a
academia, responsável pelo “push” em todos os setores. Além, obviamente,
de ser um militante testado na prática democrática que impera no campo da
Saúde Pública no Brasil. Com seus Conselhos e Conferências, que lhe
conferem característica inédita no mundo.
Infelizmente esses dirigentes são raros, não se produzem em série.
Nossa expectativa é que o Presidente da República tenha em mente essa
raridade ao fazer sua opção pelo novo Ministro da Saúde.

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