quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

A violência do dia a dia.


Encerramos 2008 com um número absurdo de 85 homicídios em Joinville. Mesmo assim a grande maioria da população ainda não trata esse tema como um problema seu, nosso de cada dia, apenas em alguns casos fazemos brincadeiras de mau gosto quanto ao bairro onde se deu o crime, até porque na grande maioria esses homicídios envolvem jovens pobres e moradores da periferia de nossa cidade. Fica a pergunta: será que isso é pura coincidência?
Precisamos urgentemente baixar essa taxa de criminalidade. Para isso a sociedade tem que tomar para si esse tão importante assunto, assim como em todas as agendas governamentais (município, estado e união) o tema segurança deve estar presente. A violência vem aumentando ano após ano, é só abrir os jornais e acompanhar essa evolução trágica. Tenho a sensação que está se tornando uma calamidade pública, infelizmente ainda não sentida por todos. Será que precisamos chegar na situação do Rio de Janeiro ?
Sabemos que a resposta para a violência não se dá apenas com mais investimentos em segurança pública, mas também a atenção que se direciona na elaboração de políticas públicas, tanto quanto no treinamento e capacitação dos agentes de segurança pública. Precisamos agilizar o funcionamento integrado das polícias civil, militar, federal e guarda municipal. Em alguns estados brasileiros essa experiência vem dando certo, como em Minas Gerais.
Devemos aprofundar o trabalho desenvolvido pelos Conselhos Comunitários de Segurança. São nessas instâncias que a sociedade civil se envolve na solução do problema. Ficam aqui meus sinceros elogios ao prefeito Carlito Mers que já programou para a administração municipal a criação da Secretaria de Segurança Pública e Cidadania, o que me parece uma proposta muito positiva. Não que a secretaria vá resolver o problema, mas pelo menos o fato de existir mostra o reconhecimento do problema pela administração municipal.
Espero que não seja utilizado o velho discurso de que a responsabilidade da segurança pública é do governo do Estado, e enquanto isso quem acaba sendo a vítima é o munícipe. O debate não pode ser partidarizado. O tema segurança pública deve ser urgentemente colocado em discussão nos próximos meses, para que todos tenham um 2009 menos violento. Oxalá isso se concretize.

sábado, 27 de dezembro de 2008

Boas Vindas ao novo Secretário de Saúde de Joinville.


Prezado Secretário de Saúde....:

O Prefeito Carlito Mers sabia das dificuldades na escolha do seu secretário de saúde, pois nessa área existem inúmeros problemas a serem resolvidos, portanto deve ser administrado com competência e com a criatividade que o cargo exige. Conhecendo você como conheço, gostaria de inicialmente dá meus parabéns pela sua indicação para assumir tão importante e ao mesmo tempo delicada secretaria. Tenho certeza que seu nome está entre os melhores para gerir o sistema público de saúde em Joinville, pois já vivenciei no trabalho diário sua competência e sua responsabilidade no trato da “coisa pública”. Porém permita-me fazer alguns comentários.
Ao assumir o cargo de secretário de saúde de Joinville você certamente sabe da exata dimensão da responsabilidade que se coloca sobre seus ombros, além, é claro, de toda a expectativa da população nessa área. Sabemos que a política pública de saúde é hoje no nosso país, sem nenhuma dúvida, aquela onde já foi conseguido avançar, seja do ponto de vista de garantia do acesso à população, seja do ponto de vista da participação da população e do controle social. É também uma área onde independentemente das visões ideológicas e partidárias existe um grande consenso acumulado entre todos aqueles que lidam direta ou indiretamente com a prestação dos serviços e com a formulação das políticas.
A equipe técnica existente na Secretaria de Saúde é capaz de realizar um excelente trabalho com você no comando. Parte dela você já conhece por ser servidor de carreira.
Tenho certeza também que você vai fortalecer o Conselho Municipal de Saúde, pois já foi conselheiro e sabe dessa importância. Espero que você estabeleça com o conselho a possibilidade do mesmo, de forma autônoma, estabelecer as suas prioridades e ter no controle social o principal mecanismo de fiscalização das ações que serão desenvolvidas. Também gostaria do seu compromisso de que todas as definições que legalmente exigem a participação do conselho terão necessariamente essa participação e como secretário ser fiel cumpridor daquilo que cabe como deliberação do Conselho Municipal de Saúde.
Sabemos que a secretaria de saúde exige uma visão clara já que a saúde é algo que resulta de um conjunto de ações ( transporte, alimentação, lazer, emprego, todos preceitos constitucionais ). Deve-se ter uma visão de que os resultados e as conseqüências dos mesmos para a área da saúde dependem de uma ação integrada não concorrencial, não competitiva, mas harmônica entre as diversas secretarias e outros setores do próprio município. É por aí que se vai implementar totalmente o SUS.
Esse momento é de avançar e avançar é exatamente afirmar os princípios e as diretrizes do SUS, a universalidade, a garantia de acesso, ampliando esse acesso principalmente através do investimento na Atenção Básica. É bom lembrar do principio da equidade, principio esse de justiça de tratar os desiguais de forma desigual procurando olhar para os segmentos que mais necessitam e dar a eles um tratamento diferenciado.
Outra prioridade é relativa a melhoria da qualidade do atendimento; precisamos de um esforço que reúna os profissionais, as pessoas que participam da instâncias de controle social para que os usuários do Sistema Único de Saúde sejam efetivamente respeitados, acolhidos e vistos como pessoa, pois eles são os verdadeiros financiadores desse sistema e como tal precisam ser tratados de forma adequada. As mudanças que precisam ser feitas deverão ser feitas. Certamente não vão ser mudadas de uma só canetada, mas com uma ampla discussão, com amplo debate, mas isso certamente será feito porque o interesse maior é da população, e contamos com o sentimento de mudança que imperou nessa eleição municipal.
Portanto, a tarefa que lhe foi delegada pelo prefeito é uma tarefa hercúlea e por isso tem que ser olhada com toda a importância do mundo e sem ter medo dos enfrentamentos previstos, mas ao mesmo tempo tem que se ter a exata consciência do que ela representa. Por esse caminho não vão faltar parceiros de caminhada. Conte conosco e boa sorte Tarcísio!

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008



Na semana passada foram publicadas as novas regras para propaganda de medicamentos. Espero que essa nova legislação evite que a escolha de médicos e pacientes seja influenciada por informações inadequadas e incompletas. As estatísticas mostram que a cada 42 minutos há uma pessoa intoxicada pelo consumo de medicamento no Brasil. O estímulo ao consumo e a falta de informação adequada colocam em risco a saúde da população.
Toda a intoxicação pelo uso inadequado de qualquer medicamento deve ser combatida. Nenhum paciente no Brasil seja vítima do uso incorreto do medicamento por qualquer tipo de indução. Se tiver um caso já é grave.
Outra boa novidade é que as propagandas de medicamentos isentos de prescrição não poderão mais exibir a imagem ou voz de "celebridades" recomendando o medicamento ou sugerindo que fazem uso dele. Chega desses heróis influenciarem em assuntos que nada tem a ver com sua qualificação. Eles poderão aparecer em propagandas e publicidades, mas sem fazer esse tipo de orientação.
As propagandas e publicidades devem trazer os termos técnicos escritos de forma a facilitar a compreensão do público. A resolução também proíbe usar de forma indireta (não declaradamente publicitária) espaços em filmes, espetáculos teatrais e novelas e lançar mão de imperativos como "tome", "use", "experimente". Nas propagandas veiculadas pela televisão, o próprio ator que protagonizar o comercial terá que verbalizar estas advertências.
Para os eventos científicos e campanhas, a resolução reforça, expressamente, que o apoio ou patrocínio a profissionais de saúde não pode estar condicionado à prescrição ou dispensação de qualquer tipo de medicamento. Chamo essa prática de empurroterapia. Já no tocante à responsabilidade social das empresas, proíbe a publicidade e a menção a nomes de medicamentos durante as campanhas sociais e vice-versa.

Agora depende de cada um de nós acompanharmos se essas novas regras vão ser colocadas em práticas.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Gaza


José Saramago.
A sigla ONU, toda a gente o sabe, significa Organização das Nações Unidas, isto é, à luz da realidade, nada ou muito pouco. Que o digam os palestinos de Gaza a quem se lhes estão esgotando os alimentos, ou que se esgotaram já, porque assim o impôs o bloqueio israelita, decidido, pelos vistos, a condenar à fome as 750 mil pessoas ali registadas como refugiados. Nem pão têm já, a farinha acabou, e o azeite, as lentilhas e o açúcar vão pelo mesmo caminho. Desde o dia 9 de Dezembro os camiões da agência das Nações Unidas, carregados de alimentos, aguardam que o exército israelita lhes permita a entrada na faixa de Gaza, uma autorização uma vez mais negada ou que será retardada até ao último desespero e à última exasperação dos palestinos famintos. Nações Unidas? Unidas? Contando com a cumplicidade ou a cobardia internacional, Israel ri-se de recomendações, decisões e protestos, faz o que entende, quando o entende e como o entende. Vai ao ponto de impedir a entrada de livros e instrumentos musicais como se se tratasse de produtos que iriam pôr em risco a segurança de Israel. Se o ridículo matasse não restaria de pé um único político ou um único soldado israelita, esses especialistas em crueldade, esses doutorados em desprezo que olham o mundo do alto da insolência que é a base da sua educação. Compreendemos melhor o deus bíblico quando conhecemos os seus seguidores. Jeová, ou Javé, ou como se lhe chame, é um deus rancoroso e feroz que os israelitas mantêm permanentemente actualizado.
Publicado em
O Caderno de Saramago


No Discurso de Angostura, de 1819, Bolívar diz: "A continuação da autoridade num mesmo indivíduo freqüentemente tem sido o fim dos governos democráticos. As repetidas eleições são essenciais nos sistemas populares, porque nada é tão perigoso como deixar permanecer um mesmo cidadão por muito tempo no poder. O povo se acostuma a lhe obedecer, e ele se acostuma a mandar, de onde se origina a usurpação e a tirania."

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Agradecimentos - Palhaçoterapia.


Hoje, recebi um singelo presente com um carinhoso recado que dizia o seguinte:


"Olá Douglas....difícil te achar heim?

Gostaria de agradecer tudo o que fez pelo nosso projeto. Os corredores daquele hospital já não sáo os mesmos sem a tua presença".

Muito Obrigada.

Paula/Moanga


Gostaria de dizer que esse bilhete fez com que eu ganhasse o dia.....Isso vale mais do que muitos presentes juntos.

Obrigado a vocês membros do grupo da Palhaçoterapia que mostram diariariamente para os adultos como superar os momentos de dor numa criança.

Pensando alto....!!

Isso é pleonasmo !

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Ponto Facultativo.


Gostaria de parabenizar o Governador do Estado de Santa Catarina pela sua atitude coerente em cancelar os pontos facultativos de final de ano para todos os servidores públicos estaduais, tendo em vista a situação de calamidade pública que o Estado vem atravessando onde uma parte significativa da sua população convive com as incertezas do dia de amanhã em função das cheias que se abateram sobre muitos catarinenses e os riscos de todas as ordens inerentes a mesma.
Entendo que tal decisão deveria ser acompanhada pelos demais prefeitos municipais, em especial daqueles municípios que decretaram estado de calamidade pública nos últimos dias. Ficaria difícil explicar para a população brasileira que tanto vem contribuindo com doações vindas do Oiapoque ao Chuí esses pontos facultativos, que normalmente se transformam em folgas.

O uso da canaleta de ônbus pelos táxis.


O congestionamento viário é um fenômeno que vem a cada dia preocupando mais o cidadão joinvilense, isso não é privilégio só nosso, é claro. Além da dimensão pessoal (aborrecimentos), existe também e principalmente a ameaça a viabilidade econômica do nosso município. É claro que esse problema tem diversas facetas a serem atacadas, quais sejam: transporte público deficiente, impossibilidade do poder público em aumentar a capacidade viária em proporção equivalente ao crescimento e o uso da frota de automóveis particulares. Portanto a única forma efetiva de reduzir o congestionamento passa pela introdução de um sistema de transporte público de melhor qualidade que atraia os atuais usuários dos automóveis. Por isso precisamos melhorar os resultados da promoção da imagem do sistema de transporte coletivo, com qualidade, precisamos, por exemplo, instalar sistema de refrigeração de ar nos ônibus, pelo menos nas linhas mais movimentadas, aumentar o número de veículos disponíveis nos horários de pico, aumentar o número de ônibus articulados, reduzir o valor da passagem, disponibilizar de forma gratuita o acesso ao transporte coletivo nos domingos e feriados, entre outros mecanismos.
Nos últimos 20 anos, o aumento da frota de automóveis e a melhoria das redes rodoviárias transformou o estilo de vida dos brasileiros. Entretanto, o crescimento contínuo do uso do transporte privado apresenta uma ameaça na medida em que a poluição ambiental e o congestionamento desafiam a manutenção da prosperidade econômica e, por conseguinte, o próprio estilo de vida e as expectativas geradas pelo aumento da mobilidade. Como não existe a viabilidade indefinida de se desenvolver grandes programas de construção voltados para a expansão da rede viária para acomodar o crescimento do tráfego, a alternativa é gerar soluções para reduzir a demanda por viagens de automóvel e reforçar o uso do transporte coletivo.
Já as experiências práticas pelo mundo afora têm revelado que os usuários do automóvel se mostram avessos à transferência para o transporte coletivo quando medidas de restrição ao uso do automóvel não são acompanhadas pela oferta de um transporte coletivo de alta qualidade que contemple medidas de priorização na circulação viária.
Pessoalmente aprovei de imediato a criação das canaletas de ônibus em nossa cidade, pois sabia que essa é uma medida inteligente para melhorar a mobilidade na zona central de nossa cidade, agora a aprovação recente pelo Poder Executivo da liberação dessas canaletas para o uso de táxis, achei um contra-senso, pois a lógica da utilização da canaleta é coletiva e pública e não individual e privativa. Esclareço: quando liberamos a via exclusiva de ônibus para os táxis estamos sendo incoerentes, pois o serviço de táxi é de interesse particular, transporta normalmente uma ou no máximo duas pessoas em média por viagem. Que diferença então tem o táxi do carro particular? Nenhuma. Se a lógica é coletiva, e de interesse público, as canaletas deveriam ser utilizadas apenas pelos ônibus, polícia, bombeiros e SAMU, todos de interesse da coletividade como um todo. Se os táxis vão utilizar, como posso proibir então o uso pelas Vans que transportam em média 16 pessoas (estudantes na sua maioria)? Portanto: Estamos perdendo o foco da solução do problema e voltando novamente a priorizar o individual e esquecendo o interesse coletivo.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O SUS e seus problemas reais, como enfrentá-los?


Vivemos certamente um SUS multifacetado, com muitos êxitos e muitas contradições. Esse SUS que tanto é alvo de críticas é fruto de um movimento radical pela democratização de nosso país que iniciou na década de 70, mas até hoje não “ganhou” a população de uma forma geral. O SUS melhorou muito o acesso da população à saúde, pois antes de 5 de outubro de 1988 só quem tinha acesso aos serviços públicos de saúde eram os trabalhadores formais de nossa economia ( aqueles que possuíam “carteira de trabalho assinada” ). Houve, além disso, uma ampliação do acesso a outros serviços, antes inimagináveis, como: vacina, tratamento de câncer, saúde da família, etc.
Mas não podemos negar que o SUS ainda encontra-se incompleto. Espero que com a nova administração municipal os futuros gestores enfrentem de peito aberto a criação de um novo modelo de gestão que venha a garantir o funcionamento desburocratizado, humanizado e com resultados palpáveis, trabalho este que vem sendo gestado pela atual equipe técnica da Secretaria Municipal de Saúde. Através da literatura sabemos que países como Portugal, França e mesmo a Inglaterra conseguiram inventar formas que alcançaram eficácia, humanização, eficiência e além de tudo, baixar os enormes custos...Um sonho com certeza possível!
Apesar disso no Brasil, aceitamos o discurso da privatização como a panacéia dos problemas da saúde de nossa gente, como se fosse possível organizar a vida em sociedade sem serviços estatais, sem políticas públicas de segurança, saúde, educação e ecologia. Se o Estado não fizer isso, não sei quem vai fazer. E, para isso, precisamos ter funcionário público, avaliação de desempenho, controle social e muitas outras coisas.
Outro ponto de estrangulamento advém de que as pessoas procuram os convênios privados de saúde que oferecem uma cobertura baixa e acabam fazendo o uso misto: consulta no convênio e pega a insulina no SUS. E é esse SUS que tanto recebe críticas. Pergunto: a existência do serviço suplementar de saúde veio a prejudicar o fortalecimento do SUS? Sabemos que em 2007, o financiamento da saúde suplementar passou a ser maior do que o do público. Isso já demonstra a inversão de valores que vem se criando com nosso governo. Inverteu-se a lógica que historicamente vinha sendo construída. Então é um empecilho real. E é um empecilho de desejo, de luta, de mobilização: as pessoas passaram a aspirar, na sua cesta básica de vida, a uma caminhonete e a um plano de saúde. Isso é incrível porque acontece no momento em que os Estados Unidos, que é o país que tem a maior saúde suplementar do mundo, está revendo esse modelo, está literalmente em crise. Até o novo presidente daquele país já manifestou o desejo de criar um serviço público de saúde. Porque, por mais dinheiro que você tenha o seu plano privado não vai garantir a atenção integral. Há um reconhecimento de toda a Europa da necessidade de ter um setor público socializado de atenção à saúde. Então, para que SUS para todos? Dizem de forma pejorativa que o SUS tem que ser para os pobres. Um absurdo!
Outro gargalo que vivemos é que o SUS não tem uma política de pessoal razoável, nem de formação, nem de seleção, recrutamento, carreira e nem de salários. Formamos muitas vezes profissionais de saúde sem o compromisso devido com o sistema público e muito menos com a população que é atendida.

Outro aspecto que chama a nossa atenção é que precisamos considerar além da dimensão social e econômica da saúde, a dimensão do risco: alguém que tem Aids precisa ter mais assistência do sistema público do que quem não tem, seja da classe A, B ou C. Se for da classe E, vai precisar ter muito mais, porque a terapia vai ser mais ampla, tem que ter bolsa-família, bolsa-alimentação. País desigual é isto! Esses são alguns dos enfrentamentos e caminhos a serem construídos coletivamente entre, gestores públicos, profissionais de saúde e população.

Violentada e respeitada


Escrito por Frei Betto
15-Dez-2008

Completei 60 anos a 10 de dezembro. Sou um dos mais destacados consensos entre os associados à ONU. Fui aprovada por 192 países. No entanto, raros os que me respeitam.

Infelizmente não recebi, até hoje, aprovação do Estado do Vaticano. Logo ele, que se propõe a defender os valores encarnados por Jesus, que coincidem com os meus.

Nasci no pós-guerra. O mundo ansiava por justiça e paz. Ao longo desses 60 anos, sofri todo tipo de violações: a Coréia dividiu-se em duas; o Vietnã teve sua população civil bombardeada pela França e pelos EUA; empresas usamericanas de produtos químicos – as mesmas que monopolizam as sementes transgênicas – chegaram ao perverso requinte de criar o agente laranja e o napalm, destinados a intoxicar letalmente seres vivos.

Fui violentada na África do Sul, vítima do apartheid, e no Oriente Médio, onde ainda sofro em decorrência de preconceitos étnicos e religiosos. Na continente africano, todos os meus preceitos são ignorados, por culpa do neocolonialismo e da indiferença das nações ricas. Estas só se lembram das africanas quando se trata de vender suas armas.

Em Guantánamo, o governo dos EUA promove descarado acinte contra todos os meus princípios. No Iraque e no Afeganistão, os excessos praticados são ainda mais graves.

Padeci também na União Soviética e na China. Sob a bandeira da nova sociedade, reprimiram manifestações de pensamento e religião; decretaram a censura; perseguiram opositores políticos; implantaram, em nome do socialismo, um capitalismo de Estado.

Na América Latina tenho uma trágica trajetória. Ditaduras militares seviciaram-me de todas as maneiras: prisões arbitrárias, torturas, desaparecimentos, banimentos, assassinatos, seqüestros de crianças...

Sofri massacres em El Salvador, Guatemala, Colômbia e Peru. Grupos paramilitares se vangloriam de violar-me. E em alguns países, como é o caso do Brasil, meus transgressores continuam impunes. Felizmente a OEA me leva a sério e trata de apurar denúncias que recebe.

Hoje, sou duramente vilipendiada pelo narcotráfico e o terrorismo. As drogas corroem profundamente a dignidade humana; o terrorismo, tanto de Estado quanto de grupos fundamentalistas, inocula no ser humano o medo e a ira como condição existencial.

No Brasil, estou longe de merecer o devido respeito. Muitos nem querem ouvir falar de mim. Julgam que sou mulher de bandido. Sou ignorada pelos policiais que torturam e também pelos que praticam exploração sexual de crianças, discriminação de negros e indígenas, preconceito à homossexualidade e agressão às mulheres.

Sofro, de modo especial, em decorrência da estrutura injusta que perdura no país, sobretudo a desigualdade social acentuada pela falta de reforma agrária. O latifúndio figura entre os meus principais inimigos, ao lado da devastação ambiental.

Contudo, há avanços. Comissões de Justiça e Paz se multiplicam pelo país. Inúmeras ONGs se dedicam à minha causa. O governo Lula deu status de ministério à Secretaria Especial dos Direitos Humanos, à frente da qual se encontra um homem íntegro e corajoso: Paulo de Tarso Vannuchi.

Nas escolas, sou cada vez mais estudada. Há um setor da Justiça atento às ameaças e violações que sofro. As leis Afonso Arinos e Maria da Penha inibem e/ou punem uma parcela de meus agressores. A aprovação dos estatutos da Criança e do Adolescente e também do Idoso são avanços que me favorecem.

Se muitos ainda não me respeitam mundo afora, ao menos já não ousam falar mal de mim abertamente. Empresas e governos se sentem obrigados a levar em conta também meus direitos ecológicos, sociais e raciais.

Sou um projeto de futuro. Só na medida em que eu for assumida e respeitada, a humanidade haverá de desfrutar a felicidade como experiência pessoal e fenômeno coletivo.

Meu nome é Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Moacyr Scliar e Veríssimo, entre outros, de "O desafio ético" (Garamond), entre outros livros.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O generalista no SUS


GUSTAVO GUSSO e ZELIETE ZAMBON*


O artigo do dr. Pinotti publicado nesta Folha no último dia 30 de novembro de 2008 traz dados errados e equívocos conceituais graves. O Programa Saúde da Família (PSF) mantém essa marca que está consagrada, mas desde 1998 se tornou uma estratégia de Estado e se consolidou como modelo para reorientação da atenção primária (ou atenção básica) brasileira. No relatório de 2008 da Organização Mundial da Saúde, o Brasil é citado 18 vezes, sendo o grande destaque justamente o PSF, que é visto como exemplo para outros países. Diversos estudos publicados em revistas científicas reconhecidas internacionalmente comprovam a eficácia da estratégia. James Macinko e colaboradores publicaram um estudo em 2006 demonstrando que o incremento de 10% das equipes do PSF leva a uma queda na mortalidade infantil de 4,6%, só perdendo para alfabetização materna. O Brasil já diminuiu a mortalidade infantil para 20,34/1.000 e, se continuar nesse ritmo, atingirá a meta do milênio já em 2011, com quatro anos de antecedência.
Outros dados são igualmente errados. Por exemplo, o dr. Pinotti diz que o PSF atingiu 43.024 equipes, mas são, na verdade, 29.239, cobrindo 49,44% da população brasileira (dados de outubro de 2008, disponíveis em
http://dtr2004.saude.gov.br/dab/localiza-cadastro.php). Talvez o equívoco mais grave cometido pelo deputado seja o desprezo pela prática do médico de família e comunidade.
A medicina de família e comunidade é uma especialidade reconhecida no Brasil desde 1981 e é a especialidade que o médico da equipe básica do Programa Saúde da Família deveria ter. Diferentemente do clínico geral, o médico de família e comunidade se prepara por meio de residência médica ou título de especialista reconhecido pela Associação Médica Brasileira para atender problemas freqüentes da população sem distinção de gênero, faixa etária ou órgão afetado. Não é, definitivamente, um amálgama de clínica médica, pediatria e ginecologia. O foco é a pessoa dentro do contexto familiar e comunitário. No dia 5 de dezembro de cada ano, comemora-se o dia do médico de família e comunidade.
O número de programas de residência médica em medicina de família e comunidade tem crescido exponencialmente. De cinco programas em 1998, passou a 78 em 2008, mas o número ainda é insuficiente. O PSF não é inspirado apenas em Cuba, como sugere o artigo do dr. Pinotti. Cuba seguia o modelo de policlínica com internista, ginecologista e pediatra desenvolvido pelos bolcheviques na antiga União Soviética e defendido pelo dr. Pinotti até 1985. Só então passou a contar com o médico de família com formação adequada como primeiro contato do paciente com o sistema de saúde.
A Europa ocidental, e especialmente a Inglaterra, é precursora desse modelo, que tem como objetivo não apenas otimizar custos mas, principalmente, aprimorar o acesso do paciente de forma longitudinal (ao longo da vida), coordenada e integral.
Para isso, é necessária muita tecnologia, não aquela dos tomógrafos e exames laboratoriais, que também são fundamentais quando bem usados, mas conhecimento científico apropriado à atenção primária, relação médico paciente e trabalho em equipe. Inglaterra, Portugal, Espanha, Noruega, Suécia, Holanda, Canadá, Dinamarca e Austrália são alguns dos países com sistema de saúde público forte que adotam o modelo há alguns anos. A pesquisadora Barbara Starfield, professora Emérita da John Hopkins University, tem demonstrado que países com maior proporção de médicos de família e comunidade em relação ao total de médicos têm melhores resultados. Uma das maiores falácias em saúde a que o artigo do deputado dr. Pinotti recorre é "a pessoa pode eliminar a incerteza especializando-se". Abordar problemas que não são específicos de maneira focal pode significar o início de uma cadeia de erros que não raro traz conseqüências graves.
O Brasil é um pais continental e o primeiro com mais de 100 milhões de habitantes que tenta organizar um sistema de saúde público universal. Os desafios são enormes. Talvez o maior seja a formação adequada de um grande contingente de pessoas para trabalhar em uma área de fundamental importância para o sucesso de qualquer sistema de saúde. Não temos tempo nem podemos nos dar ao luxo de perder o eixo. Todos - médicos, políticos, professores e população em geral- temos que estar unidos em prol desse objetivo comum, deixando de lado vieses corporativistas e pessoais.


*GUSTAVO GUSSO , 34, médico de família e comunidade, PSF/Prefeitura de Florianópolis (SC), é presidente da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade.
ZELIETE ZAMBON , 35, médica de família e comunidade, Prefeitura de Campinas (SP), é presidente da Associação Paulista de Medicina de Família e Comunidade.
Fonte: Folha de s. Paulo, 10/12

domingo, 14 de dezembro de 2008

E agora, Carlito !


Ontem fui assistir a diplomação do nosso futuro prefeito Carlito Mers. Foi muito emocionante sentir o clima de esperança que pairava sobre todos. Parabéns Carlito, você tem uma responsabilidade sem igual daqui para frente. Faltam poucos dias para iniciar efetivamente sua gestão a frente de Joinville. Estamos ansiosos para saber de concreto o que você está pensando e o que vai fazer. Isso começa sem dúvida pela formação da sua equipe de trabalho. Os nomes escolhidos demonstrará o perfil da nova administração.
Como falei numa de minhas cartas a este jornal, não esqueça do transporte coletivo de nossa cidade, lembre-se que o transporte público exerce vários papéis a mais do que só transportar pessoas. Ele também é indutor do crescimento da cidade e ao mesmo tempo é fundamental para estabelecer uma relação entre o passageiro e o seu itinerário. Mas, também cada passageiro dentro do ônibus é o retrato da identidade da gente da cidade.
Não posso pedir para você esquecer o automóvel, mas quero dizer que o problema do estacionamento no centro de nossa cidade, pode ser resolvido com um eficiente transporte coletivo. Porém enquanto isso, vá pensando como revitalizar o centro, e outros setores que estão decadentes e degradados nos últimos 12 meses. Infelizmente!
Pense também principalmente nos bairros, numa nova periferia, repensá-la como parte viva de nossa cidade, e não como área marginalizada que recebe doses homeopáticas de infra-estrutura e equipamentos sociais apenas quando estamos próximos dos períodos eleitorais. Lembre-se que uma cidade, onde o jovem e a criança não têm espaço para a criatividade, perde muito, e a marginalização corre solta trazendo muitas vítimas. E a criança não existe, somente a partir da escola, mas, a partir do momento em que nasce.
Porém cuidado com os espertos em administração pública, nossa Joinville não é tão complexa quanto os vendedores de complexidades querem nos fazer acreditar. É comum no Brasil enquanto país subdesenvolvido comprarmos como última novidade o obsoleto dos outros países. Gostaria de ver inovação, e inovar é começar, e o momento é propício. Boa sorte na sua gestão, e conte conosco!

A crise da saúde e as respostas necessárias.



CONSTRUIR PRONTO ATENDIMENTO NÃO RESOLVE OS PRINCIPAIS PROBLEMAS DE SAÚDE DA POPULAÇÃO DE JOINVILLE.
O serviço público de saúde de Joinville vem sofrendo constantes críticas e manifestações de descontentamento da maioria dos seus usuários. Sabemos que essas críticas aumentaram nos últimos 2 anos. Diante delas as medidas anunciadas e já executas até o presente momento pela administração municipal colocam ênfase na criação de Pronto Atendimentos Ambulatoriais de Saúde (PAAS) e os Pronto Atendimentos Médicos (PAs 24 horas), o último inclusive ainda a ser inaugurado nos próximos meses (PA 24 horas do Aventureiro).
Nós, enquanto profissionais de saúde, e os gestores públicos, deveríamos saber, mais do que ninguém, o quanto é importante um diagnóstico correto para que se tomem medidas eficazes. Algumas respostas imediatistas diante das críticas podem levar a medidas inócuas e até prejudiciais, além do que dispendiosas para os cofres públicos municipais. Medidas muitas vezes apenas cosméticas ou puramente eleitoreiras. É preciso um olhar mais aprofundado para as necessidades de saúde da população e com os serviços públicos para a formulação de propostas mais efetivas.
Sabemos o tamanho da rede assistencial de saúde que Joinville possui, teoricamente com uma capacidade significativa de resolver muitos problemas. Nossa rede municipal causa inveja a muitos municípios pela sua estrutura e pela qualidade de seu quadro de técnicos.
Apesar disso estamos em crise e os usuários sofrendo com a dificuldade, em especial a de acesso. Porque então o povo está sem acesso? Quais são os problemas que não estão sendo resolvidos?
A partir de discussões que vem sendo travadas nos últimos meses no meio técnico da Secretaria de Saúde de Joinville, ouso dizer que não é de mais prontos-socorros ou pronto atendimentos que precisamos. Embora compreenda perfeitamente que essa parece ser a solução mais fácil e atraente, tanto para os usuários, como para os governantes, inclusive essa proposta foi incluída no plano de governo do futuro prefeito de Joinville. Temo que isso se deve apenas a pressa em anunciar medidas que serão adotadas.
O quadro de saúde do nosso município é complexo. Nossa população vive mais, felizmente, e o número de idosos vem aumentando muito. As doenças crônico-degenerativas, do sistema cardiovascular, do aparelho locomotor, a obesidade e o diabetes, a hipertensão arterial, o câncer, a violência, constituem-se nas principais causas de morte e de adoecimento. Ao lado disso na periferia da cidade ainda tem características típicas de áreas pouco desenvolvidas: população jovem, doenças infecciosas, grande número de problemas decorrentes da pobreza e das precárias condições de vida. Lembro também que a violência urbana vem trazendo variadas e numerosas necessidades, inclusive no campo da saúde mental. A dependência de drogas constitui um problema extenso e desafiador para o sistema de saúde.
Outro fator definidor do quadro é a crescente dependência da população dos serviços de saúde e em especial do profissional médico. Tudo parece que tem que ser resolvido através de uma consulta médica, e de preferência com uma receita recheada de medicamentos. Nunca é demais dizer que a indústria de medicamentos contribui para a criação de novas "necessidades" e introduz o consumismo desenfreado, enredando profissionais e usuários na confusão do consumismo, sem muita consciência de quando é o sujeito que escolhe ou é o Programa do Fantástico que induziu aquele produto através da propaganda massiva do domingo a noite. Temos um número exorbitante de estabelecimentos farmacêuticos, um em cada esquina.
Como é que os gestores de saúde vem tratando disso tudo? É possível dizer que muitas e muitas vezes sem muita qualidade e resolutividade. Hoje vemos que as respostas acabam sendo centradas em terapias puramente medicamentosas, em consultas médicas apressadas, solicitação de exames e mais exames, muitos desses desnecessários, inclusive de alto custo. Enfim, o usuário não sente que seu problema foi resolvido e nem sequer foi compreendido pelo médico.
Sendo assim pergunto: que papel pode a construção de mais pronto atendimentos exercer nesse contexto? Tenho a absoluta certeza que é a de piorar a situação! Logicamente sei que o pronto-socorro ou pronto atendimento é um serviço imprescindível no sistema de saúde de qualquer lugar do mundo. É o local onde salvamos vidas e onde podemos ter as intervenções que afastam o risco de morrer ou de agravar as doenças. É para isso que, fundamentalmente ele deve existir. Seu papel é claramente indispensável. Impossível questionar esse fato. Mas ele não pode ser o meio de se conseguir acesso para a grande maioria das necessidades de saúde. A tecnologia ali empregada, a organização do processo de trabalho é inadequada para a abordagem dessa maioria de problemas, além de muito cara. Precisamos observar com discernimento a sua natureza e finalidade.
Pelo quadro de saúde que vimos anteriormente, vê-se que as ações de saúde tem que ser exercidas pelo serviço que está no território onde as necessidades das pessoas são geradas. No bairro, na residência, na escola, no meio das famílias. Esse papel só pode ser efetivo se for exercido por equipes multiprofissionais, vinculadas à população, abolindo o isolamento do médico dentro do seu consultório e a oferta exclusiva da consulta médica como ação de saúde. E para isso a Estratégia da Saúde da Família é ideal.
Sabemos que uma unidade básica de saúde (posto de saúde) deve ser estruturada com recursos compatíveis com a população a ser atendida e assim resolver mais de 80% dos problemas de saúde no seu território. Há inúmeras provas disso ocorrendo em muitos outros municípios pelo país afora.
Porque o povo reclama então? Porque a rede básica não está cumprindo seu papel adequadamente. A população não chega a criar vínculo com os serviços e assim continua procurando prontos-socorros ou os PAS 24 horas.
Outro grande problema é o acesso aos médicos especialistas, esse é um motivo de estresse constante dos profissionais das unidades básicas. Portanto devemos pensar em racionalizar recursos qualificando os encaminhamentos para as especialidades. São muitas as questões fundamentais para a qualificação da rede básica. Várias pesquisas e levantamentos dos serviços tem nos mostrado que mais de 60% dos atendimentos dos prontos-socorros não deviam ser feitos ali. Os pacientes seriam melhor atendidos na unidade básica com mais eficácia e qualidade. Sabemos também, pelas prestações de contas da própria secretaria de saúde, que os custos da manutenção de um pronto-socorro é igual ao de muitas unidades básicas somadas.
Se insistirmos em construir mais pronto atendimentos vamos certamente perpetuar essa distorção. Reproduzimos de maneira infindável consultas, exames, administração inadequada de medicações, e o pior, após isso tudo ainda ficamos com a sensação de estar enxugando gelo ou apagando pequenos incêndios diariamente.
Precisamos potencializar a ação do atuais prontos-socorros e pronto atendimentos, com maior investimento na rede básica, porém cumprindo o seu papel que é fundamental nesse quadro anteriormente esboçado. Priorizar é preciso! A tentação de inaugurar pronto atendimento pode ser grande para os gestores e para os usuários do sistema que penam nas eternas filas também. Mas criar prontos atendimentos sem investir na rede básica, não resolverá os problemas de saúde. Apenas perpetuará distorções e implicará em emprego de recursos preciosos em ações pouco eficazes. Temos inclusive que ampliar o horário de funcionamento de algumas unidades para o período noturno até às 22 horas. Além disso, temos que qualificar a gestão dos nossos serviços, dando-lhes estrutura compatível com a sua complexidade, corrigindo algumas distorções inclusive a de descompromisso com o seu público. Temos que radicalizar nas propostas de humanização. Esse é o caminho possível no meu entendimento.

sábado, 13 de dezembro de 2008

Ensinamento sobre a humildade e a arte de ler.


Hugo de São Vítor, um mestre do século XII, época em que surgiram as primeiras escolas ancestrais das universidades modernas, ensina: “O começo da disciplina moral é a humildade, da qual existem muitos ensinamentos, três dos quais interessam mais ao estudante: 1) primeiro, não reputar de pouco valor nenhuma ciência e nenhum escrito; 2) segundo, não ter vergonha de aprender de qualquer um, 3) terceiro, não desprezar os outros depois de ter alcançado o saber. Muitos ficam decepcionados porque querem aparecer sábios antes do tempo. Por esta razão, explodem numa intumescência de arrogância, começam a fingir aquilo que não são e a envergonhar-se daquilo que são, e tanto mais se afastam da Sabedoria quanto mais se preocupam não em serem sábios, mas em serem considerados tais. Conheci pessoas assim, as quais, mesmo necessitando ainda dos conhecimentos básicos, se dignam interessar-se somente das coisas sublimes, e acham que se tornaram grande sábios por ter lido os escritos ou ouvido as palavras dos grandes e dos sábios. (...) O estudante prudente, portanto, ouve todos com prazer, lê tudo, não despreza escrito algum, pessoa alguma, doutrina alguma. Pede indiferentemente de todos aquilo que vê estar-lhe faltando, nem leva em conta quanto sabe, mas quanto ignora.(...)Por que você aspira a coisas altíssimas, quando ainda jaz no lugar mais baixo? Avalie, antes, aquilo que as tuas forças podem sustentar. Avança bem, mas avança ordenadamente. Alguns, querendo dar um grande salto, caem no precipício. (...) Aprenda de todos com prazer aquilo que você não conhece, porque a humildade pode tornar comum para você aquilo que a natureza fez próprio para cada um. Será mais sábio de todos, se irá querer aprender de todos. Aqueles que recebem de todos, são mais ricos de todos.Não considere vil conhecimento algum, portanto, porque todo conhecimento é bom. Se tiver tempo livre, não recuse de ao menos ler algum escrito. Se você não lucra, também não perde nada, sobretudo porque não há nenhum escrito, creio eu, que não proponha algo desejável, se é tratado no lugar e no modo devido, e não há nenhum escrito que não contenha algo especial não encontrado alhures, algo que o diligente escrutador da palavra não possa agarrar com tanta maior graça quanto mais é raro.(...)Igualmente, lhe convém que, quando começar a conhecer alguma coisa, não despreze os outros. Este vício da vaidade ocorre a alguns, porque olham com demasiada diligência o seu próprio conhecimento e, parecendo-lhes de ter-se tornado alguma coisa, pensam que os outros não são como eles nem poderia nunca sê-lo, sem conhecê-los.” *É incrível como as palavras de Hugo de São Vítor, escritas há mais de oito séculos, mais precisamente em 1127, permanecem atuais. Parece até que ele escreveu hoje, basta olhar à nossa volta. Ao que parece, o ser humano não mudou muito. O bom estudioso mantém a atitude de humildade diante do saber. A empáfia não faz bem à busca do conhecimento. O presunçoso é irritante, risível e, quando se aventura a escrever, tende à linguagem pomposa, a qual revela falsa erudição. Como nota Wright Mills: “O desejo do prestígio é uma das razões pelas quais os acadêmicos escorregam com tanta facilidade para o ininteligível.” ** É desaconselhável ser leitor de um livro só. Os que se fecham para outras leituras agem à maneira religiosa dos que abraçam verdades inquestionáveis. Memorizam slogans e citações, como argumento de autoridade, mas correm o risco de se tornarem meros repetidores do que imaginam saber plenamente. A necessária humildade requer a dúvida permanente. Aprender é muito mais do que acreditar!

* In: Hugo de São Vítor. Didascálicon, da arte de ler. Petrópolis/RJ: Vozes, 2001, p. 155-159** MILLS, C. Wright. A imaginação sociológica. RJ: Zahar, 1982, p. 235.
Postado por Antonio Ozaí da Silva

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Partidarização foi a maior decepção.

Jacob Kligerman, oncologista, 44 anos de profissão, faz um balanço dos três anos à frente da Secretaria Municipal de Saúde do Rio: “Tem que ousar, tem que avançar. A visão dominante ainda é arcaica”, diz o ex-diretor-geral do Instituto Nacional do Câncer (Inca), um médico renomado. Num discurso em que usa palavras freqüentemente empregadas no setor privado, como benchmarking (bom desempenho), Kligerman, que retornará em janeiro ao Inca, do qual é funcionário de carreira, afirma que será difícil voltar ao Executivo e se diz frustrado com a partidarização do setor público.
'Partidarização foi a maior decepção'Para secretário de Saúde, misturar política com setor público é demonizá-lo
ENTREVISTA Jacob Kligerman
Maiá Menezes O GLOBO: O que compromete a eficiência do setor público? JACOB KLIGERMAN: No caso da Saúde, o SUS tem que ser reformulado.E adaptado às características regionais. No Rio, são três gestores, que nem sempre falam a mesma linguagem.
l Isso trava o sistema? KLIGERMAN: Trava muito.Nesse modelo, é muito difícil.E o Rio ainda tem uma peculiaridade: nas verbas que recebe, contam as que vão para os hospitais federais. Então a gente tem que dividir. É muito difícil. Mas não impossível.
l Qual foi sua maior decepção? KLIGERMAN: Foi a demonização de duas áreas mais importantes da administração pública, que são Educação e Saúde, por partidarização. Foi a maior decepção que eu tive, porque não sou ligado a partidos, sou eminentemente técnico. Para mim, é uma tragédia do setor público. Resolvi aceitar o cargo, que caiu no meu colo, por pedido do então ministro (José) Serra, porque vi ali a oportunidade de fazer gestão pública e, ao mesmo tempo, continuar com minha atividade cirúrgica. Continuei na secretaria pela qualidade dos quadros técnicos.
Em algum momento, o senhor se arrependeu da escolha? KLIGERMAN: Em momento algum. Adquiri uma experiência municipal que não tinha. Eu conhecia o SUS por uma área normativa, que era o Inca. Hoje posso avaliar o processo todo, até o atendimento de emergência. Quando entrei, era um momento muito difícil de desabastecimento e de obras não terminadas. E o mais fácil é construir hospital: o problemático é ter o dinheiro para custeio. Consegui não ter desabastecimento. É importante entender que 90% da fonte Tesouro vão para pessoal. Outra coisa que me marcou muito foi a ameaça de prisão por não abrir os postos de saúde 24 horas. Um absurdo. Eu não tinha contingente de pessoal nem de segurança. O grande pedido que recebo dos postos de saúde é para dobrar a espessura das paredes, porque os tiros ultrapassam.
O senhor voltaria ao Executivo? KLIGERMAN: (Silêncio) É difícil, né? Isso vai depender do momento. Às vezes você sabe que é convocado e não pode recusar.
Em que o setor privado o inspirou? KLIGERMAN: Eu descentralizei as 27 unidades. Que os diretores se preocupem com os custos, com desperdício. Eu não demonizo o lucro. Se o município faz uma parceria e o parceiro quer ter lucro, e se ele cumprir a pactuação que fez com qualidade, pelo amor de Deus, o importante é a população ter acesso. Para administrar o Hospital de Acari, ganhou uma empresa privada. Lá eles ganham por produtividade. E não existe absenteísmo. É um benchmarking (bom desempenho). Não conseguimos implementar as organizações sociais, que foi uma experiência vitoriosa dos grandes hospitais vazios de São Paulo.
Por que não conseguiu? KLIGERMAN: Porque o prefeito Cesar Maia, quando assumi o cargo, disse que o projeto teria que passar pela Câmara Municipal. Quem manda realmente é a Câmara. O gestor fica muito restrito. O projeto de lei para a mudança de salário (dos médicos), a gente não conseguia enviar à Câmara porque não havia condição política. O prefeito só mandou agora, para dar oportunidade ao futuro prefeito.
A lógica política na administração o chocou? KLIGERMAN: É chocante. Mas, no Inca, tive uma vivência positiva. Ressalto que nunca fui instado pelo prefeito a fazer aqui qualquer nomeação aqui. Tive independência absoluta. Quando falo da partidarização, falo da intervenção arbitrária, por motivos absolutamente políticos. Foi uma mágoa muito grande que ficou, vendo a falácia político-partidária.
Houve margem para investimentos? KLIGERMAN: A questão orçamentária foi difícil de gerenciar. Fizemos um investimento mínimo. Esse valor (R$ 8 milhões), o estado gastou agora na compra de tomógrafos. Foi tudo o que consegui investir em 2006. Por conta das limitações, dos gastos com pessoal, fica-se com muito pouco dinheiro para investimento.
Como driblar essas limitações?
KLIGERMAN: Com parcerias, você pode melhorar resultados e trazer eqüidade, que é um dos pressupostos do SUS. Tem que ousar, tem que avançar. A visão dominante ainda é arcaica.
Fonte: O Globo, 7/12

sábado, 6 de dezembro de 2008

Os efeitos do trânsito na saúde dos ossos.


Justificar
Rubens Rodrigues - médico-ortopedista
Publicado em: 2/12/2008
Todas às vezes que estou no carro, parado em um congestionamento, sinto uma inveja danada de quem está em pé no ônibus ao lado. A afirmação parece exagerada, mas, como médico-ortopedista, conheço os prejuízos que o trânsito pode causar para a saúde dos ossos quando estamos sentados, além do estresse e de outros problemas, apesar do conforto aparente. Quando sentamos por muito tempo ao volante (em média duas horas diárias), sofremos conseqüências semelhantes às de longas viagens de avião, como fadiga muscular e desgaste nas articulações. A permanência no carro, por mais de 50 ou 60 minutos, sobrecarrega a musculatura e a estrutura óssea da região lombar das costas, o que provoca as famosas lombalgias, cada vez mais freqüentes, de acordo com o que verificamos em consultórios e hospitais. Os movimentos repetitivos para mudar as marchas podem causar tendinite nos punhos ou bursite (inflamação) na região dos ombros. Nos membros inferiores, os atos de frear, acelerar e pressionar a embreagem diversas vezes podem desgastar as articulações dos tornozelos ou ocasionar dores nas pernas. As dicas são: se possível, faça uma pausa de alguns minutos, saia do carro e estique as pernas; durante o trajeto, faça movimentos lentos e graduais com o pescoço, para a esquerda e para a direita, que colaboram para uma lubrificação da articulação na região cervical; tente adaptar o modo de sentar e evite movimentos bruscos com as pernas; e principalmente, procure um médico-ortopedista para uma avaliação adequada. Alguns pacientes, quando são estimulados a ficar três ou quatro minutos em pé, após permanecerem sentados por muito tempo no carro, apresentam melhoras significativas dos sintomas dos problemas ortopédicos. O mesmo ocorreu com aqueles que substituíram o carro pela bicicleta ou por caminhadas. A mudança de hábito durante as férias ou a prática de atividades físicas regularmente também ajudam a amenizar os danos do trânsito à saúde. O nosso dia-a-dia é como participar da Corrida São Silvestre: assim como temos de nos preparar fisicamente para a prova, devemos nos preparar para enfrentar as atividades diárias, principalmente o desafio do trânsito.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

MEC pune quatro cursos de medicina por mau desempenho.

O MEC (Ministério da Educação) anunciou nesta quinta-feira a suspensão do vestibular ou redução de vagas do curso de medicina de três universidades: a UNIG (Universidade Iguaçu) --nos campi em Nova Iguaçu (RJ) e em Itaperuna (RJ)--, a Ulbra (Universidade Luterana do Brasil) e a Unimar (Universidade de Marília).
Dos 17 cursos avaliados pela comissão de supervisão dos cursos de medicina, quatro irão sofrer represálias do MEC.
Outras quatro universidades terão que cumprir determinações de medidas cautelares impostas pelo MEC e sete receberão notificações com as observações da comissão para que possam apresentar planos de saneamento.
Duas instituições não serão mais supervisionadas: a Ufal (Universidade Federal de Alagoas) e o Centro Universitário Serra dos Órgãos, já que apresentaram melhora nos cursos.
Foi apresentado um relatório parcial que apresenta a avaliação de 13 dos 17 cursos com conceitos 1 e 2 no Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes) e no IDD (Indicador de Diferença entre os Desempenhos Observado e Esperado).
Suspensão vestibular
O campus de Itaperuna, da Unig, e a Unimar terão o processo seletivo suspenso. Em Itaperuna, o MEC determinou que a universidade deve melhorar a qualidade do ensino. A Unimar precisa redirecionar os leitos de seu hospital à prática dos estudantes, em até três meses, para ter direito a realizar o processo seletivo.
Diminuição de vagas
O campus de Nova Iguaçu, da Unig, e a Ulbra deverão reduzir o número total de vagas oferecidas semestralmente. Na Unig, tem hoje 200 vagas anuais e deve diminuir para 150. Na Ulbra, que conta com 140 vagas reduzirá para 130.

Menos dinheiro para o SUS!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Governo não atende reivindicações da saúde
Governo não atende reivindicações da saúdeDe pouco adiantaram as audiências públicas na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara e as inúmeras reuniões com ministros e com o vice-presidente da República, José Alencar, em favor do setor de saúde. A Junta Orçamentária do Governo, formada pelos ministros do Planejamento, Fazenda e Casa Civil, não se sensibilizou com o tamanho da crise e decidiu que só vai liberar uma parte da reivindicação da Frente Parlamentar da Saúde e das entidades nacionais do setor. O Ministério da Saúde terá, portanto, apenas R$ 1,4 bilhão para fechar suas contas de 2008.
O setor de saúde exige R$ 2,674 bilhões, sendo R$ 1,850 bilhão só para ações de média e alta complexidade ambulatorial e hospitalar, R$ 342 milhões para medicamentos excepcionais e R$ 482 milhões para dar continuidade aos novos programas do Governo, como o Saúde do Homem, Saúde na Escola, Farmácia Popular e Serviço de Atendimento Médico de Urgência – SAMU, por exemplo.
O Governo também não atendeu aos apelos do setor e vai repetir a mesma estratégia adotada no final do ano passado, quando liberou R$ 1,5 bilhão em recursos extraordinários para a saúde, mas alegou que eram originários do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza. A conseqüência dessa estratégia é que os recursos não foram incluídos no piso constitucional para a definição do orçamento da saúde para 2008. O deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), um dos coordenadores da Frente Parlamentar da Saúde, lamentou que essa "artimanha contábil" esteja sendo repetida. "O Governo está empurrando o problema com a barriga e em 2009 a falta de recursos terá uma dimensão ainda maior. O Governo quer pagar despesas continuadas, como vacina e paciente, com recursos extraordinários e insuficientes", disse.
Perondi informou também que esses recursos, no valor de R$ 1,4 bilhão, serão todos destinados para média e alta complexidade hospitalar e ambulatorial e que são necessários pelo menos R$ 1,850 bilhão. O restante, R$ 450 milhões, virá de outros programas do Governo, ou seja, "o Ministério da Saúde terá que cortar esse dinheiro de outros programas importantes", reclamou Perondi.
Para o deputado Darcísio Perondi, a solução definitiva é a regulamentação da Emenda Constitucional 29, cuja votação está paralisada na Câmara. Segundo o parlamentar gaúcho, "só assim vamos garantir recursos claros, suficientes e definitivos para a saúde e acabar de vez com os desvios do setor e com essa angústia de, a cada final de ano, ter que ficar mendigando dinheiro para o Ministério da Saúde pagar suas contas", argumentou.
O deputado Darcísio Perondi informou que a decisão do Governo repercutiu muito mal na Frente Parlamentar da Saúde e nas entidades nacionais do setor. Num telefonema feito pelo vice-presidente da República, José Alencar, Perondi aproveitou para fazer um último apelo. "Pedi ao vice-presidente, nosso parceiro nessa luta, e ele ainda vai tentar apelar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que a decisão da Junta Orçamentária seja revista".
Fonte: Ampasa e Notícias do Perondi, 3/12

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

BOA SEMANA. A SACANAGEM COM A SAÚDE PÚBLICA VAI SE GENERALIZAR NAS NOSSAS BARBAS... AO INVÉS DA SAÚDE GANHAR MAIS RECURSOS COM A REGULAMENTAÇÃO DA EC-29, O PIOR ESTÁ POR VIR... VAMOS PERDER MAIS RECURSOS NO PROJETO DE REFORMA TRIBUTÁRIA QUE AÍ ESTÁ... PRIMEIRO NO MONTANTE QUE FICARÁ PARA A SAÚDE EM RELAÇÃO AOS RECURSOS FEDERAIS.MAS, TAMBÉM, EM RELAÇÃO AOS RECURSOS ESTADUAIS. A IDÉIA MAQUIAVÉLICA DO PAULO BERNARDO, ENGENDRADA PELA PRIMEIRA VEZ NO GOVERNO DO MATO GROSSO DO SUL, QUANDO MEMBRO DA EQUIPE DO ZECA DO PT. A SÍNTESE PAULOBERNARDIANA: “SUBTRAIR DINHEIRO DA ARRECADAÇÃO ESTADUAL (DEPÓSITOS EM FUNDOS DE DESENVOLVIMENTO EXONERAM DO RESPECTIVO RECOLHIMENTO DE ICMS) ANTES DE ALOCAR OS 12% DA SAÚDE E 25% DA EDUCAÇÃO”... COM A “DESCOBERTA ESPERTA” DO MATO GROSSO DO SUL OUTROS ESTADOS IMITARAM E JÁ VÁRIOS FAZEM ISTO.AGORA A PROPOSTA CONSTA OFICIALMENTE DA REFORMA TRIBUTÁRIA... GENETRALIZADA PARA TODOS OS ESTADOS. A SAÚDE PERDERÁ MAIS CERCA DE 3 BI ANUAIS!!!! (PARA QUEM ÍA GANHAR 11 BI EM 2008... REDUZIU PARA 6... PARA 4... AGORA PARA MENOS 3...)É UM ESCÁRNIO.LEIAM O EMEIO ABAIXO DO PEPE VARGAS QUE NA SEMANA PASSADA CONVOCOU E PROVOCOU A FRENTE PARLAMENTAR DE SAÚDE PARA ENTRAR MAIS UMA VEZ NA BRIGA.E-mail n.º 409/2008-GDPV.Aos Membros da Frente Parlamentar de SaúdePrezados(as) Parlamentares,Apresento para consideração dos membros da Frente Parlamentar de Saúde minha preocupação acerca de uma cláusula que consta no substitutivo da reforma tributária que poderá retirar recursos que os Estados destinam às áreas de saúde e educação. Como membro da Comissão Especial entendo que apesar dos avanços que a reforma trará em termos de redução da carga tributária e da simplificação do sistema tributário, o texto aprovado autoriza aos Estados o aporte de parte da arrecadação do ICMS para fundos estaduais de incentivo ao desenvolvimento econômico. Estes recursos não entram no cálculo dos gastos sociais obrigatórios, como saúde (12% da receita tributária líquida) e educação (25%). Ou seja, esta redação poderá significar uma perda de R$ 8 bilhões, se somados os recursos para saúde e educação dos 27 Estados. Feito este alerta, informo que solicitei o agendamento de uma reunião com o relator da Reforma Tributária, deputado Sandro Mabel, para a próxima terça-feira - dia 25/11 e convido a todos os parlamentares da FPS que se interessam pela discussão do tema e apoiam a solicitação de retirada desse item do substitutivo, para que participem do encontro. O local e o horário serão confirmados posteriormente. Conto com a presença de todos para esse importante debate e coloco-me a disposição. Atenciosamente,Pepe Vargas deputado federal PT/RS3. POR ÚLTIMO TRANCREVO A NOTÍCIA DO DEPUTADO PERONDI NESTA LUTA PELA REGULAMENTAÇÃO DA EC-29 Das velas às lágrimas Darcísio Perondi Em 2007 foi preciso uma explosão de greves e uma procissão de velas, promovida pela Frente Parlamentar da Saúde e entidades nacionais, para que as consciências das autoridades fossem iluminadas e o Governo Federal decidisse liberar R$ 1,5 bilhão para estancar a grave crise que prejudicava o atendimento pelo Sistema Único de Saúde e provocava o fechamento de hospitais. No entanto, o Governo usou de uma artimanha contábil e retirou dinheiro do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza para salvar a saúde. A Emenda Constitucional 29 diz que o orçamento da saúde deve ser definido da seguinte forma: tudo que foi gasto no ano anterior mais a variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Como o socorro à saúde veio do Fundo da Pobreza, como um abono, o dinheiro não foi contabilizado como gasto da saúde e não integrou o orçamento do setor para 2008. Como conseqüência, a crise veio com mais força este ano e o Ministério da Saúde foi obrigado a pedir socorro publicamente, alertando que não teria como pagar as contas do mês de novembro. Este ano não houve procissão de velas, mas a insensibilidade do Governo Federal é a mesma. A equipe econômica não se curvou sequer com as lágrimas do vice-presidente da República. José Alencar, que trava uma guerra contra o câncer, afirmou que pode pagar mais de R$ 4 mil num plano privado e ainda tem direito a atendimento privilegiado. "Mas quem não pode?", disse ele, com lágrimas nos olhos. Não adiantou. As lágrimas caíram no vazio. O Ministério da Saúde necessita de R$ 2,674 bilhões para fazer frente a gastos em ações de média e alta complexidade ambulatorial e hospitalar, aquisição de medicamentos excepcionais e implantação de novas políticas como Saúde do Homem, Serviço de Atendimento Médico de Urgência (SAMU) e Saúde na Escola. Mas a Junta Orçamentária do Governo, formada pelos ministros do Planejamento, Fazenda e Casa Civil, e pelo próprio presidente Lula, decidiu liberar só R$ 1,4 bilhão. E mais uma vez os recursos não serão incluídos no piso constitucional para a definição do orçamento da saúde de 2009. As despesas da saúde são continuadas e não podem ser mantidas com recursos extraordinários. Todo o montante de R$ 1,4 bilhão será destinado para média e alta complexidade hospitalar e ambulatorial. Foi uma vitória parcial, já que o gasto mensal do SUS é de R$ 1,850 bilhão. O restante, de R$ 450 milhões, virá de outros programas do Governo. O Ministério da Saúde terá que cortar de outros programas importantes. A solução definitiva para a saúde passa pela regulamentação da Emenda Constitucional 29. Essa Emenda estabeleceu que as três esferas de governo devem aplicar anualmente recursos mínimos em saúde. Os municípios, 15% de suas receitas, os estados 12% e a União tudo que foi gasto no ano anterior mais a variação do PIB. O problema é que o texto não deixou claro o que são ações e serviços de saúde. Das 27 unidades da Federação, apenas dez cumprem o percentual mínimo. Os que não cumprem investem em estradas, restaurantes populares, saneamento e aposentados, alegando serem gastos com saúde. A regulamentação vai fechar essas brechas e mais R$ 5 bilhões serão aplicados pelos estados verdadeiramente em saúde. Duas versões do PLP 121/07 tramitam no Congresso Nacional. No Senado, a proposta aprovada por unanimidade em maio de 2008 muda a forma de correção do orçamento da saúde a nível federal. O Governo teria que investir em saúde 10% de sua receita corrente bruta, de forma escalonada: 8,5% em 2008; 9,0% em 2009; 9,5% em 2010; e 10% a partir de 2011. A proposta que tramita na Câmara mantém a correção pelo PIB e propõe a criação da Contribuição Social da Saúde (CSS), nos moldes da extinta CPMF, mas com arrecadação exclusiva para a saúde. Na Câmara só falta votar um destaque, justamente o que cria a CSS. Temos, portanto, três cenários: ou prevalece o texto puro do Senado, ou o texto puro da Câmara. O terceiro cenário seria aprovar o texto da Câmara com a supressão de alguma parte. Nada pode ser acrescentado.O texto do Senado é o ideal, mas o Governo Federal o considera impraticável. O fundamental é que sejam definidos recursos estáveis e condizentes para o financiamento do SUS, o que só será possível mediante a regulamentação da emenda constitucional 29. E isso precisa acontecer logo, mesmo que sejam necessárias mais velas e mais lágrimas. Darcísio Perondi é deputado federal pelo PMDB do Rio Grande do Sul e um dos coordenadores da Frente Parlamentar da Saúde BOA SEMANA.

O PSF tornou-se obsoleto. Comente o artigo....


Folha de S. Paulo – 30/12/08
PSF
JOSÉ ARISTODEMO PINOTTI
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O Programa de Saúde da Família tornou-se obsoleto. Apesar disso, expande-se sem ter a sua estratégia radicalmente reformulada
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É PERIGOSO mexer com ícones sem ser iconoclasta, mas o Programa de Saúde da Família (PSF) precisa ser rediscutido com seriedade. Caso contrário, continuaremos a gastar grandes quantias de recursos, com resultados precários.
O PSF conta com 43.024 equipes de saúde coordenadas por médicos para visitar famílias nas suas casas (tem também algumas outras funções).
Gasta R$ 4 bilhões por ano e, apesar de ter começado no início dos anos 90, não conseguiu a cobertura desejada ou diminuição apreciável dos índices de morbiletalidade. Recentemente, avaliação da ONU mostrou que somos o país com o terceiro pior índice de infantil da América do Sul.
Não faltam avaliações críticas. A Unicamp (2006) conclui: médicos com formação heterogênea, especializada, sem conhecimento suficiente para atuar na atenção básica; baixa resolubilidade, falta compromisso com a comunidade; capacitações descontínuas, não atendem às necessidades.
O Ministério da Saúde, em 2002, já apontava: deficiência nos equipamentos, na infra-estrutura, nas atividades educativas e de vigilância à saúde e no sistema de referência; inadaptação às mudanças do perfil de morbidade; vinculação precária ao trabalho, elevada rotatividade; cobertura inferior a 25% em 60% dos municípios e só de 14,5% na região de Campinas.
O PSF foi copiado de uma pequena ilha que o utilizou com sucesso há 50 anos. Nosso país é um continente, e a medicina mudou completamente nesse período. Ficou mais complexa, o que torna praticamente impossível termos hoje um médico que atenda a tudo o que se deseja de um generalista (ginecologia, obstetrícia, pediatria, clínica médica e gerontologia).
A tecnologia penetrou na saúde de tal forma que tornou pouco eficiente a presença do médico na casa das famílias, onde pode constatar coisas óbvias, mas não tem possibilidade de realizar sequer procedimentos simples, como papanicolau e mamografia para as mulheres; PSA e toque retal para os homens, para citar poucos
exemplos. Ou seja, passados 50 anos, o PSF, a não ser em localidades especiais, tornou-se obsoleto. Apesar disso, expande-se sem ter a sua estratégia radicalmente reformulada.
A verdade é que ele foi sacralizado ideológica e corporativamente e é usado politicamente pelos governos que se sucedem. Mesmo com distorções, tem sido mais conveniente mantê-lo e ampliá-lo.
Não estou sugerindo que o PSF deva terminar. Ele precisa continuar, mas com transformações relevantes, como ocorre em alguns municípios brasileiros, aproveitando todos os preciosos recursos humanos e financeiros utilizados.
Para visitar as famílias, são suficientes os agentes de saúde, que, treinados, podem facilitar o uso do sistema e oferecer educação para a saúde e algumas ações de prevenção e detecção. O custo é baixíssimo, a eficiência é alta e a delegação é fundamental.
Os pacientes devem ser atendidos nos centros de saúde, para onde os médicos do PSF devem ser transferidos, aproveitando-se suas especialidades originais. É preciso ter aí a presença contínua de um pediatra, que é o médico da criança; um ginecologista preparado para ser o médico da mulher; um clínico, que deve exercer também gerontologia, além de um mínimo de tecnologia, como um posto de coleta laboratorial, com exames simples feitos no mesmo local, um ecógrafo e um raio X simples.
Com isso, que custa muito pouco, poder-se-á resolver 80% dos problemas na atenção primária, próximo da casa do cidadão, acabar com o martírio de idas, vindas e longas demoras e tirar a sobrecarga dos prontos-socorros e hospitais.
Para atender a toda a demanda com qualidade, a delegação de funções com treinamento prévio e o trabalho em equipe são fundamentais. Os milhares de centros de saúde que estão semi-abandonados no país passarão a funcionar com economia de vidas e recursos. Isso é o moderno em saúde.
A medicina é a ciência das verdades transitórias, pois os conhecimentos mudam constantemente. O sistema de saúde precisa ser reavaliado e transformado continuamente, com espírito crítico e pesquisa operacional, adaptando-o também às epidemiologias mutantes.
Nosso sistema, apesar do SUS na Constituição ser notável, está contaminado com cópias de modelos arcaicos e outras de países ricos que não vestem nossa realidade. Essa situação é lastimável, mas abre a oportunidade para um salto qualitativo e quantitativo apenas com uma boa gestão.
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JOSÉ ARISTODEMO PINOTTI , 73, é deputado federal (DEM-SP), professor emérito da USP e da Unicamp e membro da Academia Nacional de Medicina. Foi secretário de Ensino Superior (governo Serra), da Saúde (governo Quércia) e da Educação (governo Montoro) do Estado de São Paulo, reitor da Unicamp e presidente da Federação Internacional de Ginecologia.

domingo, 30 de novembro de 2008

Os 3 amores de Branco


A história de um homem que perdeu a família diante de seus olhos nas chuvas em Jaraguá do Sul.
Branco tinha três amores – a mulher e as duas filhas. E foi carregando saco de cimento nas costas que construiu os sonhos da família. Ele nunca teve tempo para reclamar dos problemas da vida.Ergueu uma casa. Pequena, bem simples, feita em prestações de R$ 300 no alto de um morro de Jaraguá do Sul. “O nosso cantinho.”O sonho que Branco realizou sobre o lote 12 da rua Irineu Franzler, no bairro Tifa Martins, desabou por causa das chuvas. Quando caiu, levou para debaixo da terra seus três amores.Perder a mulher e as duas filhas deixa no homem aquela dor eterna. Pior é quando se viu tudo. Pior é quando se lutou até o fim para salvá-las e saiu derrotado. Pior é se sentir culpado por desgraça tão grande. “Se eu tivesse jogado elas pela janela, sei lá... Agi por impulso e acho que escolhi o jeito errado de sair da casa.”A verdade é que a história de Branco até a noite de 22 de novembro não foi nada fácil. Mas ele sempre deu um jeitinho. Só que desta vez, o golpe doeu demais.Uma família bem unida Branco era só Carlos Alberto Manske há 12 anos. Foi aí que conheceu Silvana – que em 1998 virou uma Manske. Ele loiro e ela morena. Os apelidos Branco e Preta deixaram o casal mais charmoso. Bruna nasceu em 2000. Maria Eduarda chegou cinco anos depois. Família unida. Era no trabalho pesado que o casal encontrava um pouco de conforto para as filhas. Ele como caminhoneiro de uma loja de material de construção. Ela na costura de uma malharia. Quando saíam para o batente, logo cedo, era com os avós que as duas meninas fi cavam. Provavam a cada amanhecer que a felicidade de uma família existe mesmo no meio de uma rotina pesada. Não precisavam de luxo. Era das pequenas coisas que arrancavam a alegria e os sorrisos verdadeiros. Nas tardes de domingo, eles iam até o parque da cidade. Festa garantida. As meninas adoravam. Elas desciam o escorregador dando gargalhadas. Pergunte a qualquer pai ou a qualquer mãe o quanto tudo isso vale. O sonho realizadoSó tinha uma coisa que deixava Branco incomodado. Ter de pagar aluguel, morar uma hora aqui, a outra lá. — Todo mundo quer um cantinho só seu. E como foi duro para que eles tivessem um. Branco teve de fazer acordo na empresa. Preta juntou férias e décimo terceiro. Conseguiram dar entrada no terreno. O restante pagaram em 36 prestações de R$ 300. Na loja de material de construção, Branco sempre foi querido por todos. Por isso, o patrão o ajudou a erguer a casa. Deu todo o material de construção para ele pagar “quando sobrasse um dinheirinho”. Mas, Branco não achava justo. E, em todos os meses, primeiro pagava o patrão e vivia com o pouco que sobrava. — Às vezes, com R$ 100 a gente se virava. Dava para pagar as contas e comer.No dia 22 de dezembro de 2004, o sonho estava de pé. Uma casa de madeira com 6 metros de largura por 6 metros de comprimento. Foi o melhor presente de Natal que Preta poderia receber. Para Branco, “era uma coisa de Deus”. A noite da tragédiaNa noite do sábado de uma semana atrás, Bruna e Maria Eduarda dormiram cedo torcendo pelo sol. Queriam ir no parque no dia seguinte. Branco e Preta rezavam para que a chuva fosse embora, mas por outro motivo. Em fevereiro, uma casa vizinha havia desabado. Fazia dois meses que a chuva não dava uma trégua e, naquela noite, ela castigava Jaraguá do Sul. O medo fez Branco dormir no sofá da sala. Acordaria mais fácil no primeiro sinal de perigo. Foi Preta quem levantou primeiro ao ouvir um estalo. Eles já estavam com as crianças no colo – Branco com a maior e Preta com a menor – quando o estouro se repetiu. Desta vez, bem mais forte. Branco tentou abrir a porta. Não dava. Estava presa à estrutura da casa já fora do lugar. Ele usou toda a força que um pai desesperado poderia ter. A maçaneta quebrou. Ele decidiu pular a janela e puxar seus três amores para fora. Quando esticou os braços para alcançar primeiro a Maria Eduarda, a casa toda desceu o morro. — Eu ainda toquei na mãozinha dela.A luz que sobrouBranco diz que sempre sonha com seus três amores. Às vezes é muito ruim. Todo aquele horror se repete. Mas tem horas que as três aparecem entrando no Fusca branco – ele comprou também com a ajuda do patrão por R$ 3,5 mil, depois de quitar as parcelas do terreno. Nos bons sonhos de Branco, Preta está sempre arrumando as crianças. Bruna fi ca contanto que tirou 35 notas dez na escola. Maria Eduarda vai tomando café com leite na mamadeira, como fazia todas as manhãs. E vão juntos para o parque. Na casa dos pais, Branco falou que nas lembranças eles sempre vão continuar juntos. E chorou. Dói muito. E o que seria capaz de diminuir um pouco esse sofrimento, só faz aumentá-lo. Porque nada é fácil na vida desse caminhoneiro. Branco tem um outro filho, de um primeiro relacionamento. Emerson tem 12 anos. A mãe Ivonete morreu num acidente de trânsito. Os avós maternos ganharam o direito de fi car com o garoto. Branco nunca pôde se aproximar. Há dez anos não se falam. — Só queria dar um abraço. Uma abraço de pai mesmo.

A NOTÍCIA

sábado, 29 de novembro de 2008

Agradecimentos !


JustificarMeus amigos,

Hoje 27 de novembro de 2008 o sol saiu e conseguimos voltar a trabalhar. A despeito de brincadeiras e comentários espirituosos normais sobre esta "folga forçada" a verdade é que nunca me senti tão feliz de voltar ao trabalho. Não somente pelo trabalho, pela instituição e pela própria tranqüilidade de ter aonde ganhar o pão, mas também por ser um sinal de que a vida está voltando ao normal aqui na nossa Itajaí.
As fotos que circulam na internet e os telejornais já nos dão as imagens claras de tudo que aconteceu então não vou me estender narrando e descrevendo as cenas vistas nestes dias. Todos vocês já sabem de cor. Eu quero mesmo é falar sobre lições aprendidas.

Por mais que teorias e leituras mil nos falem sobre isso ainda é surpreendente presenciar como uma tragédia desse porte pode fazer aflorar no ser humano os sentimentos mais nobres e os seus instintos mais primitivos. As cenas e situações vividas neste final de semana prolongado em Itajaí nos fizeram chorar de alegria, raiva, tristeza e impotência. Fizeram-nos perder a fé no ser humano num segundo, para recuperar-la no seguinte. Fez-nos ver que sempre alguém se aproveitará da desgraça alheia, mas que também é mais fácil começar de novo quando todos se dão as mãos.

Que aquela entidade superior que cada um acredita (Deus, Alá, Buda, GADU etc.) e da forma que cada um a concebe tenha piedade daqueles:

- Que se aproveitaram a situação para fazer saques em Supermercados, levando principalmente bebidas e cigarros
- Que saquearam uma farmácia levando medicamentos controlados, equipamentos e cofres e destruindo os produtos de primeira necessidade que ficaram assim como a estrutura física da mesma.
- Que pediam 5 reais por um litro de água mineral.
- Que chegaram a pedir 150 reais por um botijão de gás.
- Que foram pedir donativos de água e alimentos nas áreas secas pra vender nas áreas alagadas.
- Que foram comer e pegar roupas nos centros de triagem mesmo não tendo suas casas atingidas.
- Que esperaram as pessoas saírem das suas casas para roubarem o que restava.
- Que fizeram pessoas dormir em telhados e lajes com frio e fome para não ter suas casas saqueadas.
- Que não sentiram preocupação por ninguém, algo está errado em seu coração.
- Que simplesmente fizeram de conta que nada acontecia, por estarem em áreas secas.

Da mesma forma, que essa mesma entidade superior abençoe:

- Aqueles que atenderam ao chamado das rádios e se apresentaram no domingo no quartel dos bombeiros para ajudar de qualquer forma.
- Os bombeiros que tiveram paciência com a gente no quartel para nos instruir e nos orientar nas atividades que devíamos desenvolver.
- A turma das lanchas, os donos das lanchinhas de pescarias de fim de semana que rapidamente trouxeram seus barquinhos nas suas carretas e fizeram tanta diferença.
- À equipe da lancha, gente sensacional que parecia que nos conhecíamos de toda uma vida.
- Aos soldados do exército do Paraná e do Rio Grande do Sul.
- Aos bravos gaúchos, tantas vezes vitimas de nossas brincadeiras que trouxeram caminhões e caminhões de mantimentos.
- Aos cadetes da Academia da Polícia Militar que ainda em formação se portaram com veteranos.
- Aos Bombeiros e Policias locais que resgataram, cuidaram , orientaram e auxiliaram de todas as formas, muitas vezes com as suas próprias casas embaixo das águas.
- Aos Médicos Voluntários.
- Às enfermeiras Voluntárias.
- Aos bombeiros do Paraná que trabalharam ombro a ombro com os nossos.
- Aos Helicópteros da Aeronáutica e Exercito que fizeram os resgates nos locais de difícil acesso.
- Aos incansáveis do SAMU e das ambulâncias em geral, que não tiveram tempo nem pra respirar.
- Ao pessoal do Helicóptero da Polícia Militar de São Paulo, que mostrou que longo é o braço da solidariedade.
- Ao pessoal das rádios que manteve a população informada e manteve a esperança de quem estava isolado em casa.
- Aos estudantes que emprestaram seus físicos para carregar e descarregar caminhões nos centros de triagem.
- Às pessoas que cozinharam para milhares de estranhos.
- Ao empresário que não se identificou e entregou mais de mil marmitex no centro de triagem.
- A todos que doaram nem que seja uma peça de roupa.
- A todos que serviram nem que seja um copo de água a quem precisou.
- A todos que oraram por todos.
- Ao Brasil todo, que chorou nossos mortos e nossas perdas.
- Aos novos amigos que fiz no centro de triagem, na segunda-feira.
- A todos aqueles que me ligaram preocupados com a gente.
- A todos aqueles que ainda se preocupam por alguém.
- A todos aqueles que fizeram algo, mas eu não soube ou esqueci.

Há alguns anos, numa grande enchente na Argentina um anônimo escreveu isto:

COMEÇAR DE NOVO

Eu tinha medo da escuridão
Até que as noites se fizeram longas e sem luz
Eu não resistia ao frio facilmente
Até passar a noite molhado numa laje
Eu tinha medo dos mortos
Até ter que dormir num cemitério
Eu tinha rejeição por quem era de Buenos Aires
Até que me deram abrigo e alimento
Eu tinha aversão a Judeus
Até darem remédios aos meus filhos
Eu adorava exibir a minha nova jaqueta
Até dar ela a um garoto com hipotermia
Eu escolhia cuidadosamente a minha comida
Até que tive fome
Eu desconfiava da pele escura
Até que um braço forte me tirou da água
Eu achava que tinha visto muita coisa
Até ver meu povo perambulando sem rumo pelas ruas
Eu não gostava do cachorro do meu vizinho
Até naquela noite eu o ouvir ganir até se afogar
Eu não lembrava os idosos
Até participar dos resgates
Eu não sabia cozinhar
Até ter na minha frente uma panela com arroz e crianças com fome
Eu achava que a minha casa era mais importante que as outras
Até ver todas cobertas pelas águas
Eu tinha orgulho do meu nome e sobrenome
Até a gente se tornar todos seres anônimos
Eu não ouvia rádio
Até ser ela que manteve a minha energia
Eu criticava a bagunça dos estudantes
Até que eles, às centenas, me estenderam suas mãos solidárias
Eu tinha segurança absoluta de como seriam meus próximos anos
Agora nem tanto
Eu vivia numa comunidade com uma classe política
Mas agora espero que a correnteza tenha levado embora
Eu não lembrava o nome de todos os estados
Agora guardo cada um no coração
Eu não tinha boa memória
Talvez por isso eu não lembre de todo mundo
Mas terei mesmo assim o que me resta de vida para agradecer a todos
Eu não te conhecia
Agora você é meu irmão
Tínhamos um rio
Agora somos parte dele
É de manhã, já saiu o sol e não faz tanto frio
Graças a Deus
Vamos começar de novo.

Anônimo


É hora de recomeçar, e talvez seja hora de recomeçar não só materialmente. Talvez seja uma boa oportunidade de renascer, de se reinventar e de crescer como ser humano.
Pelo menos é a minha hora, acredito.

Que Deus abençoe a todos.

Luis Fernando Gigena

Itajaí e mudança climática


Escrito por Roberto Malvezzi
Quando um fenômeno extremo acontece isoladamente, não dá para dizer que é resultado das mudanças climáticas. Quando eles acontecem em várias partes do mundo quase que simultaneamente, é sinal evidente que o planeta está mudando. Essa é a sabedoria que se vai acumulando em relação à questão.

O que acontece no vale do Itajaí, trágico e triste em todos os sentidos, deveria ser um sinal vermelho para as autoridades brasileiras. Qualquer estadista reconheceria que os rumos da civilização brasileira – devastando suas matas, ocupando morros etc. – só podem colher como resultado a tragédia.

Por enquanto, olhamos a cidade devastada de longe. As águas do Itajaí não entraram aqui pelas nossas portas do Nordeste. É provável que não tenha morrido nenhum parente ou amigo. Então, é possível contemplar o fato com lamentações, mas sem experimentar o que é ter a vida devastada de um minuto para o outro.

O que nos indicam é que estamos apenas no começo. Os tais fenômenos extremos deverão se repetir com mais freqüência e mais violência. Talvez, quando um dia se abaterem sobre nossas casas, lhes daremos o devido significado.

Mesmo assim insistimos em derrubar as florestas a troco de uns quilos de soja e meia dúzia de dólares. Devastação financiada pelo BNDES e outros bancos oficiais. Dívidas monumentais de predadores perdoadas. Legislação alterada para que o agro e hidronegócio avancem sobre as áreas de fronteiras, sobre o Cerrado, sobre a Amazônia, Caatinga, Pantanal, Mata Atlântica e Pampas. Sem falar na conivência das autoridades locais com o avanço das imobiliárias sobre as áreas de risco e preservação, inclusive com condomínios de luxo.

Parece ser impossível para os brasileiros construir uma economia que não seja predadora, que seja inteligente, que aponte para o século XXI e não para o passado.

O exemplo de Itajaí, como já mostrou Nova Orleans, indica que não serão apenas os pobres – embora o sejam sempre – as vítimas exclusivas da vingança de Gaia.

Roberto Malvezzi, o Gogó, é coordenador da CPT – Comissão Pastoral da Terra.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

20 anos do SUS


CELEBRAR O CONQUISTADO. REPUDIAR O INACEITÁVEL.

Nos 20 anos da Constituição Brasileira e do Sistema Único de Saúde - SUS, o Cebes celebra a grande conquista da sociedade brasileira, que mudou a história da política social no país ao instituir a saúde como direito de todos os cidadãos, sem distinção de qualquer natureza, e como dever do Estado. Nessas duas décadas, profissionais, gestores, movimentos sociais, serviços e a população vêm travando uma dura batalha para fazer com que esse direito seja concreto, contínuo e seguro. O SUS mudou de forma radical a configuração da atenção à saúde no Brasil. É, sem dúvida, uma das políticas sociais mais abrangentes e distributivas da história nacional, ao tornar o acesso universal e incluir milhões de brasileiros na condição de usuários de saúde. Com o SUS criou-se um sistema nacional e único, abrangendo todas as áreas relativas ao cuidado em saúde. O SUS reordenou a prestação de serviços, criando uma complexa e ousada estrutura onde união, estados e municípios trabalham em conjunto. Criou e expandiu instâncias de pactuação e participação social inéditas na história do país. O SUS aumentou a rede de serviços públicos; criou e implementou inúmeros programas de atenção e promoção avançados e abrangentes. A população conhece e usa o SUS todos os dias, seja direta ou indiretamente. Os números do SUS impressionam, demonstram a potência desse jovem sistema e confirmam a importância da instituição do direito à saúde na Constituição. O SUS é mais que um sistema de saúde. Ele faz parte do pacto social presente na Constituição de 1988, que visa a construir uma sociedade democrática e solidária. Por isso foi inscrito na seguridade social; para, junto com assistência social e previdência, garantir proteção social em condições de igualdade a todos os cidadãos, através de políticas eqüitativas e sistemas universais, públicos e financiados por toda a sociedade. Esses são preceitos que valorizam a vida, a dignidade e o direito ao futuro como bens inalienáveis de todos. Não há paz e desenvolvimento onde a vida é um valor menor, onde a saúde é considerada uma mercadoria, que mais terá quem mais puder pagar. Não há justiça social onde a atenção à saúde dependa da capacidade e do esforço individual de cada um. Não há futuro para uma sociedade sem bens coletivos sólidos e perenes. Os governos têm continuamente adiado sua integral responsabilidade com a seguridade social e o SUS, restringindo financiamento, recursos humanos, permitindo a expansão do setor privado em áreas estritamente públicas e sendo permissivo com práticas clientelistas e patrimonialistas. Em 20 anos de SUS, a saúde tem sido negligenciada em prol de uma de política econômica restritiva e de acordos políticos particularistas. Esse não é o projeto dos brasileiros. O projeto dos brasileiros é que se cumpra a Constituição. E aos governos cabe não somente ‘respeitá-la’; eles têm a obrigação de implementá-la. E é exatamente o reconhecimento a todos os avanços do SUS que faz com que o Cebes, neste momento de justa celebração, venha registrar sua indignação com a permanência de um conjunto de problemas que atinge de forma cruel a população e ameaça os princípios conquistados. Nossa indignação faz com que venhamos registrar o que consideramos inaceitável no SUS hoje.Inaceitável porque ultrapassa os limites do respeito à dignidade humana. Inaceitável porque fere os direitos da cidadania e da democracia. Inaceitável porque corrompe os princípios do que é público, bem de todos, e não pode ser usado em favor de alguns. Inaceitável porque conhecemos as soluções e porque dominamos as condições necessárias para implementá-las. A sociedade brasileira investiu trabalho e esperanças na construção de um SUS para todos. É inaceitável que governos e gestores, representantes do Estado responsáveis pelo SUS, deixem de cumprir suas diretrizes elementares. Não podemos mais esconder ou justificar as tragédias cotidianas que afligem a população e que podem ser resolvidas já. O SUS é um projeto nacional, solidário, justo e, acima de tudo, possível. Por isso consideramos INACEITÁVEL, passados 20 anos: 1 Que ainda não exista uma fonte estável para o financiamento do SUS. 2 Que o gasto público em saúde ainda seja de menos de 1 real por habitante/dia, muito aquém de países menos ricos na América Latina.3 Que permaneçam as condições precárias de atendimento nos serviços do SUS. O SUS pode e deve prestar serviços dignos aos cidadãos. A população tem direito a saber em que condições será atendida, quanto tempo tardará o atendimento e como proceder em caso de expectativas não cumpridas.4 Que serviços do SUS ainda não funcionem como uma rede integrada, com porta de entrada única, deixando ao usuário a responsabilidade de buscar por conta própria os serviços de que necessita.5 Que ainda não tenham sido implementados, em todo o território nacional, mecanismos elementares de gestão de filas que eliminem o sofrimento diário dos usuários. 6 Que na reorganização da atenção seja dada prioridade às UPAs e AMAs, modelo ultrapassado e imediatista de instalação focada de unidades, e que a atenção básica não seja até hoje o eixo estruturante de todo o sistema. 7 Que ainda não tenha sido implantado o cartão SUS, com informações seguras sobre o histórico de cuidados dos usuários, fonte de planejamento, transparência e combate à corrupção. 8 Que a população não tenha ainda acesso seguro e regular aos medicamentos e exames vinculados ao ato terapêutico. 9 Que serviços do SUS ainda hoje não garantam às mulheres grávidas a referência segura de onde vão parir. 10 Que se mantenham discriminações de classe social, gênero, orientação sexual e raça em serviços do SUS. 11 Que serviços e profissionais de saúde continuem maltratando as mulheres que fazem aborto, com negligência no atendimento, ajuizamento moral, denúncias e outras formas de violação de direitos. 12 Que serviços desautorizados pela vigilância sanitária continuem funcionando. 13 Que hospitais lucrativos continuem sendo considerados como filantrópicos e recebendo subsídios públicos. 14 Que se mantenha a dupla porta de entrada nos hospitais públicos e contratados. 15 Que os profissionais de saúde sejam desvalorizados, tenham suas condições de trabalho e salariais aviltadas. 16 Que o SUS permaneça sem uma política nacional de formação e capacitação de recursos humanos. 17 Que, a título de redução do gasto público, se mantenha a farsa dos vínculos precários de trabalho, dependendo de convênios e contratos temporários. 18 Que profissionais usem a precariedade das condições de trabalho como justificativa para ausências e não cumprimento de horários. 19 Que o SUS continue sendo usado como moeda política. É preciso criminalizar o uso político de cargos de direção e dos setores de compras de hospitais do SUS, que estimulam a corrupção, drenam recursos e comprometem a qualidade dos serviços. 20 Que se mantenham transferências e subsídios do setor público para o setor privado de planos e seguros, através da compra de planos para funcionários públicos e da dedução do pagamento de planos no imposto de renda. É injusto que o conjunto da população financie o acesso diferenciado das camadas médias e a sobrevivência e crescimento do setor privado. 21 Que o SUS ainda não estabeleça metas e responsabilidades sanitárias claras a serem cumpridas pelos gestores e governos. 22 Que ainda não haja mecanismos legais de responsabilização de governos e gestores pelos serviços não cumpridos. Essa ausência estimula e encobre a alarmante corrupção no setor. 23 Que as transferências financeiras intergovernamentais ainda sejam feitas de forma verticalizada, em “caixinhas”, engessando o planejamento e a lógica sanitária. 24 Que as políticas sociais sejam ainda hoje, e cada vez mais, fragmentadas e setorializadas. É urgente o estabelecimento de políticas que integrem as distintas áreas sociais, para garantir os direitos instituídos no título VIII da Constituição. 25 Que o país ainda careça de uma política saudável para o meio ambiente, que afaste os riscos do cultivo de transgênicos, do abuso de agrotóxicos, da poluição dos mananciais, do desflorestamento, e também de uma política que assegure condições saudáveis de trabalho no campo e nas indústrias. 26 Que governo e sociedade se recusem a discutir o aborto que praticamos, o consumo de álcool que nos vitima, os acidentes de trabalho que nos aleijam. 27 Que se ignore a importância do complexo produtivo da saúde como forma de afirmação da soberania nacional, como combate á subordinação da produção industrial à lógica de preservação de patentes e domínios de conhecimento, como possibilidade de associar o desenvolvimento industrial à política de proteção social, gerando um exemplar modelo de desenvolvimento nacional. 28 Que não se efetive a concepção de Seguridade Social prevista na Constituição de 88, como condição imprescindível para a coesão social. Essa efetivação passa hoje pela convocação da Conferência Nacional de Seguridade Social. Transformar o direito à saúde em direito em exercício é dever do Estado e não pode mais ser retardado, sob alegações de qualquer ordem. Não existe valor superior à vida, muito menos aqueles propugnados pelos defensores de políticas voltadas para o pagamento de juros e produção de superávits fiscais que restringem o investimento social inadiável. O Cebes conclama a todos a celebrar nossas conquistas, refletir sobre os impasses e desafios e não transigir com o que é inaceitável. Depois de 20 anos, já temos condições de exigir a sua superação imediata!