sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Divulgação começa na universidade.


A influência da indústria sobre os médicos começa bem antes dos consultórios. Uma pesquisa feita pelo professor da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) e coordenador da unidade hospitalar de ensino, Daisson José Trevisol, mostrou que o assédio ocorre desde os bancos das universidades. O estudo, que fez parte da dissertação de mestrado em Saúde Coletiva de Trevisol, mostra que a forma de abordagem varia de acordo com cada etapa da área da medicina. "No começo, assistimos um trabalho de estabelecimento da marca", explica Trevisol. Surgem, assim, os primeiros patrocínios para as festas estudantis, onde só o nome do laboratório está presente. Em uma segunda fase, aparecem os brindes para aqueles estudantes que começam a fazer plantões. "São coisas como necessaire com escova de dentes, pasta, pente, tudo de forma sutil", explica Trevisol. A partir daí as coisas se intensificam e o corpo-a-corpo chega aos representantes de turma. "Muitos começam a freqüentar congressos, seminários e ganhar palm tops e outros brindes melhores", afirma o professor. Atenção especial Aos professores médicos, considerados formadores de opinião, a atenção é ainda mais especial. "Mas eles consideram tudo normal", afirma Trevisol. Ao todo, foram 1.231 entrevistados entre estudantes de medicina, professores médicos e pacientes dos ambulatórios da escola. A conclusão é que tanto professores quanto estudantes estão expostos de forma direta ou indireta à propaganda das indústrias. O mais interessante é que entre os professores médicos, 53,6% consideraram que nunca ou raramente são influenciados pela indústria farmacêutica, mas 53,7% afirmaram acreditar que seus colegas são. Entre os estudantes de medicina, 43,2% acreditam que, no futuro, como médicos graduados, raramente ou nunca serão influenciados, porém 42% acreditam que os médicos já formados são sempre ou freqüentemente influenciados. Para 41,7% deles, as informações dadas pelos representantes da indústria farmacêutica são boas ou ótimas, além do que, 74,8% relataram que a indústria farmacêutica poderá contribuir para a sua prática profissional. Brindes Este estudo identificou que a distribuição de brindes e amostras grátis para professores médicos e estudantes estão entre as principais técnicas de abordagem utilizadas pela indústria farmacêutica na escola de medicina. Nos ambulatórios, apesar de não ter sido observada nenhuma repercussão direta da influência da indústria farmacêutica, a forma como são escolhidos os medicamento a serem prescritos não é, de modo geral, racional, e a maioria dos professores e estudantes não está imune à sedução e à persuasão da publicidade e propaganda da indústria de medicamentos dentro das escolas de medicina, apesar de serem proibidas por lei. Conforme o estudo, tal prática pode contribuir para o uso não racional de medicamentos, a depender da consciência crítica dos alunos e dos profissionais que ali atuam. Na Universidade Federal de Juiz de Fora, em Minas Gerais, o assunto acabou virando disciplina no curso de mestrado em saúde coletiva. Os "impactos da propaganda de medicamentos e de alimentos na saúde humana" vale dois créditos e também surgiu de uma tese de doutorado, em ciência e tecnologia de alimentos, defendida pela professora Miriam Aparecida Pinto Vilela. Ela analisou a propaganda de alimentos com alegações funcionais (aqueles que, além da função nutricional, argumentam benefícios para a saúde) e, com a ajuda da professora Maria da Penha Henriques do Amaral, doutora em Ciências Farmacêuticas, criaram a nova disciplina. Segundo Maria da Penha, trata-se de um alerta aos profissionais quanto ao uso racional de medicamentos. "Nos hospitais escolas, os médicos são muito influenciados pelos propagandistas quando deveriam seguir a Relação Nacional de Medicamentos estabelecida pelo Ministério", afirma. Mesmo admitindo que o contato com os médicos em muitos casos é a única forma de o laboratório chegar aos médicos, Maria da Penha afirma que ele vem sendo abusivo. "As coisas que são oferecidas em trocas chegam a ser vergonhosas e os benefícios também se estendem às farmácias", acrescentam. Fonte: Gazeta Mercantil

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