
Uma entrevista com Raul Pinho, diretor executivo do Trata Brasil, um instituto lançado recentemente para pressionar por mais investimentos no setor de saneamento.
VOZ: O que é exatamente o Trata Brasil?
Lançamos a organização Trata Brasil porque constatamos que há um desconhecimento total do setor pela população. Outro dia saiu uma pesquisa no Rio de Janeiro sobre a qualidade dos serviços públicos de saneamento. Nas áreas que mais foram atingidas pela dengue (Barra, Barra da Tijuca, Zona Oeste, Jacarepaguá), 65% dos moradores declararam considerar o serviço bom ou muito bom. Ficou claro que assim que as pessoas apertam o botão de suas descargas, o problema desaparece para elas. Com água poluída, o tratamento é mais caro. Tem de gastar mais para torná-la potável. Pela pesquisa que encomendamos à Fundação Getúlio Vargas, vimos que nas áreas que convivem com esgoto a céu aberto, as crianças têm 30% menos de aproveitamento escolar. E quando crescem, não tem mais como recuperar essa fase de aprendizagem. Ficam com oportunidades reduzidas.
VOZ: Como o sr. vê esse debate entre setor privado e setor público na área de saneamento?
RP: Não sou partidário de só privado ou só público. No Brasil, o serviço de saneamento sempre foi público. Atuam dependendo de recursos públicos. Mas nossas necessidades de financiamento nesta área são da ordem de R$ 200 bilhões. O saneamento, para universalizar, precisa de R$ 11 bilhões por ano ao longo de 20 anos. Só que a demanda por recursos em todas as áreas é tanta que o governo não tem como atender. Eu vejo como necessária a participação privada em todos os setores – energia/gás/telefonia móvel. Há que ter espaço para as empresas privadas. Se não, não alcançaremos a universalização nunca. Se ficarmos dependendo a vida inteira do governo federal, isso não vai acontecer nunca. Se forem mantidas as taxas de crescimento dos últimos anos, a universalização só vai acontecer em 2122, 300 anos após a independência.Agora, se o brasileiro está satisfeito com isso, então tá.
VOZ: Por quê as empresas privadas não avançaram até agora?
RP: Há um corporativismo grande. O Plano Nacional de Saneamento (PLANASA) criado pelos militares em 1974 impôs aos municípios que concedessem o serviço às empresas estaduais como condição para que obtivessem recursos federais. Hoje há quem defenda que é preciso manter esse modelo só porque é contra as empresas privadas e contra o lucro. Eu acho que a gestão tem de continuar sendo pública. Hoje há leis e regras que definem bem a responsabilidade de cada um. Se mantivermos o modelo como é hoje, o Orçamento Geral da União, o FGTS, o FAT não vão dar conta da imensa necessidade de financiamento. Não é suficiente.
VOZ: O presidente da ASSEMAE mencionou o caso de Manaus, onde a multinacional francesa Suez-Lyonnaise acabou abandonando o serviço...
RP: Quando saiu a Lei de Concessões, houve um grande movimento no sentido de incentivar os municípios a fazer concessões privadas. Houve muita coisa mal feita. O município de Ribeirão Preto (SP) é um exemplo. Na época ainda do prefeito Antonio Palocci, houve uma parceria com uma empresa privada: a empresa tocaria a estação de tratamento de esgoto e o município faria a parte da coleta. A estação de tratamento foi feita. Ficou lá, mas não houve coleta. A culpa é da empresa privada? O que se fala é uma meia verdade. O setor privado teve culpa ao entrar em modelos não sustentáveis. Aí também se encaixa a história de Manaus. Num momento de privatização, venderam as ações da Manaus Saneamento. A Suez-Lyonnaise ganhou naquele embalo do momento. Pagou um valor absurdamente alto e entrou numa canoa furada. O peixe não era bem assim como foi vendido. As informações do edital não correspondiam à realidade. A Suez foi embora por causa desse tipo de política ideologizada no Brasil, na Argentina, na Bolívia. Contra a ideologia, não há argumentos. Mas existem concessões privadas em Niterói (RJ), Limeira (SP) e a população tem o serviço realizado, pagando tarifas dentro dos padrões. Enfim, é um setor complicado. As questões ideológicas são difíceis de romper. A Lei das PPP (Parcerias Público Privadas) é uma oportunidade para o setor privado. Mas não é um negócio de hoje para amanhã. Tem um trabalho a ser feito. As PPPs são uma ferramenta que vai permitir ao setor privado aumentar sua participação.
VOZ: O que é exatamente o Trata Brasil?
Lançamos a organização Trata Brasil porque constatamos que há um desconhecimento total do setor pela população. Outro dia saiu uma pesquisa no Rio de Janeiro sobre a qualidade dos serviços públicos de saneamento. Nas áreas que mais foram atingidas pela dengue (Barra, Barra da Tijuca, Zona Oeste, Jacarepaguá), 65% dos moradores declararam considerar o serviço bom ou muito bom. Ficou claro que assim que as pessoas apertam o botão de suas descargas, o problema desaparece para elas. Com água poluída, o tratamento é mais caro. Tem de gastar mais para torná-la potável. Pela pesquisa que encomendamos à Fundação Getúlio Vargas, vimos que nas áreas que convivem com esgoto a céu aberto, as crianças têm 30% menos de aproveitamento escolar. E quando crescem, não tem mais como recuperar essa fase de aprendizagem. Ficam com oportunidades reduzidas.
VOZ: Como o sr. vê esse debate entre setor privado e setor público na área de saneamento?
RP: Não sou partidário de só privado ou só público. No Brasil, o serviço de saneamento sempre foi público. Atuam dependendo de recursos públicos. Mas nossas necessidades de financiamento nesta área são da ordem de R$ 200 bilhões. O saneamento, para universalizar, precisa de R$ 11 bilhões por ano ao longo de 20 anos. Só que a demanda por recursos em todas as áreas é tanta que o governo não tem como atender. Eu vejo como necessária a participação privada em todos os setores – energia/gás/telefonia móvel. Há que ter espaço para as empresas privadas. Se não, não alcançaremos a universalização nunca. Se ficarmos dependendo a vida inteira do governo federal, isso não vai acontecer nunca. Se forem mantidas as taxas de crescimento dos últimos anos, a universalização só vai acontecer em 2122, 300 anos após a independência.Agora, se o brasileiro está satisfeito com isso, então tá.
VOZ: Por quê as empresas privadas não avançaram até agora?
RP: Há um corporativismo grande. O Plano Nacional de Saneamento (PLANASA) criado pelos militares em 1974 impôs aos municípios que concedessem o serviço às empresas estaduais como condição para que obtivessem recursos federais. Hoje há quem defenda que é preciso manter esse modelo só porque é contra as empresas privadas e contra o lucro. Eu acho que a gestão tem de continuar sendo pública. Hoje há leis e regras que definem bem a responsabilidade de cada um. Se mantivermos o modelo como é hoje, o Orçamento Geral da União, o FGTS, o FAT não vão dar conta da imensa necessidade de financiamento. Não é suficiente.
VOZ: O presidente da ASSEMAE mencionou o caso de Manaus, onde a multinacional francesa Suez-Lyonnaise acabou abandonando o serviço...
RP: Quando saiu a Lei de Concessões, houve um grande movimento no sentido de incentivar os municípios a fazer concessões privadas. Houve muita coisa mal feita. O município de Ribeirão Preto (SP) é um exemplo. Na época ainda do prefeito Antonio Palocci, houve uma parceria com uma empresa privada: a empresa tocaria a estação de tratamento de esgoto e o município faria a parte da coleta. A estação de tratamento foi feita. Ficou lá, mas não houve coleta. A culpa é da empresa privada? O que se fala é uma meia verdade. O setor privado teve culpa ao entrar em modelos não sustentáveis. Aí também se encaixa a história de Manaus. Num momento de privatização, venderam as ações da Manaus Saneamento. A Suez-Lyonnaise ganhou naquele embalo do momento. Pagou um valor absurdamente alto e entrou numa canoa furada. O peixe não era bem assim como foi vendido. As informações do edital não correspondiam à realidade. A Suez foi embora por causa desse tipo de política ideologizada no Brasil, na Argentina, na Bolívia. Contra a ideologia, não há argumentos. Mas existem concessões privadas em Niterói (RJ), Limeira (SP) e a população tem o serviço realizado, pagando tarifas dentro dos padrões. Enfim, é um setor complicado. As questões ideológicas são difíceis de romper. A Lei das PPP (Parcerias Público Privadas) é uma oportunidade para o setor privado. Mas não é um negócio de hoje para amanhã. Tem um trabalho a ser feito. As PPPs são uma ferramenta que vai permitir ao setor privado aumentar sua participação.
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