quinta-feira, 31 de março de 2011

Carta Aberta encaminhada ao Deputado Dado Cherem, o qual propõe a PEC 002/11 de criação da Carreira de Médico de Estado, para conhecimento e posicionamento de todos os profissionais da SES.

Carta Aberta encaminhada ao Deputado Dado Cherem, o qual propõe a PEC 002/11 de criação da Carreira de Médico de Estado, para conhecimento e posicionamento de todos os profissionais da SES.

Atenciosamente,

Lizete Contin - GEABS/SES

Florianópolis, 30 de março de 2011.

Senhor Deputado Dado Cherem

ALESC

Lamentavelmente fomos informados sobre a PEC 0002/2011, Art. 154-A, na qual o senhor propõe a criação da carreira de Médico de Estado.

Nos surpreende negativamente, uma vez que o senhor foi nosso Secretário de Estado da Saúde e deveria estar consciente de que Saúde não se faz somente com o médico, mas sim com uma equipe multiprofissional, como está proposto no SUS, na Estratégia Saúde da Família, na qual a equipe tem um trabalho integrado e cada um na sua especificidade tem igual importância.

Gostaria de enfatizar também que o conceito ampliado de Saúde pressupõe trabalho em equipe, pois envolve as áreas sociais, políticas, econômicas, de saneamento básico e será um grande retrocesso excluir os profissionais que integram esta equipe de saúde, em uma proposta de carreira de estado, contemplando apenas o médico.

Porque não propõe a carreira de Profissional de Saúde de Estado? Ou ainda da Equipe de Saúde de Estado?

Talvez o senhor esteja desinformado em relação aos salários dos profissionais de saúde, pois não é somente o salário do médico que está defasado, mas o de todos os profissionais que compõem a equipe de saúde, inclusive o Odontólogo. Veja deputado, que até a sua categoria profissional não está sendo contemplada nesta proposta, percebe-se que faz muito tempo que o senhor não exerce sua função de origem, pois nem deve mais saber quanto está ganhando um Odontólogo no serviço público de saúde.

Os servidores da Secretaria de Estado da Saúde em nenhum momento tiveram seu apoio enquanto esteve à frente da pasta da Secretaria de Estado da Saúde, os salários ficaram congelados, nenhuma melhoria foi feita em sua gestão, enquanto que outras secretarias foram beneficiadas com gratificações, a saúde foi excluída, sendo que não teve o menor apoio dos gestores para que tal fato fosse revertido.

Ressaltamos senhor deputado, a defasagem salarial não se restringe ao profissional médico, mas a todos que atuam na árdua tarefa de cuidar da saúde da população catarinense.

Na condição de Cirurgião-Dentista, o senhor parou para pensar no prejuízo que essa lei, se aprovada, irá causar ao Sistema de Saúde como um todo? E também ao Estado, gerando descontentamento às demais categorias profissionais que integram a Equipe de Saúde ??

uma lei discriminatória que ignora completamente a existência de uma dezena de outras categorias profissionais reconhecidas pelo Sistema Único de Saúde - SUS.

Atuamos na área de Atenção Básica e essa área conta com um trabalho incansável de muitos profissionais que assessoram as Gerências Regionais de Saúde, bem como as Secretarias Municipais de Saúde, apoiando desta forma as Equipes de Saúde da Família, conforme proposta do SUS e é necessário que este grupo de profissionais seja valorizado (não somente o médico), com melhoria salarial, implementação de plano de cargos e carreiras, sem descriminação. Tudo no SUS está proposto numa lógica de trabalho multi / interdisciplinar: Equipes de Saúde da Família-ESF, Centros de Atenção Psicossocial-CAPS, Núcleos de Apoio à Saúde da Família-NASF, Centros de Referência em Odontologia-CEO, entre outros. Portanto, faz-se necessário fortalecer / estimular as várias categorias profissionais que integram estas propostas. Este trabalho tem dado certo e tem contribuído significativamente no sentido de prevenir, reduzir, controlar e tratar os agravos relacionados à saúde da população catarinense.

Santa Catarina constitui-se no Estado brasileiro de maior cobertura de Equipes de Saúde da Família (100% dos municípios implantados) e isso com certeza é resultado de um trabalho abnegado e perseverante de muitos profissionais que acreditam na possibilidade de “mudança de modelo de gestão”, que está construindo um processo de trabalho através de “Redes de Atenção à Saúde” e isso, senhor deputado, é resultado de trabalho de Equipe Multiprofissional, seja no nível de coordenação estadual, regional e municipal.

E o prêmio que todos recebem é esta proposta que desconsidera toda esta multiparceria, que vem provocando avanços nos indicadores de saúde em nosso Estado ?

Senhor Deputado, é necessário que sua visão em relação à saúde seja atualizada, pois uma mudança de paradigma vem acompanhando os avanços na saúde nos últimos anos, com o processo de reforma psiquiátrica, por exemplo, contrapondo-se à visão hospitalocêntrica, centrada no ato médico. A resolutividade na saúde hoje é fruto de um trabalho de muitas mãos, de uma variedade de áreas e categorias profissionais, os quais têm contribuído no sentido de proporcionar ou resgatar a saúde de tantos que são atendidos, seja nas Unidades Básicas de Saúde, através das Equipes de Saúde da Família, como nos hospitais catarinenses, nas Gerências Regionais de Saúde, bem como nas Gerências Técnicas da SES. Nosso Estado não pode caminhar em desacordo com os demais da federação, esta sua proposta caracteriza-se como um retrocesso no atual momento de consolidação do SUS em nosso país.


Desta forma, clamamos para o seu bom senso, por favor, repense sua proposta excludente em relação à equipe de saúde.

Gostaríamos de tê-lo na Assembléia Legislativa como um digno representante de todos os profissionais de saúde de Santa Catarina. Vamos pensar na possibilidade de criação da Carreira de Estado de Profissionais de Saúde!!! É necessário pensar na melhoria das condições de trabalho, nos salários defasados de todos os profissionais de saúde deste Estado!! Não merecemos este tratamento injusto e discriminatório de quem já esteve à frente da pasta da Secretaria de Estado da Saúde em Santa Catarina!!!

Esperamos que não haja por trás dessa proposta motivos corporativistas de uma categoria profissional, com a qual o senhor compactue, deixando de lado o exercício do legislador, em prol de todas as categorias profissionais, para abraçar e privilegiar minorias.

Atenciosamente,

Lizete Contin

Representando os Profissionais de Saúde da Gerência de Coordenação da Atenção Básica - Secretaria de Estado da Saúde / SC


terça-feira, 15 de março de 2011

Organizar o SUS significa organizar as Redes de Atenção.

Luis Nassif entrevista Padilha: "Organizar o SUS significa organizar as redes de antenção"


Por Bruno de Pierro, Lilian Milena e Luis Nassif

O novo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, não tem dúvida de que o país vive o principal momento político para a área. Hoje, o setor da saúde é 35% do que se investe em inovação tecnológica no país; o valor adicionado do PIB da saúde é maior do que o valor da agricultura. Quase 30% do PIB industrial vem do setor da saúde. Contudo, há pela frente importantes desafios, que passam pela reorganização do modelo do Sistema Único de Saúde (SUS) e pela reformulação das redes de atenção, passando por mudanças no sistema de remuneração de profissionais.

Estratégia central da gestão será a intensificação do movimento de regionalização do SUS, a fim de se definir a coordenação das políticas em territórios, com abrangência superior aos municípios. Por meio dessa política, poderá ser consolidada uma relação direta de compartilhamento com os governos estaduais, formando uma rede interfederativa.

“Nós temos que organizar o SUS, e organizá-lo significa organizar as redes de atenção; a lógica instante entre a atenção básica versus média complexidade versus alta complexidade é uma lógica que não vê a realidade do usuário que passa por todos esses níveis de atenção”, explica Padilha.

Regionalização do SUS

A estratégia de regionalização faz parte da idéia original do SUS. Por que, até agora, ela não foi implementada?

Há duas questões que foram decisivas para não se concluir o processo de regionalização do SUS. Uma é o fato de o passo inicial do SUS ter sido a descentralização. E a diretriz inicial da descentralização foi mais forte do que qualquer outro processo; isso fez com que, desde o começo, se iniciasse uma relação muito direta entre governo federal e os governos municipais, que é quem de fato assumia a saúde pública – todo o processo de ampliação do SUS passava pelas gestões municipais, para assumirem a responsabilidade pelas redes. E, no meio disso, houve muita interdição dos governos estaduais. Esse processo foi comum, desde as primeiras atividades de implantação, no início de 1990, independente de quem fossem os ministros e os governos estaduais.

Teve momentos maiores, quando se intensificou a descentralização, mas, independente das relações políticas, o conceito de que o SUS começaria a ser concluído a partir dos municípios (ou seja, a relação direta do Ministério da Saúde com os municípios) foi muito forte. O que foi bom, pois fez com que a gente ampliasse, ao longo desses anos, os serviços; fez com que a gente tivesse o maior programa de atenção primária do mundo – nenhum país no mundo tem 100 milhões de pessoas cobertas por um programa de atenção básica de saúde, como a Saúde da Família; fez com que a gente conseguisse alcançar ganhos importantes na estratégia de imunização e enfrentasse uma epidemia como a malária.

O problema é que o debate só da descentralização deixou uma lacuna, que é a questão da coordenação das políticas num território que é mais amplo do que o município, que é o território onde você pode ofertar o conjunto de atenção à saúde. A atenção integral à saúde, necessariamente, só é ofertada para uma pessoa numa rede, que começa com a atenção básica, passa pela possibilidade da oferta de especialistas na média complexidade, e pela alta complexidade. Essa rede ultrapassa o limite de um território municipal; ela necessariamente exige uma articulação que supera o território municipal e que exige uma relação direta de compartilhamento com os governos estaduais.

Indicador interativo de acesso

Lembro de experiências que ocorreram em Minas Gerais, há alguns anos, quando se começou a falar em consórcios. Mas isso não chegou a avançar?

A idéia de consórcios avançou muito, tanto que virou uma solução para os municípios, para facilitar o processo licitatório, ter maior poder de compra, agregar técnicos, organizar serviços comuns. Mas como a lógica foi da descentralização, e às vezes sem a relação direta de compartilhar com o governo estadual, você foi perdendo a noção do território. Por isso a idéia de retomar, a partir daquele território regional – governo federal, governo estadual e municipal – o planejamento de quais são os investimentos que devem ser feitos, quais são as estratégias, tendo como o nosso foco, nosso objetivo, o que chamamos de indicador interativo de acesso, e que esse indicador seja o mobilizador das políticas, dos serviços e quais os investimentos que devem ser feitos, discutir a questão da gestão do trabalho, da contratação dos profissionais, do valor a ser pago naquela região.

Hoje você tem um verdadeiro leilão de contratação de médico no mesmo território, no interior do país, ou em regiões metropolitanas. Tem regiões metropolitanas, que quando você expande o serviço do município à capital, você disputa o médico para quase a cidade da região metropolitana, e é disputa de salário. No interior do país é a mesma coisa; o prefeito passa a oferecer um valor maior para o médico vir – você tem uma instabilidade na fixação do médico naquele território muito grande.

Nós temos que organizar o SUS, e organizá-lo significa organizar as redes de atenção; a lógica instante entre a atenção básica versus média complexidade versus alta complexidade é uma lógica que não vê a realidade do usuário que passa por todos esses níveis de atenção.

Pacto de Gestão do SUS

Em termos de implantação efetiva dessa política, o que já temos?

Hoje temos o Pacto de Gestão do SUS, construído nos últimos seis anos. Trata-se da idéia de definir os repasses entre União, Estados e municípios, por meio de compromissos globais assumidos entre eles. Estamos buscando criar a idéia do contrato entre União, Estados e municípios, e que esse contrato estabeleça as metas, os compromissos a serem assumidos e quais as estratégias para alcançar essas metas. Nesse contrato terá a idéia do indicador de garantia de acesso, que é o quanto se oferece, no SUS, para aquela região e para as necessidades daquela população especifica. Pegamos a lógica do PAC e do Pacto de Gestão e aprimoramos, num contrato interfederativo.

Mapas Sanitários Regionais

Mas como será feito o controle das necessidades de cada região? Há algum mecanismo desenvolvido?

Para cada região, vamos ter um mapa, para ver, por exemplo, o que é ofertado no sul daquela região hoje, quais são os serviços, quais são as equipes, quais as redes, qual a lógica de acesso às redes e qual a necessidade de saúde daquela população. Os governos estaduais passam a assumir um papel importante de coordenação naquela região. Volta-se a valorizar o papel dos governos estaduais, na definição do plano para aquela região; ao mesmo tempo, os governos estaduais passam a se comprometer e dividir a gestão daquela rede com os municípios.

O que acontece em algumas situações hoje? Você tem disputa entre o equipamento estadual da região e os hospitais municipais.

Nós temos no SUS a Central de Regulação, que é você ter, num determinado território, uma estrutura que acompanhe os leitos hospitalares daquela região e organize o acesso a eles. A pessoa sofre um acidente na rua; assim que entra no SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), ela já sabe onde tem um hospital de emergência e o leito.

Se a pessoa precisa de cirurgia, é a Central de Regulação que organiza isso. Hoje, há situações em que os leitos do hospital estadual não estão na Central de Regulação daquele território. Então, o município que atende a atenção básica, pelo SAMU, e precisa internar aquele paciente naquele hospital estadual, não tem acesso ao hospital estadual.

Distribuição de profissionais

Um obstáculo que há para a consolidação da regionalização é a distribuição de médicos no país. O que será feito para essa questão?

O debate sobre a formação de médicos e especialistas não pode ser um debate descolados das necessidades do SUS, no mundo inteiro é assim; onde se estabelecem as diretrizes de onde tem que se formar e quais são as especialidades, daquilo que é financiado pelo poder público, é feito com o sistema nacional de saúde e com o sistema nacional de educação.

Nós - e o Ministério da Educação (MEC) está conduzindo junto conosco, numa parceria muito forte - estamos retomando esse debate, para verificar onde precisamos mais de médicos. Hoje temos o Pacto da Redução da Mortalidade Materna e Infantil no norte e no nordeste do país, ou seja, onde há taxas maiores de mortalidade materna. Durante os oito anos, nós expandimos muito os serviços lá, com UTI neonatal. Mas qual foi o principal fator limitante? A não-oferta de pediatras, neonatologistas e obstetras nas regiões norte e nordeste.

Você precisa formar mais e deslocar, junto com políticas de fixação de profissionais daquelas regiões. E o que é decisivo para a fixação de um profissional, depois da formação dele, é onde ele faz a residência. Onde ele faz sua especialidade é onde é a tendência dele se fixar.

Nós vamos desenvolver uma política que valorize a qualidade, num plano estratégico, para 10 a 15 anos, para que se desconcentre a formação de médicos no país. Um dos grandes fatores limitantes hoje, para a melhoria da nossa qualidade de saúde, é a oferta de profissionais de nível superior onde não há. E não se trata só do interior do país, mas também das regiões periféricas e metropolitanas.

Opacidade no Senado Brasileiro

segunda-feira, 14 de março de 2011

Imposto Sindical - obrigatório.

O mês de março chegou....e com ele além das águas de março...para quem não lembra...chega também o famigerado imposto sindical obrigatório que todos os trabalhadores com carteira assinada desconta do seu salário. Ele é equivalente ao valor de 01 dia de trabalho do mês de março e você só acorda para o fato no início do mês de abril quando recebe sua folha de pagamento e depara-se com um salário menor do que o do mês anterior. Goste ou não goste, seja ou não sindicalizado, você acaba sustentando muitos sindicatos pelegos que não possuem vínculo nenhum com suas bases sindicais, mas sobrevivem do nosso rico e suado dinheirinho redistribuído pelo governo federal. Sindicatos muitos deles pelegos e sem compromisso nenhum com suas bases

Somos no Brasil mais de 42 milhões trabalhadores brasileiros com carteira assina, imagine qual é o valor final que é redistribuído para os diversos sindicatos espalhados por este Brasil afora. Estima-se em algo próximo de R$ 100 milhões. Entendo que os sindicatos deveriam sobreviver com a contribuição espontânea dos seus sindicalizados, porque só assim os mesmos mostrariam na prática o compromisso com os trabalhadores, caso contrário não teriam vida longa. Tal contribuição ainda é fruto da política getulista desde 1943. Espero que a presidenta Dilma Rouself ponha fim a essa vergonha e dê o primeiro passo para um sistema sindical mais digno e representativo.

sábado, 12 de março de 2011

Avaliando o Brasil para todos !

Nos últimos meses, especialmente durante a campanha eleitoral para presidente da república, ouvimos em prosa e em verso que a situação dos brasileiros nos últimos anos melhorou bastante. É bem verdade que os próprios números apresentados, e comparando com o passado não muito distante, a evolução foi realmente para melhor, não há muitas dúvidas quanto a isso. Porém analisando comparativamente o Brasil com outros países da América Latina, no item economia e distribuição de renda, fiquei com certa preocupação quanto à velocidade dessa melhoria, ou dizendo de outra forma, qual a velocidade da diminuição da pobreza no Brasil.

Apesar dos esforços que o governo federal empreendeu nesses últimos dez anos, sabemos que muito ainda precisa ser feito, ainda mais que o Brasil é a sétima economia do mundo e o país mais rico da nossa região. Foi corrente nos últimos dias, a série de críticas que o governo da presidenta Dilma Rousself enfrentou quando divulgou o aumento dos valores do Programa Bolsa Família. Portanto vamos a alguns números que nem sempre são de conhecimento público, para não ficamos na crítica pela crítica, tão comum nos meios políticos.

O Brasil dedica ao combate a pobreza ( transferência de renda para os mais pobres ) apenas 0,58 do seu Produto Interno Bruto, enquanto a Argentina gasta 0.70, o Paraguai 0,92 e a Guatemala 3.0. É só parar para pensar um pouco e ver que esses números já deixam sob suspeita o verdadeiro desejo do governo brasileiro em diminuir a pobreza no país, pois os demais países acima apresentados são certamente muitas vezes mais pobres que o Brasil, exceto neste caso a própria Argentina, pois os demais não temos muitas dúvidas.

Outra comparação que devemos fazer é em quanto ( a velocidade ) que essa taxa de pobreza reduziu, pois avaliando o Brasil apenas com seu próprios processo de evolução, fica claro as melhorias, porém vamos comparar com outros países com níveis de pobreza igual ou maiores que o nosso. Entre 2008 e 2009, enquanto o Brasil, Peru, o Paraguai e o Panamá reduziram sua taxa de pobreza entre 0,9 e 2,2 %, o Uruguai e a República Dominicana reduziram suas taxas de pobreza em mais de 3%. Além do que no Brasil a taxa de indigência mostrou uma pequena queda, e na Colômbia, Panamá, Peru, República Dominicana e no Uruguai, essa taxa foi mais significativa. Nunca é demais lembrar que indigente é aquele indivíduo que não tem renda suficiente para adquirir uma cesta alimentar que atenda às suas necessidades nutricionais.

Outro indicador muito sensível a população de baixa renda, é quanto ao poder de compra e o valor do salário mínimo, tema de acaloradas discussões no mês de fevereiro no Congresso Nacional em função da dúvida quanto as possibilidade reais de aumentar em R$ 30,00, R$ 40,00 ou R$ 50,00 reais a mais. Vamos seguir a mesma lógica anterior, comparando com nossos ilustres vizinhos. O salário mínimo no Brasil é de US$ 286,00, na Argentina é de US$896,00, no Paraguai é de US$ 559,00, no Equador é de US$ 490,00, na Venezuela é de US$ 481,00. Fica a pergunta: porque tamanha diferença?

Para finalizar e não deixamos nossa avaliação nas questões meramente econômicas, podemos comparar nosso IDH ( Índice de Desenvolvimento Humano ) que utiliza vários parâmetros e critérios comparativos, e somos tomados de tristeza quando sabemos que o nosso IDH é de 0,699, que deixa o Brasil em 73ª lugar entre os 169 países pesquisados, bem abaixo do Chile ( 45ª ), Argentina ( 46ª ), Uruguai ( 52ª ), México ( 56 ª ) e Peru ( 63ª ). Parece que nossa alegria com nossos bons números não se sustentam frente a um simples comparativo com países tão parecidos e próximos de nós. Portanto, tenho a sensação que estamos fazendo muito pouco do que poderíamos estar fazendo, apesar de toda a propaganda oficial, não livrando o Brasil do restrito clube de países em que a riqueza é muito concentrada nas mãos de poucos. É por aí que devemos cobrar de nossos representantes no Legislativo, e da própria presidenta da república, a discussão mais do que urgente da tão sonhada reforma tributária, porque não podemos ficar “ad eternum” sob as benesses de programas sociais que apenas atenuam nossos problemas, mas não atacam no seu âmago a causalidade dos mesmos, deixando nossos irmãos brasileiros sempre reféns da “caridade” de nossos dirigentes, alguns com interesses basicamente eleitoreiros.

Sendo assim, sempre que ouvirmos os bons indicadores brasileiros, não deixe de acreditar, mas vá atrás de mais informações, pois é importante comparamos com outros países do mesmo porte ou até menores, para que possamos avaliar a extensão desse nosso processo.

Saúde deve mostrar serviço com a verba que tem.

Ellen Machado Rodrigues

Do jornal Valor Econômico de 11 de março de 2011

Antes de pedir mais dinheiro para a saúde, o ministro Alexandre Padilha vai tentar gastar melhor o que tem. Só com isso - acredita - será possível convencer a sociedade a permitir novas formas de financiamento e levar a saúde a padrões de primeiro mundo.

Segundo Padilha, o Brasil tem o programa - Sistema Unificado de Saúde (SUS )- que mais faz transplantes e hemodiálises do mundo, e, no entanto, gasta apenas R$ 660 per capita. Isso somados União, Estados e municípios. Só a União investe R$ 304 per capita. Inglaterra e Canadá gastam seis vezes mais.

Há dois meses no Ministério da Saúde, Padilha diz que há uma revolução a caminho, que vai desde um novo modelo de construção de unidades de saúde, até a mudança da forma de remuneração dos hospitais. Ele quer regionalizar os atendimentos de saúde. Cobrar compensação dos planos por seus segurados atendidos na rede SUS é prioridade dele e da presidente. Não dá prazo, mas diz que já este mês concluirá a primeira etapa da implantação do Cartão SUS. A seguir, a entrevista concedida ao Valor:

Valor: O problema da saúde é mais de gestão ou de dinheiro?

Alexandre Padilha: Eu não tenho dúvidas de que a gente pode fazer muito mais com o que temos. A prioridade é dupla: investir melhor o que nós temos e ter mais para investir cada vez melhor. Agora eu tenho plena consciência de que no debate com a sociedade, neste momento, a prioridade do ministério é mostrar claramente que pode fazer mais com o que tem, aumentar os controles, ter pactos cada vez mais claros com o que tem e definir melhor suas prioridades, até para a sociedade ter segurança e a economia brasileira poder colocar mais recursos para a saúde para que a gente possa atingir os patamares de outros países. Porque há países em que o investimento no setor é de dez, 11,12 vezes mais per capita.

Valor: Com atendimento universal?

Padilha: O dos EUA é o que mais investe, é 11, 12 mais, mas é muito privado. Canadá e Inglaterra, seis, sete vezes mais. No Brasil, a saúde suplementar é quase três vezes maior que a saúde pública per capita. Mas atende a 45 milhões de pessoas. O SUS, teoricamente, atende 190 milhões, mas, na prática, responde por 150 milhões. O investimento per capita da saúde suplementar é quase três vezes mais o per capita da saúde pública.

Valor: O senhor vai retomar o projeto das fundações estatais para gerenciar a saúde?

Padilha: A prioridade é o aprimoramento da gestão do SUS. Acho um grande erro misturar aprimoramento da gestão, com modelo gerencial administrativo.

Valor: O que precisa para que os hospitais públicos tenham o padrão da rede Sarah Kubitschek?

Padilha: Temos alguns hospitais públicos do mesmo padrão. Alguns hospitais universitários. A rede Sarah Kubitschek é uma rede que nos orgulha a todos. É uma rede em parte é financiada com recursos públicos. Tem excelência na gestão.

Valor: É uma fundação. O senhor é contrário a esse modelo?

Padilha: Só não acho que essa seja a centralidade do debate do modelo de gestão. São alternativas gerenciais importantes. Nós precisamos compreender o SUS. O sistema brasileiro é formado por modelos gerenciais diversos. Isso é a riqueza do SUS. Eu sou favorável a qualquer modelo gerencial que cumpra suas diretrizes. No SUS você tem hospitais só estatais de altíssima qualidade, e hospitais só estatais que não são nada públicos, são quase privados. São tão privados quanto hospitais privados, com trabalhadores poucos valorizados. No SUS você tem fundações de altíssima qualidade que seguem as diretrizes do SUS e você tem fundações de baixíssima qualidade na execução. Você tem modelos novos de PPPs, de alta qualidade assim como de baixa qualidade. Precisamos é aprimorar a gestão do SUS na definição das prioridades para investimento.

Valor: Quais são essas prioridades?

Padilha: Às vezes há recurso, investimento, equipamento e estrutura, mas o processo de trabalho na unidade faz com que o atendimento seja de baixa qualidade.

Valor: Por que?

Padilha: A unidade precisa ter uma agenda aberta para o acesso. Há unidades de saúde que têm equipamento, estrutura e profissionais, mas funcionam com a agenda fechada, não acolhem quem chega. Quando acolhe, não faz análise de risco. Então, quem está em situação grave tem o mesmo cuidado e prioridade de quem não está, fica no mesmo lugar, não tem espaço de organização para cada um deles.

Valor: Como será a mudança na gestão?

Padilha: A prioridade, em gestão, é ter instrumentos mais sólidos no contrato entre União, Estados e municípios. Que este contrato seja fruto do que nós estamos chamando de mapa sanitário regional.

Valor: O que é esse mapa?

Padilha: É preciso regionalizar a saúde no país. Esse mapa vai definir qual o território

necessário para compor uma rede que vai da atenção básica até uma certa complexidade. Nesse território tem vários gestores. A gestão pura municipal, outro é um hospital estadual, outro, um hospital filantrópico credenciados do SUS. Então você tem vários modelos gerenciais no espaço regional. A nossa centralidade é a gestão das redes no espaço territorial, é isso que pode melhorar a qualidade de saúde do país.

Valor: Como centralizar a gestão?

Padilha: Fazendo os contratos entre Estados e municípios a partir da realidade regional com objetivos e metas claras a serem cumpridas e acompanhadas.

Valor: Fácil assim?

Padilha: Junto com isso pensamos em criar um indicador nacional de garantia de acesso que tenha expressão regional e, de certa forma, tenha o que o SUS oferta para as necessidades de saúde daquela região, o que consegue resolver naquela região. Em que medida o acesso é de qualidade e do nível de satisfação do usuário. Precisamos de um indicador de satisfação do usuário. Isso para compor um grande indicador nacional que pode ter a expressão regional, a expressão estadual e que seja um marcador para a melhoria da saúde para aquela região, para aquele Estado.

Valor: Para que serviria esse indicador?

Padilha: Por exemplo, uma região hoje é nota dois. Nós queremos que em quatro anos ela chegue a cinco. Por esse indicador, União, Estados e municípios definirão a estratégia para que essa região chegue aos cinco.

Valor: A presidente Dilma diz que antes é preciso saber para quê vai se pedir mais dinheiro para a Saúde. O senhor sabe?

Padilha: A prioridade são essas duas grandes portas de entrada do SUS: atenção básica e a porta da urgência e emergência. A atenção básica, para ser resolutiva, precisa ter o suporte permanente da atenção especializada.

Valor: Como assim?

Padilha: O médico que está no centro de saúde tem que analisar seu diagnóstico com um

médico da atenção especializada fazendo uso da telemedicina. Isso significa reestruturar fisicamente a unidade básica de saúde. É preciso renovar o padrão construtivo das unidades de saúde do país. A vida média dos nossos hospitais é de 35, 40 anos. São construídos no padrão de uma medicina que não existe mais. Por exemplo: a realidade das urgências e emergências. A grande maioria foi construídas quando as urgências e emergências eram um espaço pequeno, a centralidade nos hospitais eram os leitos de internação crônica, de longa duração. Salvavam-se poucas vidas na urgência e emergência. Isso mudou nos últimos 15 anos. Então você tem de mudar todo o padrão construtivo das urgências e emergências do país, para garantir equipes estejam lá, quando forem demandadas, mas também assegurar a relação desta unidade com a atenção hospitalar de média complexidade.

Valor: Como seria esse espaço?

Padilha: A ideia é ter urgências e emergências amplas. Em rede. Na atenção básica tem uma sala de observação, é o primeiro atendimento. No meio do caminho tem uma Unidade de Pronto Atendimento e o transporte seguro, que é o Samu. É preciso ter uma unidade de urgência e emergência hospitalar em que a entrada seja ampla, faça classificação de risco, diga quem é de risco alto, vermelho, quem é de risco intermediário, amarelo, quem não é de risco. Haverá também o leito de retaguarda. Um dos problema da urgência lotada não é que as pessoas não estejam sendo atendidas. Falta um leito de retaguarda para encaminhar essa pessoa.

Valor: Onde se poderia justificar novos recursos?

Padilha: O acesso ao que tem de mais alta complexidade. O Brasil hoje tem um déficit importante de cirurgia de ortopedia. Seja de cirurgia de urgência e emergência de trauma, que é decorrente de acidente, seja de reabilitação. Há também uma população cada vez maior de acesso a medicamentos de alto custo, quimioterápicos, radioterápicos, que impactam fortemente a realidade de saúde. Isso é de alto custo. O Brasil é o país que mais faz transplante público no mundo, o que tem a maior rede de hemodiálise totalmente pública no mundo. Gratuita, universal.

Valor: Com dois meses no cargo, já deu para identificar os principais gargalos da saúde?

Padilha: Um é esse: os mecanismos de contratualização entre União, Estados e municípios. É um gargalo importante, fundamental. Ou seja, os instrumentos que definem os repasses entre União, Estados e municípios, e que estabelecem metas de compromisso e que induz financeiramente e premia quem cumpre meta. Outra prioridade é a definição do que compõe uma rede de atenção à saúde.

Valor: Por quê?

Padilha: O processo de construção do SUS foi um processo de descentralização para os municípios. Se jogou muito peso no processo de descentralização e menos nas outras diretrizes fundamentais do SUS que são o acesso e a integralidade, ou seja, dar para a pessoa o cuidado integral.

Valor: A saúde suplementar atende mais de 45 milhões de pessoas, que também se servem da rede pública. Quando é que os planos de saúde vão começar a ressarcir o SUS? Isso também não é financiamento da saúde?

Padilha: Esse ressarcimento é prioridade nossa. Nós primeiro precisamos aprimorar as informações que o SUS tem dos atendimentos dos planos de saúde para que se possam estabelecer metas de ressarcimento. A ideia do Cartão Nacional de Saúde, conhecido como o cartão SUS, também é pra isso. Ele é prioridade da presidenta.

Valor: Qual é a parcela dos usuários dos planos atendida pelo SUS?

Padilha: Há várias estimativas e aproximações. Algumas unidades Hospitalares dizem que chega a15%, 20%, mas hoje não se tem esse dado com precisão. O que se tem hoje é uma estimativa que varia de R$ 500 milhões a R$1 bilhão por ano, mas são estimativas. O que se sabe muito claramente é que em geral é muito comum quem tem plano de saúde se utilizar do SUS na urgência e emergência. É muito comum também para o uso do medicamento mais caro, quimioterápico, radioterapia que o plano não cobre, transplantes, cirurgias com alta tecnologia. Isso é muito comum. O ressarcimento é fundamental para compensar, e, mais do que isso, para identificar cada vez mais quais são os pontos de complementariedade. A partir da definição desses pontos é possível construir uma agenda comum de organização dos serviços.

Valor: Como o senhor pretende convencer os planos de saúde, que resistem a fazer ressarcimento?

Padilha: Há uma disputa, inclusive de questões legais. São questionamentos não sobre a lei, que estabelece limites para o mecanismo de ressarcimento. Mas há um interesse também da saúde suplementar de que essa complementariedade seja mais clara. Nós estamos conversando. Precisamos de um indicador de satisfação do usuário para compor um índice nacional que sirva às metas da saúde

Valor: Já existe um cronograma para a implantação do cartão?

 
Padilha: Fechado não. Nós estamos fechando agora um diagnóstico de quais são os municípios que já usam hoje. Vários municípios já usam o número do cartão SUS para a organização e gestão de seus serviços. Esse diagnóstico fica pronto agora na metade de março. São cerca de 700 municípios. Não necessariamente têm um cartão. Às vezes usam só o número que está cadastrado. Há quase 100 milhões de pessoas cadastradas com o registro do número SUS. Tem 130 milhões de pessoas cadastradas e 100 milhões de cadastros limpos, higienizados de um número do cartão SUS. São Paulo usa o número do cartão SUS para toda a rede básica do Estado. Diadema (SP) usa para tudo: básica, média e alta complexidade e Belo Horizonte (MG) também.


Valor: Então o cartão sai este ano, depois de oito anos e dois governos de discussão?

 
Padilha: Não dou prazo. O Conselho Nacional de Saúde já discutiu o assunto ano passado.

Valor: O senhor vai primeiro tentar o acordo com a saúde suplementar para ter mais recursos ou o aumento do financiamento via CPMF ou CSS?

Padilha: Eu não vou discutir fonte de financiamento. Meu esforço é aprimorar a gestão para fazer mais com o que nós temos para que o crescimento da economia seja generoso com a saúde no país. Agora uma coisa não tem relação com a outra. O ressarcimento não resolve o problema do financiamento do SUS. O ressarcimento é muito mais que uma compensação pelo uso - ele permite identificar complementariedades entre o SUS e a saúde suplementar.

Valor: O senhor vai reajustar a tabela SUS como reclamam os hospitais?

Padilha: Estou convencido de que nós precisamos apostar num novo modelo de financiamento dos procedimentos da saúde.Todas as experiências mostram que se você puder fugir do modelo de remuneração por procedimento e passar para um modelo de remuneração por pacote - diagnóstico, tratamento e qualidade de serviço, sobretudo alta - você tem resultados e utilização melhor dos recursos. A grande demanda que os hospitais fazem em relação à tabela SUS não é só se vai ou não reajustar, mas discutir qual é o perfil assistencial de cada um desses hospitais. E você sai comprando procedimento pontual em cada hospital. Em vez de pagar procedimento, eu prefiro contratar 20, 30 leitos, blocos de leito, contratar as equipes desse hospital.

Valor: Pelo visto, logo vamos ter um Plano Nacional de Saúde.

Padilha: Ah, isso também!

Valor: Como está sua relação com os governadores da oposição?

Padilha: Ótima. Com todos os da oposição. Um grau de convergência grande tanto com os da base [de apoio ao governo] quanto com os da oposição. Todos sentem na pele a escassez da falta de médico onde se precisa, da distribuição de médicos, da necessidade de reestruturação física das unidades, de se pensar novos modelos da contratação e remuneração de serviços que são ofertados. Hoje há uma grande convergência em relação aos desafios da saúde, não só dos governadores quanto dos secretários dos partidos de oposição. Com alguns deles eu tenho identidade inclusive profissional anterior. Em São Paulo, além de ótima relação profissional com o governador Geraldo Alckmin [PSDB}, do ponto de vista político, o secretário de Saúde é professor da USP, instituição à qual eu estava ligado, então a relação é a melhor possível. Isso é bom porque acho que podemos construir um grande consenso entre a base do governo e a oposição sobre os desafios da saúde no país.



quinta-feira, 10 de março de 2011

Minha reflexão concreta sobre o futuro do SUS !

De tanto ouvir falar que o SUS não funciona, opinião essa vinda de tudo que é direção, tem horas que bate uma dúvida cruel, e fica a pergunta que não quer calar: O SUS tem jeito? Será uma missão impossível? Então vamos falar um pouco sobre isso tudo.

Nós trabalhadores de saúde envolvidos com a construção de um Sistema Único de Saúde de qualidade, sabemos que ele é acima de tudo uma política pública importante e prioritária, e que os governos (municipais, estaduais e federal) precisam dar mais atenção a esse belo sistema.

Se formos avaliar, são mais de 20 anos de SUS e aí fica a pergunta: até onde avançamos? Parece que o avanço foi muito pequeno, em especial na reforma da gestão, ponto crucial e de debates acalorados desde as últimas eleições para governadores e presidente da república. Não podemos esquecer que escondido nessa discussão está o aspecto do descrédito na gestão estatal, ficando claro muitas vezes, até para quem acredita piamente, a sensação de inércia e de incapacidade do SUS de fazer a sua reforma administrativa, e dá os resultados esperados pela população. Então, essa inércia vai deixando um sentimento muito forte de impaciência, em especial na população de baixa renda que necessita e dependem 100% dele, pois ela quer ver um desempenho de gestão adequado, quer produtividade, qualidade, quer a diminuição da fila, e sabemos que boa parte da fila no Brasil é um problema de gestão, não é nem mesmo de capacidade instalada. Pois não existe avaliação de risco nas unidades, não há ninguém que se responsabilize para garantir o acesso imediato de quem tem um diagnóstico de risco, só para ficar em alguns poucos exemplos. Então fica claro que é muito mais um problema de gestão, ainda que haja um problema de acesso também.

Outro ponto fundamental que não temos nem como discutir é a pouca informatização dessa imensa rede de assistência, isso é um absurdo! Perguntamos: o quanto nossos gestores já gastaram em informatização em pleno século XXI! Portanto se quisermos estabelecer algo concreto para nossa população precisamos apresentar algumas alternativas concretas, em especial na área de gerência, e uma das grandes características mais marcantes na atualidade é o forte aspecto e a característica regional dessa gerência. Precisamos investir na regionalização, pois um SUS de caráter apenas municipal não tem mais saída. Encontramos inúmeros municípios que investem muito acima dos 15% obrigatórios pela legislação federal, e mesmo assim tem seus serviços de saúde, mal avaliados. Dessa forma precisamos construir uma REDE DE ATENÇÃO À SAÚDE com vários municípios (macrorregional), de preferência respeitando todos os aspectos socioculturais e econômicos dos mesmos, superando as imensas desigualdades de acesso e os vazios assistenciais. Caso contrário vamos fragmentar o SUS mais ainda. Nessa direção não podemos perder a oportunidade e a bela experiência atualmente lançada em nossa região do Planalto Norte e Nordeste de Santa Catarina.

Os governos municipais, com apoio da Secretaria de Estado da Saúde e do Ministério da Saúde, precisam expandir a rede de atenção primária à saúde (Unidades Básicas de Saúde) e organizar uma rede assistencial de qualidade. Outro ponto importante é que precisamos resgatar a belíssima ideia do cartão de saúde (Cartão SUS), importante ferramenta para a gestão. Entre seus usos, o controle de prazos de espera, continuidade do atendimento e ressarcimento ao SUS.

Enfim, parece o obvio, mas não podemos descuidar minimamente das instalações físicas existentes, algumas precárias e sujas, repor e consertar equipamentos quebrados e rever as regras invisíveis entre empregador e servidor público do "eu finge que pago e você finge que trabalha". Chega de ouvir por parte da população que vai procurar o postinho de saúde, visão essa no meu entendimento não apenas carinhosa mais muito pejorativa e que denegri a grande importância desse espaço de saúde.



O SUS tem jeito ?

Por Lígia Bahia.

Perguntar se o Sistema único de Saúde (SUS ) tem jeito e não ferir suscetibilidades costumava ser uma missão impossível. Qualquer menção aos problemas no atendimento público motivava o desenrolar do pergaminho de dupla face, ambas fundamentalistas.

Para os afeitos às ideias de que o mercado tudo resolve, ouvir dizer que não era bem assim quando se trata de saúde configurava uma ofensa grave. Por sua vez, os estatólatras fingiam ignorar que o direito estabelecido na Constituição de 1988 não havia se transformado em fato.

Bastou um gesto presidencial para rasgar fantasias. O desafio lançado pelo ministro da Saúde -"convencer a sociedade sobre o SUS" - o retira da condenação de amparar apenas os pobres ou permanecer como utopia imaculada. O sistema público de saúde real não foi reabilitado, mas ganhou a chance de ser submetido a uma espécie de estágio probatório. Se conseguir demonstrar eficiência e qualidade, receberá como prêmio mais recursos. Caso contrário, continuará comendo o pão que o diabo amassou. Segundo nossas autoridades, o momento é de definição: ou caminhamos para um apartheid na saúde ou organizaremos um sistema nacional de saúde abrangente e igualitário.

A oportunidade não pode ser desperdiçada. Mas, na pressa de apresentar as alternativas para "guaribar" o SUS, admite-se que o ônus da prova caiba ao sistema público. Ora, o SUS nunca foi o réu! A sociedade brasileira (supondo que o termo empregado pelos nossos governantes signifique plural de cidadão) não venera o SUS, tampouco expressa sentimentos inteiramente favoráveis em relação às empresas de planos e seguros de saúde. Quem pode fica com os dois: faz exames em laboratórios privados e traz para o médico do SUS ver; pega medicamentos do Farmácia Popular com a receita do médico do plano; tem plano mas alguns exames só são realizados em serviços públicos; sabe que a vacinação nos postos de saúde e o Samu funcionam bem. O teor de cada componente varia, mas a mistura entre público e privado é quase constante.

Atendimento público, sem gastar um tostão do próprio bolso, nem com remédios, ou privado puro - aquele obtido por quem jamais pisou em um consultório particular de médicos que trabalham também em instituições públicas - são raridades. Para substituir intuições e preconceitos por evidências é preciso desativar a premissa falsa: o SUS ficará bom quando conseguir fazer mais e melhor com menos. Não conseguimos superar gritantes desigualdades regionais, e os diferenciais dos gastos com assistência médica e hospitalar no setor privado (pelo menos quatro vezes superiores), para segmentos populacionais que moram nas regiões Sudeste e Sul, as agravam. O acesso e a qualidade mais homogêneos às ações de saúde exigem combinar estratégias para ampliar o financiamento e melhorar a gestão.

Expandir a rede de atenção primária e organizar uma rede assistencial exclusiva para o SUS, estimulando o fechamento das duplas portas de entrada de hospitais públicos e filantrópicos, ampliando as bases orçamentárias daqueles estabelecimentos que continuarão a ser subsidiados com recursos públicos, é um bom começo. O cartão de saúde é uma valiosíssima ferramenta para a gestão. Entre seus usos, o controle de prazos de espera, continuidade do atendimento e ressarcimento ao SUS.


Cuidar das instalações físicas precárias e sujas dos prédios, repor e consertar equipamentos quebrados e rever as regras invisíveis do "finge que paga e finge que trabalha" repaginarão o SUS. De onde virão os recursos políticos e financeiros para viabilizar essas pequenas, mas importantes reorientações? Os políticos, da abertura de reais alternativas sobre os rumos do nosso sistema de saúde. O ônus da prova deveria pesar para aqueles que deram errado em todas as partes do mundo. Se há dúvidas sobre para onde ir, compete aos empresários comprovarem a aptidão de suas organizações para reduzir riscos à saúde e propiciar cuidados com qualidade e menores custos para problemas crônicos e agudos,exigentes de cuidados integrais e integrados.

Ter o SUS como retaguarda para negações de cobertura e demandar mais subsídios públicos (tal como proposto recentemente pela ANS para estimular o lançamento de um plano de saúde baseado na capitalização) não vale. Os recursos financeiros jorraram nas promessas eleitorais. No calor da disputa, o mínimo empenhado foi "tomar iniciativas logo no inicio do mandato para regulamentar a Emenda Constitucional 29". Até aqui houve cortes e, pior, certa tergiversação. Necessitamos mais recursos para a saúde pública, sejam advindos do aumento da arrecadação, da redução das cotas de sacrifício ao superávit primário e pagamento das dividas públicas das áreas sociais, sejam provenientes do redirecionamento de isenções e deduções fiscais e, no futuro, da regulamentação do fundo social do pré-sal.

Decretar uma atitude equidistante dos agentes e interesses econômicos e políticos-partidários recende sobriedade, parece chique. Mas não é política de saúde. Os lucros de uma só empresa, R$450 milhões em 2010, representaram quase o dobro dos recursos duramente batalhados para modernizar todos os hospitais universitários no mesmo período, entre os quais o Hospital de Clinicas de Porto Alegre, no qual foi atendido o médico, militante da saúde pública e escritor Moacyr Scliar. A ele renderemos justas homenagens conjugando entusiasmo e critica na análise e formulação de uma agenda renovada de alternativas para o sistema de saúde brasileiro.

LIGIA BAHIA é professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. E -mail: ligiabahia55@gmail.com.



Publicado no O Globo, em 07 de Março de 2011.



segunda-feira, 7 de março de 2011

Como o Vitaserv foi parar na UTI.

Sou servidor público municipal de Joinville e usuário do SUS, e ao ler a reportagem com a chamada de capa do Jornal A Notícia desta segunda-feira 07 de março com o título: “ Como o Vitaserv ( Plano de Saúde dos servidores públicos municipais de Joinville ) foi parar na UTI” tomei a iniciativa de tecer algumas considerações sobre o tema, e já gostaria de sugerir a este importante jornal, que o tema fosse mais aprofundado, justifico o porquê.

Em primeiro lugar gostaria de lembrar que a prática dos governos de subsidiar de alguma forma os planos de saúde dos seus funcionários, é uma regra quase geral nesse país, encontramos em diversos municípios, assim como nos estados e no governo federal, nas três esferas ( Executivo, Legislativo e Judiciário ). Mas mesmo assim continuo a interpretar que tal prática fere o princípio do bom uso para todos do dinheiro público.

Estamos cansados de ouvir que o governo federal não tem mais dinheiro para aprimorar o SUS, mas por outro lado beneficia empresas com renúncia fiscal, não recebe o ressarcimento previsto na lei, sustenta o atendimento pelos planos em hospitais universitários, e financia a Agência de Saúde Suplementar.

Todos somos sabedores que o Sistema Único de Saúde é considerado mundialmente um modelo de política pública, por implantar uma rede de atendimento nacional, integral e gratuita para todos, além de prever a participação e controle social. No entanto, por conta das deficiências no sistema, relacionadas principalmente às dificuldades de acesso, um quarto da população do país, são usuárias de planos de saúde privados. Apesar de o governo brasileiro não investir o suficiente no SUS para que ele cumpra seus propósitos, somas significativas de recursos públicos acabam sendo gastas – direta ou indiretamente – com os planos de saúde.

Na prática, podemos chamar isso de apropriação indevida do público pelo setor privado. Vemos aí uma realidade em que o dinheiro público está financiando o setor privado. Já não chega que esse financiamento público da saúde privada também ocorre por meio da renúncia fiscal. Não só os usuários que fazem a declaração completa podem deduzir do Imposto de Renda o que pagaram nos planos, como também as operadoras são beneficiárias de diversas isenções fiscais.

Pela legislação brasileira, o SUS deveria ser ressarcido pelas operadoras de planos de saúde quando os estabelecimentos públicos ou conveniados atendem pelo SUS clientes desses planos, em procedimentos previstos no contrato com a operadora. No entanto, isso vem sendo sistematicamente desrespeitado.

Vemos estampado nessa reportagem que o município de Joinville, assim como outros por esse país afora, ajuda a oferecer a seus funcionários esse tipo de benefício. Parto do princípio que esse dinheiro deveria ser destinado para aprimorar o Sistema Único de Saúde e atender toda uma população integralmente, e não para ajudamos a pagar plano de saúde diferenciado para os funcionários públicos municipais de Joinville, que segundo os dados apresentados na reportagem o Vitaserv atende uma parcela de apenas 1,47% da população de Joinville ( incluindo os servidores públicos e seus dependentes ).

A Constituição Brasileira de 1988 afirma que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo o acesso universal e igualitário ao atendimento público. Toda a população brasileira é, na verdade, usuária do SUS, seja pelas campanhas de vacinação, ações de prevenção e de vigilância sanitária, e atendimentos de alta complexidade não cobertos normalmente pelos planos de saúde. Temos problemas com o SUS? Temos e muito, principalmente no tocante ao acesso: falta de médicos, demora para marcar consultas, falta de medicamentos, filas para consulta com médicos especialista, internação, e exames, longa espera pelo atendimento, falta de leitos hospitalares etc. Portanto, nosso compromisso maior é construir um sistema de saúde para todos os brasileiros, inclusive os servidores públicos municipais, estaduais e federais.

É bom lembra que em Joinville anos atrás já tivemos o Servisaúde, que também atendia os servidores públicos e seus dependentes, esse plano faliu e foi substituído pelo Vitaserv, que tem na prática o mesmo objetivo, e poucos anos depois da sua criação, mesmo com uma importante ajuda do governo municipal através do repasse mensal de R$ 300, 000,00 (atualmente) e R$ 470.000,00 ( futuramente ) dos tributos municipais, pagos pelos 509.000 joinvilenses, somos brindados com a informação que o mesmo está trilhando o mesmo caminho do seu antigo congênere. É de se pensar seriamente sobre o assunto!

domingo, 6 de março de 2011

O SUS em construção !!

Nesses últimos anos aprendi durante a luta na construção de um Sistema Único de Saúde (SUS) de qualidade, que temos dois importantes pontos fundamentais a serem enfrentados, de preferência nesse início de governo, tanto no nível estadual, como e principalmente, no nível federal. Um deles, e o mais importante a meu ver, é a questão do seu financiamento, porque não é possível manter a Emenda Constitucional 29 (EC 29) há dez anos sem a sua necessária regulamentação. Esperamos que nossos Deputados Federais e Senadores definam qual vai ser a fonte de financiamento desse sistema que é considerado na teoria, um dos mais bem elaborados projetos de cobertura de saúde do mundo. Importante que se diga que a atual presidente da república tem retomado nos últimos dias a discussão da recriação da Contribuição Social para a Saúde. Mesmo entendendo como uma saída alternativa nesse momento, não vejo como fugir por muito tempo de uma definição de longo prazo, que é os 10% de recursos do orçamento federal. Chega de paliativos!

Os gestores estaduais tanto quanto, e principalmente os gestores municipais, são cobrados em relação ao aumento do financiamento do setor, tendo em vista a duvidosa gestão desses poucos recursos que recebem. Certamente que isso dificulta o avanço das discussões, mas entendo que para termos uma melhor gestão precisamos de mais recursos, mas não podemos negar que precisamos melhorar nossa gestão, fazendo mais com o pouco que recebemos.

Outro pilar no fortalecimento do SUS é o do processo de regionalização do mesmo. A municipalização avançou e avançou muito nesses últimos vinte anos, agora estamos precisamos parar e discutir a regionalização da saúde. Não vejo como obter saídas concretas para os municípios e regiões, se não discutirmos nossos problemas com um olhar de caráter regional. Para isso podemos utilizar como uma importante ferramenta, os Colegiados de Gestão Regional (CGRs), importantes fóruns de discussão em busca de soluções coletivas e solidárias. Nesses colegiados, que são compostos pelos secretários municipais de saúde e representantes da secretaria de estado da saúde, firmamos decisões de interesse coletivos.

São nos colegiados que os técnicos da Secretaria de Estado da Saúde precisam atuar fortemente, contribuindo sobremaneira na construção e articulação de um Pacto pela Saúde. Vivi isso muito intensamente nesses últimos dois anos na região Nordeste e do Planalto Norte de Santa Catarina, quando os vinte e seis municípios que compõem essa região, discutiam a implantação do Projeto de Redes de Atenção à Saúde, projeto esse que conta com o apoio da Secretaria de Estado da Saúde e do Ministério da Saúde. Essa região possui uma diversidade muito grande de realidade. Vai desde os municípios com menos de quatro mil habitantes, como São João do Itaperiú, até município com mais de quinhentos mil habitantes como Joinville.

Gostaria de deixar para uma última reflexão um ponto que parece tem contribuído no afastamento de nossas lideranças políticas na busca de um SUS de qualidade, pois os mesmos e seus servidores tanto dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, possuem planos privados de saúde, não utilizam o SUS, e o pior, tendo o financiamento de seus planos privados fortemente ajudado com dinheiro público, ocasionando uma situação dúbia, pois para eles está tudo bem, está tudo resolvido Queria que um importante político desse país precisasse realizar uma ressonância magnética pelo SUS e tivesse que esperar meses a fio para a sua realização. Com certeza teríamos um debate mais acalorado e soluções encontradas em curto prazo de tempo.

Enfim, senti no meu dia-a-dia de trabalho o quanto os prefeitos, os secretários municipais de saúde e suas equipes técnicas, sofrem diariamente na busca de um SUS que responda aos principais anseios de sua população nessa área, pois é na porta deles que a população bate para agilizar aquele exame ou cirurgia que está esperando para resolver ou minorar seu problema de saúde alguns deles há anos. Esses são os verdadeiros heróis da saúde.


E o crime não compensa?

Todos os dias ao tomar conhecimento através da imprensa de crimes de diversos naipes e suas consequências práticas, fico com a forte impressão que o ditado popular que diz que o “crime não compensa “, está sendo colocado em xeque diariamente, e o pior, não é de hoje, porém ainda insisto em acreditar em outro ditado que fala: “ a justiça tarda mais não falha “, por isso fico sempre no desejo de que um dia a justiça seja feita e não se submeta aos caprichos de alguns protegidos.

Uma das grandes preocupações da nossa sociedade como um todo é com a tal impunidade, pois ela é traumática e enfraquece nossas esperanças, colocando em questão a estrutura ética de toda uma sociedade. Vemos exemplos mil em que a impunidade grassa, desde aquele político corrupto que entra eleição e sai eleição e o mesmo continua no poder de uma forma ou de outra, parece que tem sete vidas, e seus eleitores certamente tem memória curta. Os mesmos sempre acabam inocentados mesmo que no processo existam provas cabais e de conhecimento público e irrefutáveis. Outros são os nossos falsos heróis que enriquecem facilmente, deixando, nós seres humanos normais, boquiabertos, pois parece que trabalhamos tanto que não temos tempo de ganhar dinheiro. Outra é a tal Lei do Gerson, do policial que dá jeitinho em tudo que lhe interessa, do fiscal oportunista, dos impostos sonegados, esses são apenas alguns maus exemplos que assistimos todos os dias, e ficam em sua grande maioria sem solução.

Quando converso informalmente com alguns amigos, fico com a forte impressão que o risco de ceticismo nas instituições e na justiça brasileira, em especial, é dramático e concreto, pois não vemos resultados palpáveis e duradouros. Por isso é que aos olhos da população precisamos garantir o fortalecimento das nossas instituições, superando as qualidades ou defeitos de um povo esperto, mas pouco sábio. Infelizmente somos obrigados a reconhecer que enquanto o crime esta diariamente nas manchetes dos principais jornais do Brasil, ou nas telinhas das TVs, a justiça caminha a passos largos e ágeis, todos acabam ficando envolvidos e a população exige solução imediata, porém é só a TV ou os jornais esquecerem aquele fato....... e o tema cai imediatamente no esquecimento geral, não ficamos sabendo mais o resultado do caso, pois o que importa, não só para a imprensa mais para a população como um todo, é o sensacionalismo do momento.

A sociedade brasileira precisa se alertar e não ficar apenas no discurso fácil, mas se faz necessário que a grande maioria de seu povo permaneça jogando dentro das regras que definem um nível de desenvolvimento moral e ético adequados. Chega de moralismo barato e passageiro!

Não podemos ficar indiferentes, pois a indiferença é uma força muito desestruturadora que existe numa sociedade, além do que ela é mais insidiosa que o próprio mal. Nós cidadãos defrontamo-nos com uma crise moral e ética baseada na total desarticulação entre nossos desejos, nossos discursos e nossos comportamentos. Sendo assim não podemos ficar assistindo a tudo isso como cidadãos medíocres. Precisamos criar uma massa crítica suficiente para alterar os padrões coletivos atualmente vigentes.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Imobilismo da sociedade.

Dias atrás estive conversando com um grupo de profissionais de saúde sobre a participação popular no Sistema Único de Saúde (SUS), tarefa essa garantida na Constituição Federal de 1988 e conquistada a duras penas após longos anos de ditadura militar, e muita batalha de ilustres personalidades dos quatro cantos desse Brasil.

Durante a referida conversa que teve como ponto de partida alguns questionamentos relativos a como aquele grupo estava vendo ou mesmo participando desse processo de participação junto a comunidade onde os mesmos estavam inseridos, quer dizer, trabalhando. Logo ficou claro pelas manifestações dos presentes o marasmo geral e o sentimento de descrédito em que se encontravam, tanto eles mesmos, tanto quanto as comunidades em que eles atuavam.

Com essa minha constatação, que já vem de longa data, gostaria de iniciar uma rápida reflexão dessa realidade. Vou começar levantando algumas situações concretas que tenho visto nesses últimos dez anos.

Vivi alguns momentos históricos, principalmente quando era jovem, há 25 anos atrás, situações, em especial dentro da universidade enquanto estudante, de enfrentamentos políticos que sempre traziam no mínimo, questões a serem repensadas e que deixavam como consequências, alguns avanços. Tudo isso em meio com um tempero ideológico. Agora pergunto: E nesses últimos dez anos, como que a sociedade brasileira, em especial suas lideranças políticas tem se comportado? Não podemos negar que o Brasil como um todo, avançou muito economicamente nesses últimos anos, mas em contrapartida todo o processo político foi marcado por acentuadas conciliações de interesses, e não de enfrentamentos, e também de grande centralismo no tocante ao poder de fogo do Governo Federal.

Vejamos alguns exemplos concretos:

- O Estado, leia-se governo federal, é muito forte e centralizador. 65% do orçamento público está concentrado na execução da União, forçando os prefeitos e governadores a dependerem de convênios estabelecidos com os ministérios, para tentar concretizar algumas importantes obras em âmbito municipal. Quer dizer, nossos gestores municipais e estaduais, vivem de “pires na mão” para garantir o repasse de recursos do BNDES e ou do PAC, por exemplo.

- De outro lado, muitos daqueles movimentos sociais dos anos 80, e muitas dessas lideranças, acabaram sendo institucionalizadas. Onde se encontra aquele MST tão temido anos atrás? Até parece que a Reforma Agrária saiu definitivamente do papel. Onde está a União Nacional dos Estudantes (UNE) tão respeitada naquela época, e com um poder de mobilização nacional que dava inveja, está hoje, praticamente apagada. E o que dizer das lideranças das grandes centrais sindicais, como a CUT e a Força Sindical, hoje a maioria estão ocupando importantes cargos dentro do governo federal, ou das estatais, com altos salários, longe da realidade da maioria dos trabalhadores.

Os partidos políticos como forma de expressão estão cada vez mais superados pelo tempo, e em especial os partidos de oposição estão completamente em frangalhos. Alguns estão sobrevivendo a duras penas. Perderam a vitalidade do processo de discussão e de propostas realistas e inovadoras, e consequentemente perderam o apoio e o respaldo popular.

Enfim, acho que precisamos ser mais ousados, e resgatar aquela velha energia que tanto alimentou uma juventude ansiosa por liberdades e uma efetiva Democracia lá pelos idos dos anos 80, que acabou resultando numa Constituição Cidadã. Nossos movimentos sociais, isso inclui desde as associações de moradores até as grandes organizações de caráter nacional perderam o protagonismo de sujeitos, a ousadia de avançar cada vez mais. Somos Estado-dependentes, e o pior, estamos fragmentados e com uma postura eminentemente individualista.

Enfim, estamos bem socioeconomicamente falando, mas estamos retrocedendo no campo político. Tenho medo que a população não veja mais utilidade na Democracia, pois desde que sua condição de vida esteja atendida suficientemente bem, o resto não teria mais importância.