sexta-feira, 9 de maio de 2008

Celular: use com prudência.


O uso de celulares por crianças tem aumentado a preocupação sobre sua relação - ainda incerta - com o surgimento de doenças. Falar menos é a principal dica para evitar riscos.A oferta de produtos de telefonia móvel aumenta a cada dia, e as empresas têm investido pesadamente para ampliar sua inserção entre as crianças. Segundo uma pesquisa do Ibope/NetRatings divulgada no ano passado, que ouviu 7 mil crianças de doze países, os brasileirinhos são os que mais usam o celular: 81% utilizam o aparelho três ou mais vezes por semana, 50% a mais do que as crianças japonesas.O celular pode proporcionar sensação de segurança aos pais, que com ele são capazes de encontrar os filhos onde quer que estejam, mas é preciso ficar atento à relação de custo e benefício do produto. "Você oferece um risco adicional à criança dando-lhe um celular [com relação à probabilidade de desenvolver algum tipo de câncer]", afirma Silvana Turci, responsável pela área de Vigilância do Câncer Ocupacional e Ambiental do Instituto Nacional de Câncer (Inca).Para ela, "criança não tem que ter celular". Isso porque a espessura do crânio das crianças é cerca de quatro vezes menor que a dos adultos, o que permite maior penetração das ondas eletromagnéticas emitidas pelo aparelho. E, ainda, porque as células das crianças se reproduzem mais rapidamente, deixando-as mais suscetíveis a qualquer risco.Em alguns países, como a Inglaterra, os governos recomendam que as crianças e os adolescentes sejam desestimulados a falar em celulares, limitando-se ao essencial. Na França, foi imposta uma lei que proibiu o uso de celulares nas escolas, para preservar os pequenos das ondas eletromagnéticas. Na ocasião, os parlamentares franceses chegaram a levar a questão à Organização Mundial da Saúde (OMS), alegando a necessidade de pesquisas sobre o assunto. Até hoje, no entanto, nada muito relevante foi publicado.RISCOS PARA ADULTOSEm contrapartida, pesquisas sobre os riscos da radiação eletromagnética para o organismo de adultos são divulgadas aos montes. E os resultados são os mais diferentes que se possa imaginar.Um estudo israelense, publicado no American Journal of Epidemiology em dezembro passado, afirmou que as emissões de radiofreqüência dos celulares aumentam o risco de câncer nas glândulas salivares. O risco de desenvolver um tumor maligno nessa região é 50% maior quando o aparelho é usado durante 22 horas por mês. E é ainda maior se for sempre utilizada a mesma orelha. A pesquisa foi feita entre 2001 e 2003.Já um estudo japonês divulgado há dois meses chegou à conclusão de que o uso de celular não aumenta as chances de desenvolver câncer cerebral. Os cientistas analisaram mil pessoas (com tumores e também saudáveis), durante seis meses.Outro estudo, este sueco, de 2006, constatou exatamente o oposto. Os pesquisadores estudaram o uso de celulares por 4,4 mil pessoas (metade de pacientes com câncer, e metade de pessoas saudáveis) e concluiu que os usuários intensos de celular têm risco 240% maior de desenvolverem um tumor maligno do lado da cabeça em que usam o aparelho. Eles definiram como uso "intenso" do celular um tempo superior a 2 mil horas - o que equivale a uma hora de uso por dia no local de trabalho, durante dez anos.Para saber em qual pesquisa confiar, o consumidor encontrará dificuldade. Este é um daqueles assuntos em que não há consenso entre pesquisadores. De acordo com Renato Sabbatini, coordenador do Comitê Latino-Americano de Campos Eletromagnéticos de Alta Freqüência e Saúde Humana, "devido à variabilidade biológica e às falhas dos estudos, pode-se esperar que até 5% dos trabalhos mostrem resultados negativos para a saúde, sem que isso signifique que os efeitos realmente existam". Para ele, "não há motivos para preocupação".Silvana, do Inca, também explica as diferenças dos estudos pela forma como são elaborados. Mas não acha que prevenir seja exagero. "É difícil analisar uma comunidade que utilize o mesmo aparelho, fale pelo mesmo tempo etc. Mas, como outros compostos que podem ser cancerígenos, demora alguns anos para que se tenha essa certeza [de que são ou não cancerígenos]. Até lá, vale a prevenção." A especialista faz um paralelo com o câncer de pele. Voltar da praia com o corpo vermelho não significa que a pessoa terá câncer de pele. Mas se essa situação se repetir todos os fins de semana, as probabilidades de desenvolver a doença aumentam. O mesmo se pode pensar com relação ao uso de celulares: com o tempo e a freqüência de uso, os riscos se multiplicam.De acordo com Álvaro Almeida de Salles, professor da área de engenharia elétrica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), "como a maior parte do dinheiro das pesquisas vem da indústria de telecomunicações, muitas têm resultados distorcidos, cobrindo apenas dois ou três anos de análise". "Para podermos relacionar o uso de celular ao câncer cerebral, por exemplo, é necessário estudar a população por pelo menos dez anos", diz. Segundo o pesquisador, todos os estudos que cobrem períodos extensos chegam a resultados preocupantes.LIMITES DE EXPOSIÇÃOO Idec contatou os principais fabricantes de celulares para confirmar sua prática quanto à exposição dos consumidores à radiação eletromagnética. A Benq (que comprou a área de celulares da Siemens), a Motorola e a Nokia informaram que todos os manuais dos seus produtos mencionam o nível de radiação a que o consumidor está exposto e que todos estão abaixo do limite.A Samsung informou apenas que "disponibiliza, nos manuais do usuário, informações sobre uso, conservação e manutenção dos aparelhos", e não deixou claro, portanto, se disponibiliza em seus produtos as informações que o consumidor deve ter sobre o nível de radiação. A LG se limitou a dizer que não tem porta-voz para falar sobre o assunto no momento. A Gradiente e a Sony Ericsson não responderam à solicitação do Instituto.No Brasil, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) estabeleceu regras para essa exposição, baseadas no padrão da ICNIRP, um órgão internacional especializado no assunto. O limite estabelecido para a "taxa de absorção específica", conhecida como SAR na sigla em inglês, é de 2 W/kg. É uma medida de potência absorvida por unidade de massa de tecido. Antes de comprar um aparelho, o consumidor pode questionar qual é essa taxa e escolher o que lhe convier. Para muitos especialistas, no entanto, essas regras são obsoletas, pois só levam em consideração efeitos térmicos, deixando de lado riscos biológicos a que o consumidor se expõe."Os riscos térmicos só existem se os limites, em vigor na Resolução no 303 da Anatel, forem atingidos ou ultrapassados. Esses riscos correspondem a exposições agudas e de curta duração. Essa resolução, entretanto, não considera efeitos não-térmicos - crônicos e de duração prolongada -, que incluem, entre outros, dores de cabeça, distúrbios do sono, comprometimento da memória e do sistema imune, má-formação fetal, câncer, mal de Parkinson e Alzheimer", esclarece Francisco de Assis Ferreira Tejo, coordenador do Laboratório de Eletromagnetismo Aplicado da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).

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