domingo, 1 de junho de 2008

Aborto inseguro, violência e Aids: os desafios para a redução da mortalidade materna


Na avaliação da Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos - RFS a má qualidade dos serviços de saúde se inicia nas dificuldades de acesso ao planejamento reprodutivo quanto à informação e disponibilização de contraceptivos adequados a cada mulher, e à anticoncepção de emergência, dificultada por vários fatores, inclusive religiosos, levando a que se tenha elevado número de gestações não desejadas. Segundo vários estudos, em torno de um terço das gestações terminam em abortos e pelo menos uma em cada quatro gestações é voluntariamente interrompida a cada ano (OMS, 1998), acarretando um elevado risco à vida e saúde das mulheres, em especial das mulheres jovens, e sobrecarregando o sistema de saúde.O pré-natal incompleto ou de má qualidade, sem a realização de exames básicos e demora na entrega de resultados, e a desqualificação da atenção dada às mulheres em trabalho de parto ou abortos iniciados, antecede a ausência de vagas e peregrinação na rede hospitalar. O atendimento inadequado durante a gestação, na hora do parto e depois deste, agrava a condição de saúde das mulheres, levando muitas ao óbito. Segundo a Organização Mundial de Saúde, Morte Materna é entendida como a morte de uma mulher durante a gestação ou até quarenta e dois dias após o término da gestação, independente da duração ou localização da gravidez, não sendo considerada morte materna a que é provocada por causas acidentais ou incidentais. Isto explica porque as quatro maiores causas da mortalidade materna no Brasil - síndromes hipertensivas, hemorragias, infecções puerperais e as complicações do aborto - são diretas, mas estão estreitamente relacionadas com os outros fatores, como a violência de gênero e o lugar das mulheres nas relações sexuais inseguras. A má qualidade de vida dos contextos familiares, onde ocorre a maioria dos óbitos maternos, a violência doméstica, o analfabetismo e a baixa renda indicam sua relação com a desigualdade social e de gênero. Cerca de duas mil mulheres são vítimas de mortalidade materna por ano no Brasil, não constituindo um número expressivo se analisado o conjunto de mortes de mulheres de 10 a 49 anos no país. Contudo, a Rede Feminista de Saúde vem propondo a seguinte reflexão: na medida em que a gestação é uma vivência da sexualidade e não uma doença e considerando ainda que 96% (RFS, 2006) das mortes maternas podem ser evitadas, é inconcebível que se tenha este índice exagerado de mortes. Enfrentar o problema A Organização Mundial de Saúde – OMS recomenda que sejam realizados no mínimo seis exames de pré-natal e uma consulta após o parto. Esse acompanhamento pode ser fundamental para a prevenção da morte materna, pois é quando podem ser detectados os casos de doença hipertensiva específica da gravidez (pré-eclâmpsia e eclampsia), diabetes e infecções. Para a RFS, o Brasil só poderá reduzir em 75% a mortalidade materna até 2015, como prevê a Organização das Nações Unidas - ONU - em seu quinto Objetivo de Desenvolvimento do Milênio, estabelecido em 2000, caso enfrente o problema em todas as suas dimensões: "Se não for adotada uma política muito séria de educação sexual, assegurado o planejamento reprodutivo, a melhoria do atendimento durante a gestação, a efetiva humanização do parto e trabalho com evidências científicas, o cuidado alongado com puerpério e a legalização do aborto, não conseguiremos reduzir as mortes maternas no país e atingir as metas estabelecidas pela ONU", afirma a Secretária Executiva da RFS, Telia Negrão. A jornalista e cientista política reconhece que houve avanços no País desde a criação, com o apoio da Rede, em 2004, do Pacto Nacional Pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal. Esta estratégia envolve, hoje, atores sociais e os governos, em suas três esferas, na mobilização em torno da melhoria da qualidade de vida de mulheres e crianças, incrementando a vigilância epidemiológica da morte materna. No entanto, acentua, mesmo com sinais de estabilização nos indicadores de mortalidade materna no país (52,36 mortes por 100 mil nascidos vivos em 2000 e 53,34 em 2005) o quadro pode ser alterado para pior com o crescimento da infecção de mulheres pelo HIV e das violências contra as mulheres. A redução dos índices de morte materna no Brasil, constitui-se num desafio árduo e presente no cotidiano da Rede Feminista de Saúde. O compromisso com essa bandeira de luta encontra-se na história da própria Rede, que através de filiadas e parceiras busca o enfrentamento do fenômeno pela ação política e pelos estudos e pesquisas sobre a saúde das mulheres, os direitos sexuais e os direitos reprodutivos. A magnitude da morte materna exige definições urgentes de estratégias de ações que conduzam à melhoria da qualidade da atenção à saúde da mulher em nosso País.
Fonte: Rede Feminista de Saúde, Informativo 07 – 28/05/2008

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