sábado, 19 de abril de 2008

Educação e Liberdade



Etimologicamente, a palavra educar vem do latim educare, vinculado a educere, verbo composto do prefixo ex (fora) mais ducere (conduzir, levar). O significado literal é “conduzir para fora”, externamente ao mundo materno e familiar, e indica a socialização do ser no mundo, a interação indivíduo-sociedade.Esse movimento embute um paradoxo. A educação fornece ao indivíduo conhecimentos necessários para o viver no mundo, adaptar-se à sociedade, no sentido de incorporar valores e saberes que permitem sua aceitação por esta. Mas também implica influência, controle, coação e poder. A educação é um dos instrumentos mais eficientes para a promoção da “tirania da maioria”, isto é, a imposição dos valores e idéias da maioria e a conseqüente interdição da crítica às verdades legitimadas pela sociedade. Em todo ato educativo, mesmo aquele que se pretende revolucionário, há o desejo de controlar e, em maior ou menor grau, de moldar o educando à imagem e ao pensar do educador. O ato educativo pressupõe coação real e/ou simbólica, cooptação e adaptação.É possível, então, educar para liberdade? Primeiro, é importante frisar que liberdade pressupõe responsabilidade. Liberdade não é poder fazer tudo, não é uma abstração acima da realidade social. Quando a liberdade é exercida sem limites, degenera-se em licenciosidade, em atitudes irresponsáveis diante do outro, o professor e o colega de turma ou mesmo em relação a si próprio. A licenciosidade rompe o tenso equilíbrio entre liberdade e autoridade; outro fator de ruptura é a degeneração da autoridade em autoritarismo. A liberdade não significa ausência de limites. A questão é como as esferas da autoridade e da liberdade se relacionam e não anulam ou corrompam uma à outra, isto é, que se mantenha o equilíbrio, sempre tenso, entre ambas.A autoridade pode contribuir para afirmar a liberdade ou autoritariamente aniquilá-la. A ausência de limites favorece a licenciosidade e, consequentemente, a irresponsabilidade. A autoridade também estorva a liberdade quando tutela o outro e o mantém em permanente infantilidade. Um exemplo é a imaturidade observável em adolescentes mimados** que, inseguros e/ou de uma prepotência típica de quem está acostumado a ter e poder tudo, não demonstram atitudes inerentes aos indivíduos educados para a liberdade.A autoridade fortalece a liberdade quanto investe no diálogo educador-educando, rompe com a concepção bancária do saber, vê o educando como agente do conhecimento e não objeto, não restringe a práxis educativa à mera transmissão e memorização de conteúdos, abdica de utilizar os instrumentos próprios da atividade docente enquanto formas de coação e a adota uma atitude democrática submetendo-se à crítica dos educandos. Educa-se para a liberdade ao investir na autonomia do educando e responsabilizá-lo por sua formação. Ele deve ser estimulado a exercer a liberdade com responsabilidade, a assumir os seus atos e ser consciente das conseqüências. É essencial, ainda, que a escola se democratize; que a sala de aula seja um espaço de práticas e atitudes democráticas, a começar pelo docente; e que estimule a participação responsável do educando. É preciso politizar o espaço e cotidiano escolar.

A educação é contraditória: tanto pode formar indivíduos adaptados e dependentes quanto críticos e livres; ela pode ser autoritária e/ou tutelar, mas também pode contribuir para a formação de indivíduos autônomos e capazes de intervir consciente e responsavelmente no mundo. A postura do educador, para o bem ou para o mal, é essencial. É uma opção que se traduz na práxis docente e tem efeitos práticos reais.


Escrito por ocasião da participação no evento “Semana Cívica Tiradentes”, promovido pela Câmara Municipal de Maringá, em 18.04.2008.


** Ver Meninas e meninos mimados, publicado em 15 de setembro de 2007.


*** Não me refiro à politização no sentido partidário e/ou de práticas de doutrinamento por parte de professores, os quais acreditam que educar é “fazer a cabeça” dos educandos e convencê-los ideologicamente. A politização que aludo é a que favorece o desvendamento da realidade oculta sobre as aparências, que desvenda as relações de poder e favorece a crítica e o comprometimento democrático.
Postado por Antonio Ozaí da Silva

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