quarta-feira, 19 de março de 2008

STF deverá dizer se dar amor é obrigação legal dos pais.


Estão na mesa do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes autos que, dependendo do rumo que o magistrado der a eles, poderão representar uma revolução na questão dos direitos e deveres na criação de filhos no Brasil. O STF terá de decidir, pela primeira vez, se um filho que não recebeu afeto do pai tem direito a uma indenização por danos morais. É o caso do analista de sistemas Alexandre Batista Fortes, 27 anos. Em 2000, depois de anos sem a presença do pai e de infrutíferas tentativas de aproximação, o jovem recorreu à Justiça mineira, que condenou o engenheiro Vicente Ferro de Oliveira a pagar 200 salários mínimos (R$ 52 mil, na época) por falta de carinho, apoio moral e atenção. Vicente reverteu a decisão no Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2006. No final do ano passado, o caso seguiu para o STF. Segundo a assessoria do órgão, o parecer será dado no final deste mês. Para a psicóloga Magdalena Ramos, coordenadora do núcleo de terapia de casal e família da Pontifícia Universidade Católica (PUC), a Justiça não é o meio para conquistar carinho. A psicanalista Tânia Coelho dos Santos concorda: "Afeto não se impõe. A Justiça vai longe demais, já que é uma exorbitância obrigar um homem a amar uma criança que não desejou", diz a professora de pós-graduação em teoria psicanalítica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Para a professora do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) Isabel Cristina Gomes é muito recente para o pai, historicamente vinculado à figura do provedor, assumir o papel que sempre foi da mãe: o do cuidado afetivo. "Se o pai supre as carências materiais do filho e não lhe dá carinho, sinto muito, mas não é o juiz quem vai resolver isso. O filho deve buscar outros caminhos, como um psicólogo ou um psiquiatra", diz ela. Função Educativa – O abandono afetivo acontece quando pai ou mãe deixa de dar assistência moral e afetiva ao filho, independentemente da questão material. Apesar de não estar previsto expressamente em lei, o artigo 1.634 do Código Civil Brasileiro, no item direitos e obrigações dos pais, prevê que é dever dos pais criar e educar os seus filhos. É este artigo que dá brechas a processo judiciais. O advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), que defendeu o analista de sistemas, conta que uma centena de pessoas o procurou, interessadas no mesmo encaminhamento. Pereira diz ter recusado todos os pedidos por identificar interesses financeiros nos casos. "É preciso tomar cuidado para que não pensem que se quer monetarizar o afeto", diz o advogado, para quem a indenização, mais do que punitiva, tem função educativa. Não é possível coagir um pai ou uma mãe a amar um filho, mas, segundo Pereira, à sociedade cumpre o papel solidário de dizer aos pais, de alguma forma, que isso não é correto e pode comprometer a formação e o caráter das pessoas afetivamente abandonadas.[Revista Istoé (SP), Rodrigo Cardoso – 16/03/2008]

Nenhum comentário: